domingo, 8 de junho de 2014

Nas ondas do rádio - Década de 40 (Parte III)

Os Diários e Emissoras Associados (a nova administração da emissora cearense) investiu profissionalmente no aperfeiçoamento da redação, apresentação dos programas e no que diz respeito à contratação de artistas renomados para se apresentarem nos auditórios da PRE-9. Dentre as atrações que passaram pela emissora cearense estiveram nomes como: Dilú Melo, Linda e Dicinha Batista, Manézinho Araújo e Uyara de Goiás, que eram recebidos como celebridades nas apresentações de auditório, que reuniam um público ansioso por conhecer de perto os ídolos, que até então só eram reconhecidos pela voz ou nas revistas vindas do Sul do País. Desde a chegada do rádio ao Ceará, os veículos impressos desempenharam um importante papel na divulgação dos eventos e da programação da pioneira Ceará Rádio Clube


Natal dos Lázaros - De pé, na apresentação do Show para os hansenianos (anos 60) o radialista Manuelito Eduardo Campos, que participou da Campanha por 32 anos.
Com a expansão do novo meio, os jornais passaram a explorar assuntos que ganhavam repercussão entre o público leitor, dentre estes, as campanhas sociais feitas pela emissora. O Natal dos Lázaros, por exemplo, foi uma das campanhas de maior destaque da rádio e que teve duração de 38 anos. 

“Eram apelos através dos microfones para que os ouvintes ajudassem a oferecer aos internos dos dois leprosários (Antônio Justa e Antônio Diogo) um Natal menos triste, com presentes, festas, missas ‘shows’, visitas, etc” (LOPES, 1994, p.142). 



Leprosário Antônio Diogo.
Além do Natal dos Lázaros, a PRE-9 também promoveu, por mais de 20 anos, o São João dos Lázaros. O jornal Correio do Ceará publicou, no dia 01 de junho de 1942, uma matéria especial sobre a campanha da Ceará Rádio Clube, que trazia como título: “Um pavilhão para os meninos leprosos – Será lançada, no próximo dia 23, a pedra fundamental – Cabral de Araújo fará o São João dos Lázaros em PRE-9”. A matéria comentava a generosidade do povo cearense e o empenho da emissora em 
ajudar os necessitados:

A iniciativa da PRE-9 foi coroada do mais compensador sucesso, graças à tenacidade dos seus dirigentes. Cabral de Araújo, o locutor chefe da emissora, foi o paladino dessa cruzada de filantropia que em todos encontrou a melhor guarida. Em poucos dias, conclamando os corações dadivosos, conseguiu a Rádio Clube local reunir uma soma apreciável de dinheiro e uma quantidade imensa de variedades ofertadas. (CORREIO DO CEARÁ, junho de 1942). 



Jornal Écos da Semana de 26 de setembro de 1948.


Visando angariar recursos para suas promoções, a emissora apostava na apresentação de grandes artistas locais e nacionais. O jornal Estado registrou, no dia 24 de janeiro de 1941, 
a participação de duas grandes estrelas nacionais na campanha em prol das vítimas da lepra. A matéria trazia como título: “Orlando Silva e Dorival Caymi cantaram para os Lázaros de Canafistula” (ESTADO, janeiro de 1941). 

Jornal Écos da Semana de 19 de dezembro de 1948.
Além de divulgarem as campanhas e realizações feitas pela PRE-9, os jornais também se envolveram em parcerias com a rádio. Os veículos impressos também publicavam as crônicas que iam ao ar pelo microfone da Ceará Rádio Clube. O programa “Cousas que o tempo levou” criado por Raimundo Menezes, na década de 1930, teve suas crônicas reproduzidas no jornal Gazeta de Notícia e, no ano de 1938 foram publicadas em livro. O programa trazia histórias de uma Fortaleza antiga e retratava “os usos e costumes de outras eras que se foram e não voltam mais e que merecem ser lembrados para conhecimento dos conterrâneos e dos porvindouros” (GAZETA DE NOTÍCIA, março de 1938). 


Jornal Écos da Semana de 21 de novembro de 1948.
Neste contexto podemos perceber que com a expansão do novo veículo, os jornais passaram a retratar na integra as crônicas irradiadas no rádio. Percebe-se que já nos primórdios da cultura de massa as mídias já convergiam entre si, nesse período o conteúdo dos jornais eram lidos, na íntegra, pelos radioamadores. Já durante as décadas de 1940 e 1950, os impressos passam a publicar seções especiais a respeito do veículo radiofônico. 

Os Programas de Auditório


Os programas de auditório consistiam em shows musicais, espetáculos de teatro,
circos e festas que induzindo o público a um estado de excitação contínua durante horas. Para
isso, os animadores contavam não apenas com a presença de cantores de sucesso, mas
também com o suporte musical de grandes orquestras, músicos solistas, conjuntos regionais,
humoristas e mágicos, aos quais se juntavam números exóticos, concursos à base de sorteios e distribuição de amostras de produtos aos presentes (TINHORÃO, 1981). Nessa época, os
estúdios e o auditório da Ceará Rádio Clube ocupavam os últimos andares do Edifício Diogo.
Os programas de auditório atraiam dezenas de pessoas para a sede da PRE-9. Blanchard Girão lembra que o local era de difícil acesso, por conta do prédio só possuir um elevador, porém nada servia de impedimento para os ouvintes assíduos. “Não se esperava o elevador, subia-se os dez andares a pé, coisinha pouca, pra tanta resistência juvenil” (GIRÃO, 1998, 273). 

