Durante
a Primeira República, as condições econômicas da classe operária eram
precárias, marcadas por várias reivindicações e experiências de trabalho,
fossem dos trabalhadores têxteis, domésticos, artesãos, portuários etc, em
consequência dos salários pagos de maneira diferenciada nos Estados do Brasil e
que variavam de acordo com as funções exercidas. Os ofícios tidos como mais
qualificados, por causa da mesma oferta da mão-de-obra, eram mais bem pagos.
Antigo Porto de Fortaleza - Arquivo Nirez
Os
trabalhadores marítimos, portuários e ferroviários estavam inseridos em um
problema público, devido à importância dos mesmos para a economia, visto que eram
fundamentais para o escoamento de mercadorias pelo País. Dessa maneira, o Governo
do Ceará foi diversas vezes forçado a negociar com esses trabalhadores, o que
fugia à regra do contexto vigente.
Um
fator determinante para a articulação do movimento portuário era o fato de
que os trabalhadores utilizavam intensamente da força física pois necessitavam
de músculos desenvolvidos. Essa peculiaridade gerava uma característica
selecionadora e, portanto, reduzia o acúmulo de trabalhadores masculinos a um
“exército de reserva”, dificultando, mesmo no momento de greve, a substituição
da mão-de-obra. Essas características eram determinantes nas condições de vida
dos trabalhadores, levando-se em consideração a jornada de trabalho e a
ausência de leis para proteger o empregado dos abusos dos patrões. Entre o final
do século XIX e primeiros anos do século XX surgiram os sindicatos operários de
cunho mais combativo, voltados para a contestação da jornada de trabalho, as
condições de trabalho, os salários e as formas de pagamentos. Assim, foi
destacável a articulação e participação dos trabalhadores ligados ao mar,
durante o período
analisado, no tocante às reivindicações, manifestações e greves, posto que os catraieiros
do porto de Fortaleza estavam inseridos nesse contexto.
Esse
período é marcado pela articulação de movimentos operários e pela repressão
do poder público, sendo importante ressaltar a organização da classe operária brasileira, quando do surgimento das primeiras Sociedades de Socorros Mútuos,
que objetivavam o auxílio material para os membros de uma mesma categoria e a
busca de interesses comuns.
Além desse aspecto propício, os trabalhadores do
setor de serviços ainda tinham a favor das suas lutas o fato de fazer parte
essencial do setor econômico agro-exportador. Com essas bases, o movimento
gradativamente foi se fortalecendo e se firmou durante a década de 20.
O
fato é que os trabalhadores Portuários e Marítimos, segundo colocam Cláudio
Batalha e Boris Fausto, faziam parte de um setor de serviços vital para a organização
da cidade e, sabedores de sua importância econômica, suas reivindicações ganharam
fôlego no fim do século XIX e primeiros anos do século XX, influenciados pelas ideias políticas que estavam surgindo no movimento operário urbano desse momento,
como o trabalhismo carioca, o anarquismo, o anarco-comunismo e o socialismo.
A
primeira corrente ideológica surgida nesse período, segundo Boris Fausto, foi
o “trabalhismo carioca”, que tinha como ponto fundamental a tentativa de
negociar melhores condições de trabalho e o suprimento de necessidades
imediatas negociadas com os patrões (reivindicações mínimas).
Trapiche que serviu de porto para Fortaleza - Arquivo Nirez
Claudio
Batalha criticou os termos “trabalhismo carioca” e denominou esta corrente
de “Sindicalismo Reformista”. Este movimento dos trabalhadores visava a organização
duradoura, com bases financeiras bem articuladas, para praticar o “mutualismo”.
Segundo esse autor, para os reformistas, a greve era um meio de obter ganhos e,
por vezes, aceitavam o apoio de advogados políticos para intermediar as negociações
com os patrões.
A
articulação dos trabalhadores reformistas com os políticos era uma atitude que
tinha como objetivo conseguir espaço e êxito em meio às reivindicações. Este é um
ponto fundamental para pensar a aproximação entre o movimento reformista e a greve
dos catraieiros no Porto de Fortaleza, em 1904, pois estes trabalhadores tiveram o apoio dos advogados que faziam parte dos grupos opositores ao governo
do Estado desejando obter notoriedade e, principalmente, somar forças para
lutar contra o processo arbitrário de sorteio para a Armada da Marinha.
Mesmo
com a ação das ideologias anteriormente citadas, o “trabalhismo carioca”
ou “movimento reformista” pode ser melhor identificado entre ostrabalhadores
do Porto de Fortaleza, posto que uma das principais reivindicações vigentes,
entre marítimos e portuários, era a ação imediata para liberação do processo de
sorteio. E, principalmente, por que reforça a ideia de um movimento trabalhista
que estava interessado em pequenas reivindicações ou objetivos mais imediatos.
No
decorrer dos anos, o trabalhismo foi aos poucos sufocado pelos avanços do
anarquismo, não somente na Capital da República como também em São Paulo, onde
o movimento operário teve a forte presença das idéias anarquistas, notadamente
entre os trabalhadores do Porto de Santos.
Antigo Porto de Fortaleza - M.Filho
O
“Centro das Classes Operárias” foi um importante movimento organizado por
socialistas e formado, essencialmente, pelos marítimos no Rio de Janeiro, assim
como a greve ocorrida em 1903 contra a
Companhia Lloyd Brasileira, a qual contou com a participação de 800 homens que
se negaram a trabalhar durante 8 dias, visando obter a demissão de um dos seus
diretores no Rio de Janeiro.
Com
esse movimento, os trabalhadores dos Portos Brasileiros estavam reagindo
à Lei Federal de Sorteio para a Armada da Marinha e às questões referentes à organização
precária do trabalho.
Em Fortaleza, os sorteados alegavam não servir
à Armada da Marinha, porque
eram “arrimos de família”, além de muitos deles não estarem dentro dos limites
da idade exigida pela Lei. Somado a esses motivos estava o desejo de não deixar
de praticar a atividade de trabalho.
O
jornal O Unitário, do dia 14 de janeiro
de 1904, divulgou um extenso artigo
escrito por Manoel Armindo Cordeiro criticando o processo através do qual o sorteio
foi colocado em prática. Segundo o mesmo, o art. 72, § 24, da Constituição Federal,
que tratava sobre o procedimento de sorteio, foi colocado em prática de maneira
incorreta, pois jamais foram considerados navios componentes da Marinha Mercante
os botes, saveiros, catraias, jangadas, etc.
Dessa
feita, os artigos e críticas realizadas pelo O Unitário e Jornal do Ceará à Oligarquia Acciolina
alegaram que a prática colocada em ação no Estado do Ceará foi arbitrária,
fortalecendo e legitimando as exigências dos grevistas.
Com
a paralisação dos catraieiros, os navios que chegaram ao Porto não foram
descarregados, gerando insatisfação do Presidente do Estado do Ceará, Pedro Augusto
Borges, visto que o Porto era o principal ponto de entrada e saída de mercadorias.
A partir dessa insatisfação, na manhã do dia 03 de janeiro de 1904 a greve dos
catraieiros tem seu ápice.
Parte I
Parte I
“Todo cais é uma saudade de pedra”: Repressão e morte dos trabalhadores catraieiros
(1903-1904) - Nágila Maia de Morais
Nenhum comentário:
Postar um comentário