quinta-feira, 25 de outubro de 2018

Maraponga: paisagens do ontem e do hoje


Uma estradinha de terra, árvores de verdes copas frondosas, o azul-lilás das serras ao longe, um caminho de água de cristalino azul, tudo isso rodeando uma morada que se instala na paisagem, como se fosse um elemento da natureza. A casa com seu amplo telhado, muitas janelas e a cor branca, que cobre as paredes, desperta um saudosismo bucólico na sensibilidade do espectador do quadro, como se o tempo tivesse dito adeus a esse tipo de cenário. 

Esta tentativa de descrição, que aqui se coloca, é a da imagem, que figura na capa de um disco de grande importância para a música popular brasileira e para a cearense, em particular, Maraponga, do cantor, compositor e músico Ricardo Bezerra, igualmente autor da capa. E lá se vão 35 anos, daquele hoje distante 1978.  (Para escutar o Lp no YouTube)

Atualmente, os moradores da localidade, ou os visitantes que a percorrem, não mais se deparam com essa atmosfera de remanso. A imagem, contudo, pode servir de guia para se conhecer a Maraponga – as várias Marapongas, seria uma melhor formulação – que vêm contando a história desse lugar: um bairro da cidade de Fortaleza

Lagoa da Maraponga na década de 70. Acervo Jornal O Povo.
Contar um pouco da história de Maraponga é falar, de início, na etimologia da palavra, que remonta a nossas origens indígenas e tem o significado de “mar agitado”; derivando-se de MBARÁ (mar) + APONG ou PONG (soar, emitir som, bater). 

Maraponga é um dos cento e dezessete bairros de Fortaleza, estando vinculado à Regional V. Dentro de Fortaleza, o bairro ocupa o seguinte quadrante: limita-se ao norte com o distrito de Parangaba; ao sul, com o Mondubim e o Jardim Cearense; a leste com o Jardim Cearense e o Dendê; e, a oeste, com o Manoel Sátiro

Inicialmente, Maraponga era um sítio ligado ao distrito de Porangaba. Hoje, pertence ao distrito do Mondubim, sendo dividida em: Carlos Studart, Lagoa da Maraponga, Luxemburgo e Maraponga.

E o bairro da Maraponga existe desde quando? Alguém curioso em justapor datas, criando um encadeamento temporal para a existência do lugar, deveria recuar no calendário até o ano de 1937. 
Na história mais antiga do bairro, assinala-se a cerimônia de lançamento da pedra fundamental da estação radioautomática, como tendo ocorrido no dia 18 de maio de 1937, com as presenças de autoridades federais, estaduais, municipais, eclesiásticas e da imprensa. À solenidade esteve presente também o Dr. Antônio Vieira, construtor da obra. A estação, há pouco referida, somente viria a ser inaugurada no dia 13 de dezembro de 1938, contando com as presenças do capitão Faria Lemos, chefe dos Correios e Telégrafos no Ceará, Edgard Teixeira, Jorge Moreira Borges e a de muitas outras autoridades. 

O Bairro que nasceu dos sítios”, conforme título da matéria da seção “O Povo nos bairros”, de 17/12/2012, redigida pelo repórter Geimison Maia, vem experimentando profundas modificações ao longo desses 76 anos. A fisionomia campestre foi cedendo à pressão da urbanização e, em decorrência da explosão demográfica, o comércio, partindo da principal artéria do bairro, capilariza-se pelas ruas, travessas e mesmo pelos becos. A especulação imobiliária vai interferindo na horizontalidade do lugar e as construções verticais vão despontando, dando conta da explosão demográfica da cidade e desvelando as soluções o mais das vezes canhestras, por vezes, perversas, encontradas pelo poder público e pela sociedade, que não atinam quanto ao paralelismo entre oikós (casa) e a noção de bairro: nossa casa na cidade. Ai de Vós, grandes centros urbanos, que as advertências do “velho Braga” encontrem eco, antes que a sentença final se torne irrevogável: “Então quem especulará sobre o metro quadrado de teu terreno? Pois na verdade não haverá terreno algum.” (BRAGA, 1979, p. 221) 

Da Maraponga antiga, dos sítios e das chácaras, faz parte um relato misto de triunfo e de tragédia pessoal, que é a história da Leila, cujo nome ficou atrelado ao lugar durante um bom período de tempo.
Já nos finais dos anos 60, e por toda a década de 70 o melhor cabaré de Fortaleza era a CASA DA LEILA, na Maraponga.