As novas instalações da PRE-9 foram construídas obedecendo às necessidades da emissora,
contendo três estúdios e um palco-auditório com capacidade para 500 pessoas. O auditório, de excelentes dimensões, tinha toda a mecânica de um verdadeiro auditório. O palco, nas medidas ideais para comportar orquestra, piano de cauda, grupo de radioatores para os programas humorísticos, cantores e apresentadores, tinha cortina de veludo vermelho, a exemplo, dos grandes teatros (LOPES, 1994, p. 59).



Orquestras da Ceará Rádio Clube
Com a inauguração das suas novas instalações, a Ceará Rádio Clube investiu nos programas de auditório, que surgiram com os primeiros programas de calouros. Tais programas foram inseridos como mais uma opção de entretenimento e lazer, de vez que na cidade provinciana as cadeiras na calçada à noitinha era a oportunidade para o encontro e a troca de ideias. Jáder de Carvalho no seu livro Aldeota refere que "A roda-de-calçada vale por uma instituição. Vem do começo da cidade. Nela tudo se conversa, tudo se advinha, tudo se descobre. Apontam-se os casais infelizes. Dá-se notícia do movimento político. Entra-se na vida dos padres, das freiras. Aponta-se falta de recato, de pudor, em certo noivado (...) É uma maneira de conhecer Fortaleza sem sair de casa" (CARVALHO, 1963, p. 262-263).

A classe abastada fortalezense se divertia nas festas e nos bailes dançantes dos clubes sociais, excludentes aos menos favorecidos, para os quais restavam as alternativas dos passeios nas ruas do centro da cidade para “olhar as vitrines” ou uma ida ao Parque da Criança.

"Eu me lembro que nos pontos de encontro sempre se encontravam as mesmas pessoas. No cinema era a classe elegante que frequentava, vestia-se de paletó e gravata. Mas nos programas de auditórios era a classe média que ocupava o espaço.
Os populares não apareciam. Os programas de auditório eram muito bem 
frequentados." 
(BEZERRA, entrevista, 2006).



Auditório da Ceará Rádio Clube no Edifício Pajeú.
Dentre os programas de auditório de maior audiência estava o Clube do Papai Noel,
apresentado aos domingos por Paulo Cabral de Araújo, na sede do Edifício Pajeú. “As mães amantíssimas levavam os seus pimpolhos para cantar, declamar e fazer outros números artísticos” (LIMAVERDE, s/d, p. 53). Os artistas mais jovens da PRE-9 se apresentavam no programa para alegria da meninada que tinha como sonho virar astro do rádio. O programa era patrocinado pelo Sabão Pavão – “o melhor sabão do Brasil”


Gafes, piadas e histórias engraçadas ocorriam no decorrer das apresentações, sempre com o auditório lotado pelos radiouvintes. Paulo Cabral (2008) lembra da frequência constante de pais e filhos no auditório da PRE-9. “Para mim aquilo era uma alegria formidável, era uma maneira de aliviar o meu cansaço com o trabalho, era uma convivência direta com as crianças e os pais” (CABRAL, entrevista, 2008). 

Outro programa de auditório que fazia sucesso entre o público era o Programa de Calouros.
Os rapazes viam no show de calouros a oportunidade para tentar uma vaga no mundo mágico das celebridades. Para as ouvintes, aquele era um espaço privilegiado para “flertar, tirar linha, namorar, noivar, casar”, com um dos artistas locais ou nacionais que ali se apresentavam. Nesse espaço cunhou-se o termo popular “macaca de auditório”. Devido à superlotação dos espaços chegavam a ficar penduradas nas colunas, nas janelas, onde o corpo se adaptasse (ANDRADE E SILVA, s/d, p. 13).

Os programas de auditório registravam uma audiência cativa, porém somente
àqueles com determinado capital quer intelectual quer financeiro frequentavam as
apresentações da emissora. Outra atração que seduziu o rádio ouvinte foi a radionovela, de
rápida ascensão, ampliando sobremaneira a audiência e pautando as discussões nos espaços
públicos e domésticos da cidade.



Crédito: Francisca Íkara Ferreira Rodrigues (Graduada do Curso de Comunicação Social – Jornalismo, pela Universidade de Fortaleza – UNIFOR) e Erotilde Honório Silva (Professora Doutora em Sociologia, pela Universidade Federal do Ceará – UFC. Coordenadora da Pesquisa História e Memória da Radiodifusão Cearense – UNIFOR). A popularização do Rádio no Ceará na década de 1940: Trabalho apresentado no 7º Encontro Nacional de História da Mídia realizado em Fortaleza – Ceará, de 19 a 21 de agosto de 2009.)


Nenhum comentário:

Postar um comentário