As esquinas e os bancos da Praça do Ferreira eram, também, pontos de reunião de pessoas representativas dos setores social e econômico, político e intelectual de Fortaleza.
O costume, aliás, nascera no Passeio Público, antes do embelezamento da Praça do Ferreira a partir da administração Guilherme Rocha, no começo do século em curso, ou mesmo antes, com a construção dos quiosques em seus quatro cantos e da escolha da Praça para ponto central dos veículos coletivos
(bondes a burro, a partir de 1880, substituídos por bondes elétricos em 1913/14 e posteriormente pelos ônibus, no fim da década de 1920.
Era o Passeio Público, naquela época, o centro de convergência da sociedade fortalezense, dando-nos disso notícia o historiador Gustavo Barroso: - "Ventilado, agradável sobretudo pela manhã, à tarde e à noite, era o Passeio Público nos bons tempos passados o ponto de reunião preferido pela população fortalezense. Do porto se avistava a linha multicor de sua iluminação festiva. Num coreto chinês, as bandas militares tocavam às quintas e domingos. A gente fina enchia a avenida Caio Prado" (alameda que, no sentido leste-oeste, se debruça sobre o segundo plano do Passeio), "cujas batalhas de confete no Carnaval se tornavam famosas. A gente de menos tom frequentava a Carapinima" (alameda do centro do Passeio, naquele mesmo sentido, ligando o prédio da 10ª Região Militar à porta principal da Santa Casa da Misericórdia). "O povo miúdo ficava na Mororó" (alameda paralela à rua João Moreira). "Separação de camadas sociais natural e espontaneamente feita. Nas tardes comuns, diante do mar, onde floriam os lenços brancos das jangadas voltando da pescaria, à sombra das castanholeiras, havia o Banco dos Velhos, reunião de homens de prol para um bate-papo erudito, e o Banco dos Moços, no qual se juntavam estudantes de direito e jovens jornalistas. O Banco dos Velhos transferiu-se mais tarde para a Praça do Ferreira, onde se tornou famoso sob esta singela rubrica - O BANCO".
("À Margem da História do Ceará", Fortaleza, Imprensa Universitária do Ceará, 1962, ps. 279 e 280, com parênteses do autor destas relembranças). Para Antônio Bezerra de Menezes, o Passeio Público era "a mais notável de todas" as praças da cidade na penúltima década do século passado.
("Descrição da Cidade de Fortaleza", in Revista do Instituto do Ceará, 1885, p. 148.)
Ao lado do BANCO DA OPINIÃO PÚBLICA, na Praça do Ferreira, formou-se o OUTRO BANCO, o qual era presidido pelo Dr, Irineu Filho. Nas constantes reformas por que passou o principal logradouro de Fortaleza, o OUTRO BANCO foi arrancado. Ficou no seu lugar um banquinho de cimento, apertado, sem comodidade. Eis uma fotografia dos áureos tempos, mostrando a maioria de seus componentes. Da esquerda para a direita - sentados: O poeta Cruz Filho, Josafã Linhares, Gomes de Matos, Prof. Clodoaldo Pinto, Prof. Humberto Fontenele, Dr. Irineu Filho, Jornalista Daniel Carneiro Job e A. Batista Fontenele. De pé, na mesma ordem - Carlos Braga, Dr. Fidelis Silva, Aderbal Pamplona, Dr. Belo da Mota, Egídio Lobo, Prof. Martins Filho, Dr. Guilherme Sátiro Rabelo e João Gaspar. Deixaram de figurar nesta fotografia os habitués - Ubatuba de Miranda, Aluízio Gurgel do Amaral, Meton Lima, J. Leitão, Julio Albertino e outros. Foto Publicada no Almanaque do Ceará de 1962.
Enquanto isto a Praça do Ferreira hibernava, frequentada de dia pelos feirantes vindos de Messejana, Parangaba e Caucaia, que nela vinham vender seus produtos agrícolas, e durante todo o dia, principalmente à tardinha e à noite, pelos fregueses dos quiosques existentes nos quatro cantos do logradouro. Após os esforços do boticário Ferreira para tornar a chamada Feira Nova o polo central de Fortaleza, bem como depois da fixação dos pontos de estacionamento das linhas de bondes a burro em seu derredor, e a construção dos quiosques em seus quatro cantos a partir de 1880, foi o Prefeito Guilherme Rocha quem deu o passo decisivo no sentido de deslocar o movimento do Passeio Público para a Praça do Ferreira, com a inauguração do Jardim 7 de Setembro, no centro do quadrilátero, em 1902.
Jardim 7 de Setembro
A afluência ao Passeio foi diminuindo aos poucos, à proporção que crescia a agitação na Praça do Ferreira. A construção do edifício em que passou a funcionar o Cine Majestic, em 1917, precedida da instalação do Cine Polytheama seis anos antes e da inauguração dos bondes elétricos em 1913/14, foi igualmente fator preponderante na já indisfarçada preferência de todos, elite e povo, pela Praça. Seria inevitável que o velho Banco do Passeio
para a Praça do Ferreira se transferisse, o que de fato ocorreu em torno de 1918, já sob a denominação de "Banco da Opinião Pública" ou simplesmente "o Banco" persistindo até 1968, pois a última reforma da Praça ocorrida neste ano e no seguinte não mais permitiria esse tipo de lazer.
para a Praça do Ferreira se transferisse, o que de fato ocorreu em torno de 1918, já sob a denominação de "Banco da Opinião Pública" ou simplesmente "o Banco" persistindo até 1968, pois a última reforma da Praça ocorrida neste ano e no seguinte não mais permitiria esse tipo de lazer.