Hoje, para quem quer excursionar pelo bairro, saindo da Aldeota, a recomendação é tomar a Avenida Raul Barbosa, passando pelo viaduto do Makro, Avenida Carlos Jereissati, entrando na Bernardo Manoel, por meio da alça do viaduto, e logo em seguida na Avenida Dedé Brasil (Dr. Silas Munguba). Chegando-se ao Terminal de Parangaba, está-se a dois passos do início da Avenida Godofredo Maciel, via que corta o bairro, sendo importante ponto de referência da área. O trecho que vai do terminal de ônibus até a lagoa da Maraponga é reconhecido pela Prefeitura como Parangaba, dado que vale como fator de ordenação para a cobrança de IPTU e de outras taxas. 

O marco zero da Maraponga propriamente dita é a lagoa. Antes dela, há pontos comerciais diversificados: restaurantes, supermercados padarias, farmácias, motéis. 

Em Fortaleza de ontem e de hoje, Miguel Ângelo de Azevedo (Nirez) comenta: 

Antigamente Maraponga era um sítio muito distante da Capital, pertencente ao distrito de Porangaba, tendo como atração principal sua bela e grande lagoa de águas límpidas. A estrada que ia de Fortaleza para as cidades do centro do Estado passava ao seu lado. Era carroçável. Ou de terra batida, a chamada piçarra.

Em seguida, o pesquisador faz um cotejo entre duas fotografias, de um mesmo local, uma mais antiga e outra da época da publicação do Fortaleza de ontem e de hoje, 1991. Na primeira, revela que “havia apenas uma grande casa à margem da lagoa, pelo lado norte, e o restante era arborização natural”.


Estrada de Mondoig Atual Godofredo Maciel. Vemos a Lagoa da Maraponga. Assis Lima
Na segunda, a estrada já aparece “pavimentada de asfalto, já é bem larga e de linhas bem definidas. Várias construções existem e ninguém mais viaja a pé. A arborização sofreu muito e restam poucas árvores, principalmente do lado de Fortaleza.” Por fim, acrescenta, a título de conclusão: Maraponga deixou de ser um longínquo sítio pertencente ao distrito de Parangaba para ser hoje um bairro da Grande Fortaleza, servido de transporte coletivo como qualquer outro. É verdade que a lagoa diminuiu e que está muito mais poluída que antes, mas recente Lei preserva-a do avanço da especulação imobiliária. (AZEVEDO, 1991, p. 19).
Foto de 1991.

A lagoa de Maraponga está localizada a oeste da Bacia Hidrográfica do Rio Cocó e tem a Avenida Godofredo Maciel como principal meio de acesso. Caracteriza-se por apresentar uma paisagem natural de grande porte. Após a urbanização de suas margens, tornou-se um ambiente bastante frequentado pela população da cidade para atividades ligadas ao esporte e ao lazer. A grande área em torno da lagoa foi preservada no governo Ciro Gomes, no quadriênio 1991 - 1994. Centro de convergência do bairro, aos domingos, muitas famílias vêm aproveitar o espaço natural como ponto de divertimento e passatempo, ocasião em que exercem o caráter espontâneo da sociabilidade, aspecto que a vida nas metrópoles não costuma incentivar. 



Maraponga/Fernanda Coutinho - Fortaleza: Secultfor, 2014. (Coleção Pajeú)