quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Lívio Barreto - O caixeiro poeta



Lágrimas tristes, lágrimas doridas,
Podeis rolar desconsoladamente!
Vindes da ruína dolorosa e ardente
Das minhas torres de luar vestidas!

Órfãs trementes, órfãs desvalidas,
Não tenho um seio carinhoso e quente,
Frouxel de ninho, cálix recendente,
Onde abrigar-vos, pérolas sentidas.

Vindes da noite, vindes da amargura,
Desabrochastes sobre a dura frágua
Do coração ao sol da desventura!

Vindes de um seio, vindes de uma mágoa
E não achastes uma urna pura
Para abrigar-vos, frias gotas d’água!

Lágrimas - Lívio Barreto

Lívio da Rocha Barreto nasceu na Fazenda dos Angicos, distrito de Ibuaçu comarca de Granja/Ce , em 18 de fevereiro de 1870.

Filho de José Soares Barreto ( o Águia do Trapiá ) e Mariana da Rocha Barreto. Lívio foi morar na sede Granja, onde chegou em 1878 e aí aprendeu, com o professor Francisco Garcez dos Santos, as primeiras letras.

Cedo, tinha apenas o Ensino Primário, teve que abandonar os estudos para atuar como caixeiro no comércio. Foi quando conheceu o magistrado Antônio Augusto de Vasconcelos que o ensinava, nas horas de folga, lições de Português,
Geografia
e Fran
cês.


O Caixeiro

Exigências de fortuna obrigaram-no a ir, muito criança ainda e muito a contragosto seu, servir como caixeiro de um parente (ofício embrutecedor que o perseguiria pela vida a fora), gastou ele aí a melhor parte de sua infância, incompreendido e anônimo. Mas, não podendo conter os ímpetos de sua alma em anseios de ideal superior, com José Barreto, Luís Felipe, Belfort e outros funda um jornal literário - "O Iracema" - onde aparecem seus primeiros versos, defeituosos ainda, mas já reveladores da inspiração e da originalidade daquele que mais tarde passaria a ser o principal representante do Simbolismo no Ceará, apesar da forte tendência romântica.

Sentindo o meio em que vivia intelectualmente atrasado para seus talentos, resolve seguir para Belém do Pará, em junho de 1888, onde trava conhecimento com o poeta João de Deus do Rêgo, que muito contribui para o seu aperfeiçoamento literário. Regressa dali, em 1891

, doente e acabrunhado de esperanças

(

Com beribéri* e saudoso de casa, retornou ao Ceará. Nesse período, viu-se envolvido por uma intensa e triste paixão que o acompanharia até os últimos de seus versos e suspiros. Ainda em 1891, publicou “Versos a Estela”, além de sonetos e crônicas)

.

Por esse tempo aparece, na sua terra natal, um outro jornal literário - "A Luz" - em que Lívio publica sonetos e ligeiras crônicas humorísticas. Restabelecido no seio carinhoso da família, em fevereiro de 1892, ruma para a bela Fortaleza (

Em fevereiro de 1892, na busca do poético “fugir para esquecer”, dirigiu-se a Fortaleza, passando a trabalhar como caixeiro e a publicar versos no jornal "Libertador".)

, onde se torna um dos fundadores (com o pseudônimo de Lucas Bizarro) da Padaria Espiritual - entidade literária que produzia o jornal - "O Pão" - tendo à frente o talentoso poeta Antônio Sales.


Intelectualmente satisfeito, mas afetado, fora do lar, por dificuldades financeiras, regressa ele como filho pródigo, acontecendo naufragar à altura da Periquara, em viagem no vapor Alcântara (

Porém, desgostoso com o seu ofício no comércio, retornou à Granja (junho de 1982) à bordo do vapor Alcântara que naufragou, lançando ao mar revolto seus livros e um poema inédito.)

, salvando-se a nado, exímio nadador que era. Isto lhe rendeu um belo poema: "Náufrago".


Segundo Artur Teófilo, "O Lívio era magro, pequeno, altivamente petulante.Tinha o olhar penetrante, sem vacilações, a fronte alta e abaulada e uma palidez baça de hepático. Ria pouco e só entre amigos deixava por vezes transparecer sua fina verve elegante, um bocado pessimista e epigramática. Com o vulgo era sisudo, um tanto frio mesmo, com uns longes de bem entendido orgulho. Usava casimiras claras, chapéu de feltro alto, e fumava cachimbo, à noite, embalando-se rapidamente na rede, com um livro de versos nas mãos."


Dolentes 1ª Edição (capa 03)

Dolentes - 1ª Edição


A morte chega cedo demais



Em 1893, ingressou na Companhia Maranhense de Navegação à Vapor, para Camocim.

Lívio Barreto, autor de um único livro - DOLENTES - publicado postumamente por Waldemiro Cavalcanti, faleceu na sua banca de trabalho, em Camocim, fulminado por uma congestão cerebral**, pelas 3 horas da tarde do dia 29 de setembro de 1895, com apenas 25 anos de idade, tempo insuficiente para aprimorar sua arte poética. Mesmo assim, tornou-se o maior poeta granjense de todos os tempos e um dos principais do Ceará.

Lívio Barreto é patrono da cadeira nº 24 da Academia Cearense de Letras.


Lívio Barreto mereceu, das autoridades municipais, ter seu nome ligado a uma importante rua do centro da Cidade de Granja. A denominação poderia abranger toda a extensão da rua, mas o costume inadequado de dar-se múltiplos nomes a ruas grandes levou-a a ostentar dois outros, ao aproximar-se ao Cemitério e chegando ao Rio.

José Xavier Filho


Blog Sue Giersbergen

*Beribéri é uma doença provocada pela falta de vitamina B1 no organismo, o que provoca fraqueza muscular e dificuldades respiratórias.

A doença pode afetar o coração, dando origem a uma cardiomiopatia por deficiência nutricional chamada de beribéri cardíaco.


**

Congestão cerebral é a afluência anormal do sangue aos vasos do cérebro causado por emoções muito fortes e violentas, indigestões, contusões cranianas, alcoolismo, stress, etc. O limão funciona como tratamento auxiliar.


Fontes- Wikipédia, Raymundo Netto e pesquisas diversas pela internet

2 comentários:

  1. Seu pseudônimo na Padaria Espiritual, Lucas Bizarro, é bem apropriado à sua personalidade, sua vida nostálgica, me parece. Nunca tinha lido
    nenhum poema seu....o que aí está é belo e triste.
    O conhecia apenas como um dos padeiros...
    Teve morte tão prematura...que pena, poderia ter nos deixado mais livros, além do Dolente!!!

    Boa noite, linda!

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  2. É triste mesmo. O nome "lágrimas" faz
    todo o sentido! rs

    Boa noite, amore! :)

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