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Há três anos começaram os estudos do porto. Entretanto, não se sabe ainda onde o mesmo ficará localizado. Se na enseada do Mucuripe, se em continuação da ponte de cimento armado, conforme a opinião de um dos especialistas...[...] Há oito meses que os operários do porto não recebem seus minguados salários.[...] O governo revolucionário deveria abolir a prática do fornecimentos, pagando em dias os seus empregados, diaristas ou não, e resolver o problema portuário do Ceará, com a maior brevidade, porque o povo, vendo em tudo isso uma cópia grosseira do passado, e enfarado que se acha de promessas falazes, não acredita mais nas excelências reformistas, preconizadas e enaltecidas pelos apóstolos da Nova República”. (A RUA, 09/09/1933 p 03).
Acervo Carlos Juaçaba |
O não pagamento dos operários era apenas “a ponta do iceberg” em relação à dinâmica total da obra. Havia também a problemática da licitação, pois foi aberta uma concorrência para saber qual seria a empresa responsável pela construção. Concorreram para tal as firmas Cristiani Nielsen e Geobra Civis e Hydraulicas. "As propostas foram abertas por uma comissão presidida pelo engenheiro Oscar Weischenck*, que designou um engenheiro para dar parecer a respeito. Ao que consta, esse parecer já está lavrado e é favorável à firma Cristiani Nielsen. No departamento, consta, entretanto, que já foi apresentado um protesto contra esse parecer”.(CORREIO DO CEARÁ, 22/10/1934, p. 01), com a alegação de que venceu a proposta menos econômica. Além da possibilidade de fraude na licitação, o governo ainda tinha que responder aos fornecedores dos materiais, pois o pagamento também se encontrava em atraso.
*Diretor do Departamento de Portos
Esta matéria dO Nordeste nos revela o corolário de interesses em jogo na construção do porto. Mesmo o leitor mais obtuso em matéria de economia política, não pode deixar de notar a pressão que os capitalistas exerciam no governo, no sentido de retorno dos seus investimentos e gerenciamento dos seus lucros. Os investimentos nas obras do porto absolveriam capitais de ambos os circuitos, primários e secundários. Haveria um fluxo de capitais, com o objetivo de anular o espaço pelo tempo.
O porto de Fortaleza iria acumular capitais de vários setores, além do papel que cumpriria na circulação de mercadorias. Um latifundiário da capital ou do interior do Estado poderia exportar mercadoria com um menor custo. O desenvolvimento do porto, convergia para o desenvolvimento econômico da cidade, e dos setores capitalistas que dela faziam parte.
A grande e velha esperança do Ceará vai, desta feita, felizmente, tomando as cores de uma consoladora realidade. Fruto é verdade, de uma terrível seca, de que os nossos sertões, largo tempo guardarão ominosa lembrança. Pode-se dizer assim, que os eternos estudos de outrora, lograram o seu fim. Já está marcado de vez o local e os técnicos se lançam afanosos, aos trabalhos das plantas definitivas. (IDEM, 11/11/1933, p. 03).
Os discursos sobre o Porto de Fortaleza expressavam, em sua grande maioria, os anseios das frações capitalistas de desenvolvimento econômico da cidade. O porto fulgurava como uma panaceia, trazendo a “redenção” dos flagelos da seca. Mais, no interior dos enunciados, cintilavam seus interesses primordiais, ampliação de novos canais de importação e exportação de mercadorias, novas oportunidades de angariar recursos e de desenvolver o comércio local. Percebemos a confluência visceral dessas falas, quando o decreto sobre a construção é, enfim assinado.
O presidente Getúlio Vargas assinou, ontem, o decreto fazendo a entrega, ao governo do Ceará, da importância correspondente a dois 2% ouro, para a construção do porto de Fortaleza, subindo essa importância a quinze mil contos de réis. Foi Também assinado o decreto que transfere para o governo do Ceará a construção do porto. (IBIDEM, 22/12/1933, p. 01).
O porto seria construído com uma boa parte dos recursos oriundo do Governo Federal, mas com a centralização administrativa do governo estadual. Diferentemente de outras melhorias urbanas, o porto conseguia agradar gregos e troianos. Não se levantava uma voz dissonante para negar os benefícios de tal obra, no máximo se ouvia ruídos para criticar a demora de execução das obras, atrasos salariais, ou discordância da localização geográfica.
Em relação à localização geográfica, uma das teses que eram defendidas por um largo setor da imprensa, baseada nos estudos do engenheiro Augusto Hor Meyll, situava a enseada do Mocuripe, como local privilegiado para construção da obra. A construção da cidade, não obstante, deveria convergir para tal, pois na época se construía uma estrada de ferro que ligava o centro de Fortaleza ao Mocuripe.
A linha férrea pode-se dizer que vai até o farol do Mocuripe, encontrando-se os trabalhos a uma distância de apenas cerca de 300 metros da ponta, distância essa que será coberta de trilhos destes para o mês seguinte. Os trilhos acompanham a praia, separando-se do mar, em certos trechos, por 5 ou 6 metros apenas. O leito da estrada de ferro será alargado, de 6 m.50, que tem agora, para 16 m.50, á direita de Fortaleza, afim de dar margem ampla para uma estrada de rodagem onde os dois automóveis possam simultaneamente trafegar na enseada que deve ser aterrada, em grande parte, para construção do cais, encontram-se 13 mil toneladas de pedra para a consolidação das grandes dunas locais. Esse enrocamento que é definitivo, com as outras obras atuais, tem ocupados uma turma de 120 operários, sob a chefia do Sr. Gastão Aranha. (IBIDEM, 25/08/1933 p. 01).
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¹Relação de engenheiros que foram enviados para estudar a realização do porto de fortaleza, ainda no império: 1854, Dr. H.A.Millet; 1858, o Dr. R.J.G Jardim e o Dr. Pierre Berthot; em 1860, o capitão-tenente Raja Gabaglia; em 1864, o Dr. Zozimo Barroso; em 1874, Sr. John Hawkshaw; e em 1881, o Dr. Milner Roberts.
Almanach administrativo, Estatístico, Industrial e Literário do Estado do Ceará para o ano de 1932 confeccionado por João da Câmara. Fortaleza: Empreza Tipographica. P. 230.
² As aspas em governo revolucionário, é por se tratar de um golpe de Estado e não de uma revolução social. Porém, foi mantido o termo, devido ao uso dele pelos partidários de Getúlio Vargas. Para uma análise que desconstrói o movimento de 1930 como uma revolução, ver: ( Dedeca, 1994).
Leia também:
Coluna da Hora - A polêmica em torno da construção do monumento
As melhorias urbanas durante a seca de 1932
A Seca e a Modernidade da Capital
Crédito: Artigo 'A produção do espaço urbano de Fortaleza à partir da Seca de 1932'http://www.fortalezanobre.com.br/2015/01/a-origem-da-praia-de-iracema-de-1920.html de Rodrigo Cavalcante de Almeida.
Fonte: http://memoria.bn.br/
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