(Otacílio de Azevedo, "Fortaleza Descalça", Fortaleza, Edições da Universidade Federal do Ceará, 1980, p. 66).
Situava-se O BANCO quase em frente ao Cine Majestic e à Farmácia Pasteur, esta sucedida pela loja Binoca (nº 538 da rua Major Facundo). Quem integrava O BANCO detinha as melhores e mais altas posições sociais, econômicas ou culturais de nossa terra: o alto comerciante Antônio Diogo de Siqueira (Sogro do futuro Prefeito, por duas vezes, médico César Cals, avô do futuro Governador Coronel César Cals Filho e bisavô do futuro Prefeito engenheiro César Cals Neto), João Quinderé (irmão do Pe. Quinderé, que a ele atribuiu a iniciativa da transferência de O BANCO do Passeio para a Praça), o médico Meton de Alencar, os comerciantes Vicente de Castro, Tibúrcio Targínio e José Rola, o professor Guilherme Moreira, o engenheiro João Nogueira, o Cartorário Felino Barroso, tendo este último participado dessa roda e de outras até quando passou a residir com seu filho Gustavo no Rio de Janeiro, em 1924. De uma dessas fazia parte Miguel Soares, pai do ex-seminarista, meu colega no Liceu e futuro Juiz Lourival
Soares e Silva, o "Frei Joaquim", assim apelidado pelo professor Martinz de Aguiar. Miguel Soares tinha a delicadeza de levar, todas as noites, Felino Barroso à sua residência na rua Major Facundo nº 170.
Porque se ausentassem do Ceará, porque a idade não mais permitisse o seu comparecimento ou porque a morte os fisgasse, foram uns sendo substituídos por outros, passando a comparecer às reuniões do grupo o jornalista Demócrito Rocha, João Mac Dowell, Manuel Pombo, Adolfo Siqueira (prefeito interino da cidade, como Presidente da Câmara Municipal, em substituição a Ildefonso Albano, que assumira a Chefia do Executivo Estadual com a licença e a morte de Justiniano de Serpa), o bancário Antônio Ferreira Braga (o Braguinha, do London Bank), os futuros desembargadores Eugênio Avelar Rocha, José Pires de Carvalho e
João Jorge de Pontes Vieira, os professores Luís Costa, Hermenegildo Firmeza, Raimundo Gomes de Matos e José Vítor Ferreira Nobre (os dois primeiros meus mestres de História Natural e História Universal no Liceu do Ceará, respectivamente, enquanto os dois últimos eram consagrados catedráticos da Faculdade de Direito), o banqueiro Luís Vieira (irmão de João Jorge), Joaquim Lima (irmão de Herman), o proprietário Afonso Medeiros, o assim chamado major Henrique Ellery e o próprio monsenhor José Quinderé ou, como toda a cidade o tratava, padre Quinderé.
(Raimundo Girão, "Geografia Estética de Fortaleza", 2ª edição, Fortaleza, Banco do Nordeste do Brasil, 1979, p. 195).
Com as alterações feitas na fisionomia da Praça (em 1920 e 1925 pelos Prefeitos Ildefonso Albano e Godofredo Maciel, em 1933 pelo Prefeito Raimundo Girão e em 1959/62 pelo Prefeito Cordeiro Neto, que abriu quatro passagens para carros, duas de cada lado, com sacrifício da área do logradouro), o banco sofreu deslocamentos que muito prejudicaram o comparecimento de seus membros.
Nenhum outro endereço foi tão relevante para a história cultural do Ceará como a Praça do Ferreira, onde até mesmo os bancos sediavam encontros. As rodas de conversas justificavam denominações como o Banco dos Católicos e o Banco da Opinião Pública, reduzido depois para simplesmente "O Banco".
Esclarecido fique que, bem antes desses dois bancos, muito conhecidos e comentados por quantos cronistas falam da Praça, e ainda quando os quiosques permaneciam de pé (dos fins do século passado ao ano de 1920), organizaram-se outras turmas em torno dos assentos do principal logradouro da cidade, como aquele em que Otacílio de Azevedo se sentava, nas proximidades do Café Iracema (esquina sudoeste do quadrilátero), cujas tertúlias tinham início na barbearia de João Catunda (sita em modesto prédio da rua Floriano Peixoto), prolongavam-se em um banco próximo e findavam invariavelmente em torno de uma mesa daquele restaurante. Era a Academia Rebarbativa e dela faziam parte, além de outros e do memorialista citado, Genuíno de Castro, Carlos Severo e José Gil Amora. (Obra citada, idem, p. 55).
Mozart Soriano Aderaldo
Continua...
Fontes: Portal da História do Ceará (Gildásio Sá), ACL 1995/1996, Nirez
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