segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Ceará à francesa



A “belle époque” marcou a vida cearense, segundo o memorialista Miguel Ângelo de Azevedo, o Nirez

A construção da memória urbana de Fortaleza passou pela influência da cultura francesa, sobretudo até o início dos anos 40. “Cada país tem sua época. Hoje, como os EUA mandam no mundo, já foram a Inglaterra e a França, esta entre os séculos XIX e XX, principalmente”, assinala o pesquisador Nirez, atualmente diretor do Museu da Imagem e do Som (MIS). “Acho que é algo muito distante, não ficou muita coisa desta influência hoje em dia. Mas a influência francesa é muito mais autêntica do que a anglo-saxã. A França é um país latino, sua influência é muito mais benéfica do que a estranha influência norte-americana”.



Desde a “francofonia”, ou seja, a incorporação de termos franceses ao vocabulário brasileiro, como “restaurante”, “clichê”, “cachê” e até o “mercy”, dos cumprimentos mais informais, a influência da cultura francesa se fazia notar ainda em outros aspectos da nascente vida urbana fortalezense, em que a adoção de símbolos de origem francesa poderia ser uma das mais importantes marcas desta presença entre nós. “Não tem hoje um marco na cidade desta presença, eles se foram na voragem do tempo. Mas teve a Maison Art-Noveau, entre 1909 e 1925, uma loja de louças, papelaria, bazar. Em 1925, mudou para Maison Riche, junto ao Café Riche... Do outro lado da Praça do Ferreira, tinha também a Rotisserie Sportman, já mesclando um termo francês com outro inglês”, aponta.

Apesar desta presença, acrescenta Nirez, a influência mais direta da cultura francesa no cotidiano fortalezense se fazia sentir, entre os anos 1910 e 1920. Principalmente, pela denominação das grandes avenidas chamadas de “boulevards”, que já deixaram de ser assim conhecidas desde 1937, quando passaram a ser identificados como “avenidas” através de um decreto. Um exemplo: durante muito tempo, a avenida Visconde Cauípe, atual avenida da Universidade, era sim chamada por todos por Boulevard Visconde de Cauípe. Mesmo assim, Nirez alega que, até pelo menos os anos 50, a moda das vitrines das “butiques” continuou sendo influenciada pela moda produzida em Paris, atravessando a época americana. “A indumentária era toda copiada da Europa, do chapeú ao colarinho”.


Até mesmo no uso de tecnologias importantes para o cotidiano urbano, a influência se fez perceber. Como foi o caso da “Pathe Baby”, câmera cinematográfica de 9 1/2 milímetros, utilizada pelos nossos primeiros cineastas como herança da tradição do pioneiro estúdio Pathé, indústria também responsável pelos Discos Pathé, de cera, vindos direto de Paris e também “largamente” consumidos pela sociedade cearense. Ainda no ramo do entretenimento, ficou marcada ainda a importância do Teatro de Revistas, uma das tradições importadas na França. “No Rio, andou, nos anos 20 e 40, a atriz Josephine Baker, sendo inclusive cantada por aqui ainda nos anos 20 e ainda em uma quase uma sátira, a ‘Dança do Bole-Bole’, já nos anos 40”, relembra Nirez, que também ressalta a influência dos desenhos arquitetônicas das ferragens (escocesas) do hoje Mercado dos Pinhões e do Theatro José de Alencar, através da influência francesa no Reino Unido.Torre e chateaus

Entre as décadas de 1920 e 1940, Fortaleza teve também sua Torre Eiffel. “Ficava na Major Facundo, mais ou menos olhando para o Savaná. Era uma loja de partituras musicais, instrumentos musicais e jogos de bilhar”, diz, relacionando ainda outras iniciativas comerciais como o Cine Majestic, a Sorveteria Odeon. Há quem se lembre também dos “chateaus”, como era conhecidas as “casas de descarrego” ou “cabarés”, diferente do seu significado no Rio e em São Paulo, segundo Nirez, relacionados a lugares para moradia. E os “chateaus” cearenses, tinham “atrativos” nativos? “Não”, garante Nirez. “Francesa só em sonho”, considera. 


Lojas com marca da influência francesa na Fortaleza do começo do século XX 
Arquivo Nirez 


Crédito : Diário do Nordeste

3 comentários: