Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga : Avenida Pessoa Anta
Fortaleza, uma cidade em TrAnSfOrMaÇãO!!!


Blog sobre essa linda cidade, com suas praias maravilhosas, seu povo acolhedor e seus bairros históricos.
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quinta-feira, 4 de julho de 2019

Fortaleza - Uma cidade colorida (Parte II)

Fortaleza - Junho de 2002

Conhecer o passado não é só estudá-lo , é conviver com ele. Passear em suas ruas, usufruir de seus prédios, aprender a ler sua história, que a cidade deixa escrita em cada canto, em cada pedra, em cada fachada e janela, em cada espaço.

Em Fortaleza o ProjetoCores da Cidade” é uma parceria da Fundação Roberto Marinho e da empresa Tintas Ypiranga, através da Secretaria da Cultura e Desporto do Ceará. Mas seu principal parceiro é a comunidade local. O projeto tem como objetivos beneficiar comerciantes, moradores e visitantes. Todos os moradores e comerciantes que tem suas casas na área do projeto podem participar. Os interessados recebem o material de pintura necessário e contam com a orientação técnica de especialistas em Restauração de Monumentos do escritório de arquitetura “Oficina de Projetos” para as obras realizadas nas fachadas.

Fundamentalmente a proposta é recuperar elementos de valor e de forma, tal que se revalorizem e retomem sua importância dentro do conjunto, recuperando o ambiente  urbano, de forma harmoniosa e contemporânea.

Imóveis participantes do projeto na época
Fortaleza : Um pouco de sua história

Quando Bernardo Manuel de Vasconcelos, o primeiro Governador da Capitania do Ceará, chegou à Vila de Fortaleza de Nossa Senhora de Assunção, em 1799, ficou decepcionado. A Vila, fundada em 13 de Abril de 1726, não passava de “um montão de areia, apresentando do lado pequenas casas térreas, incluindo a muito velha e arruinada casa dos Governadores”.

Cartão postal colorizado à mão, do início do século XX. Ancoradouro da Prainha. Acervo de Carlos Augusto Rocha Cruz
O viajante inglês Henry Koster visitou Fortaleza em 1810 e deu um diagnóstico mais preciso. Na opinião dele, seria difícil fazer nascer uma cidade sobre terreno tão arenoso. Além disso, faltava um cais. Apesar do pessimismo do inglês, o ancoradouro da Prainha ficou pronto e contrariando suas previsões, funcionava. Funcionava bem. Foi graças a ele que Fortaleza deixou de ser apenas um areal cheio de casas e iniciou suas atividades econômicas. O reconhecimento oficial do esforço da população local não custou a chegar. Em 17 de Março de 1823, por ordem imperial, a Vila de Fortaleza de Nossa Senhora de Assunção foi elevada à categoria de cidade com o nome de Cidade de Fortaleza de Nova Bragança e planta desenhada por Silva Paulet, em 1818.

Trabalhadores descarregando algodão no cais da Praia de Iracema em 1935. Foto: Robert S. Platt
Flatcar carregado com fardos de algodão no cais de Fortaleza em 1935. Foto: Robert S. Platt

Descarregamento de fardos de algodão no Porto em 1935.
Fotógrafo: Robert S. Platt
Alguns anos depois de virar cidade, o lugar foi calçado com pedras. Agora, os carros de boi, carregados de algodão, já podiam ir e vir. Era o começo da atividade mercantil que possibilitaria o início do desenvolvimento da cidade. 
Um cais, o calçamento de pedras, o algodão. Parece pouco. Mas com base nisso, no fim do século XIX Fortaleza já mantinha relações comerciais com a Europa. O interesse internacional despertado pelo algodão cearense chamou a atenção do resto do Brasil e logo chegaram os navios a vapor, estimulando os negócios de importação e exportação.

Carregamento de fardos de algodão até o flatcar no porto em 1935. Foto: Robert S. Platt
Porto de Fortaleza em 1935. Fotógrafo Robert S. Platt
Içamento de fardos de algodão via guindaste
no então porto de Fortaleza em 1935.
Fotógrafo: Robert S. Platt
O comércio local começou a se desenvolver. A cidade cresceu, a população aumentou, surgiram os primeiros prédios públicos como a Santa Casa de Misericórdia, a Cadeia Publica e a Assembléia Provincial. Fortaleza não parecia mais um areal. Era preciso um porto maior, cuja construção foi iniciada em 1923.

O surgimento do Porto do Mucuripe transferiu o embarque e desembarque de mercadorias e tirou a razão original de ser da região da Prainha com seus armazéns e edificações. Com o tempo, os prédios do local foram ocupados por escritórios, transportadoras, bares, prostíbulos, ateliês, restaurantes... Mas suas construções mais antigas, como a Casa Boris, a antiga Alfândega ( hoje Caixa Cultural) guardaram aquela historia de 150 anos atrás, do tempo em que Fortaleza começou a deixar de ser um areal desprezado e virou uma cidade de verdade. 


Içamento de fardos de algodão via guindaste no então porto de Fortaleza em 1935.
Fotógrafo: Robert S. Platt
Descarregamento de fardos de algodão em frente a Alfândega na rua Pessoa Anta em 1935. Foto: Robert S. Platt
Pilha de fardos de algodão em 1935. Foto: Robert S. Platt

Fardos de algodão na rua Dragão do Mar, esquina com a Almirante Jaceguai em Fortaleza 1935. Foto: Robert S. Platt

“A luz e a cor, definidores do espaço físico, são como uma musica que acompanha a cidade”.

Critérios de atuação - Avaliação do escritório de arquitetura Oficina de Projetos”:

Preservar o acervo arquitetônico de uma cidade é resgatar sua memória e melhorar a qualidade de vida de seus habitantes.
Restauração é ato crítico. Nenhuma proposta de restauração é neutra. Cabe-nos portanto a responsabilidade de estabelecer um conjunto de critérios que orientem as intervenções, assegurando ao monumento a sua autenticidade, a restituição da sua capacidade evocativa, o seu passado presente.

Dentro do processo de renovação urbana que seguiremos, levamos em conta dois aspectos: a RESTAURAÇÃO - Recuperação de elementos de valor de um imóvel, conhecimento de seus valores arquitetônicos e urbanísticos e REABILITAÇÃO - voltar a fazer aproveitável as estruturas mortas tanto dos bens imóveis, como áreas urbanas.




A área escolhida, tombada a nível estadual, esta limitada entre as Avenidas Pessoa Anta, Almirante Jaceguai, José Avelino e a famosa Rua Boris, no entorno do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, com um total de 56 imóveis entre sobrados e armazéns típicos de regiões portarias.

O conjunto arquitetônico que foi o objeto deste projeto foi um importante sítio de expansão da cidade e que deixou retratado o desenvolvimento econômico de Fortaleza. Hoje dentro deste conjunto foi construído o Centro Cultural Dragão do Mar de Arte e Cultura. O complexo arquitetônico do Centro Cultural tem uma área total de aproximadamente 30.000 m², compostos por Memorial da Cultura Cearense, Museu de Arte do Ceará, Anfiteatro, Planetário, Cinemas para 200 pessoas e Cine-Teatro para 250 pessoas, Salas de aulas do Instituto Dragão do Mar de Arte e Cultura e grandes espaços multifuncionais. O mais significativo é a interação urbana entre dois pontos da cidade através dos espaços do Centro sempre acompanhados por um contexto histórico. 


Pela primeira vez o Projeto Cores da Cidade se enfrenta a um projeto destas caraterísticas onde se contrapõem o antigo com um projeto novo, o Centro Dragão do Mar, com sua nova escala arquitetônica e intervenções a nível urbano, já que foram apropriadas, modificadas e alargadas ruas e praça integrando-as a outras, obrigando a um novo desenho urbano, onde o conjunto antigo mudou totalmente de contexto. 
O componente cromático do Centro Dragão do Mar foi levado em conta como premissa para nossa proposta (Branco nos grandes panos, cinza como detalhes de revestimento de mármores e vermelho nos componentes metálicos). O material utilizado como pavimento também influiu cromaticamente (pedra portuguesa em grandes áreas pavimentadas branca, com algumas áreas em negro).

Dentro do conjunto se definem claramente varias épocas de construção, estilos arquitetônicos e por tanto diferentes níveis de riqueza arquitetônica, sendo o conjunto em sua totalidade de grande valor.


O primeiro passo dentro da metodologia a ser aplicada foi conhecer a história do lugar, suas transformações, evolução arquitetônica, seu contexto e o repertório da cidade onde foi gerado este conjunto. Iniciou-se o trabalho com a elaboração de um inventário arquitetônico e de deterioro para cada imóvel com preenchimento de fichas catalográficas para criar um banco de dados. Nestas fichas, se anotaram as caraterísticas morfológicas de cada edifício, dos seus elementos compositivos (sacadas, fechamentos, postigos, ornamentos) e se executaram prospecções em alguns pontos pré-determinados para garantir as hipóteses sobre algumas das alterações. Foram executados prospecções estratigráficas que nos revelaram as cores originais, que nortearam de forma inequívoca o nosso projeto.

Inicialmente procuramos determinar as regiões mais adequadas à prospecção onde a fotografia foi de grande ajuda. Além do reconhecimento das sucessivas camadas de pintura que o prédio recebeu ao longo dos anos, nosso principal objetivo foi reconhecer as cores mais antigas e por conseqüência a cor original primária, onde foram encontradas as informação sobre a pigmentação empregada, dado que a intensidade era impossível determinar visto que tanto a base como os pigmentos empregados nas tintas eram de inferior qualidade, pois a cor, com o nosso sol, só é original no momento da sua aplicação. Foram utilizadas como método de identificação das camadas de pintura, as técnicas de decape, remoção com solvente e remoção mecânica através de bisturi.

Um dos importantes aspectos que o projeto teve em conta foi a reutilização de materiais e técnicas tradicionais na recomposição de elementos perdidos, e no uso de rebocos com cal.
O objetivo do ato de restaurar, entendido como revitalização é assegurar além da integridade física, a restituição dos seus valores simbólicos e de uma leitura integral do conjunto.


A pintura vem a ser elemento de destaque de um conjunto arquitetônico, daí a importância das cores para personalizar cada imóvel, realçar valores e as caraterísticas formais de cada elemento arquitetônico e de cada espaço urbano. Segundo correspondia, a cor pode utilizar-se para unificar ou individualizar, neutralizar ou acentuar, hierarquizar, subordinar, reforçar a volumetria do detalhe, desvirtuar ou apagar.

Os critérios utilizados para a seleção da gama cromática tendo em conta as premissas expostas foram os seguintes:

O fator estilístico: O estilo arquitetônico se relaciona diretamente com a época de construção e tinha seus códigos. Em nosso caso, edificações erigida a finais do Século XIX e princípios do Século XX: paredes com cores neutros, sendo os detalhes ou relevos destacados. Esquadrias, portas e janelas, cores afins mais escuros. As sacadas foram destacadas e os elementos de serralharia, grades, e portões de ferro em preto verdoso para apagar o reflexo. 

O fator de pesquisa arqueológica: Confirmando o fator estilístico, e elementos de interesse. 

O fator de uso: Para o que foi construído o imóvel. Determinando também o uso de cores.

O contexto urbano atual: Determinando premissas contemporâneas. Alem dos fatores técnicos, estéticos e históricos, outro fator importante que determinou em muitos casos a escolha das cores de cada imóvel foi o desejo e a opinião de cada proprietário, ou inquilino.
Tendo em conta todos estes elementos decidimos que deveríamos optar por cores fortes, jogando com a possibilidade que nos permite a ampla gama das tintas Ypiranga e manter uma coerência cromática, mas sem purismo mal entendido, já que as cidades históricas, incluindo-se o centro de Fortaleza, foram dotadas de uma sutil e vibrante policromia. Tratamos de criar uma gramática da cor, para dar esplendor a sua linguajem. 


Como aspectos gerais respeitamos o uso dos sanefas escuras, o remarque de portas e janelas com tons mais claros, também decidimos valorizar na Rua Boris cada edificação individualmente. Os conjuntos da Rua Dragão do Mar seriam reforçados todos seus elementos componentes nos aproximando o mais possível das cores originais. Os elementos de carpintaria originais foram restaurados. Na Rua José Avelino decidimos que as cores rememorassem o mais possível ao origem de edificações populares que caraterizam esta rua. Na Av. Almirante Jaceguai entre a Rua Boris e a Rua Almirante Tamandaré, onde funcionava antiga Fábrica Myriam, foi restaurada toda a fachada com seus elementos componentes investigados historicamente. Somente tomamos a liberdade de pintar cada modulo da fachada, individualizando cada divisão atual dos espaços interiores. E como moldura mais distante do Edifício do Centro Dragão do Mar.


Leia aqui a PARTE I

Fonte: Ofipro

segunda-feira, 25 de maio de 2015

Zé Tatá - O Grande Chalaça que entrou no folclore da cidade (Parte II)


Quem nesta cidade, nasceu, viveu mesmo como adventícios, não conheceu tal figuraça com porte de homenzarrão, de tez ligeiramente acinzada, com estatura de girafa e acentuada ginecofobia, que nas noites de Fortaleza fazia um tipo folclórico alegrando na sua casa de recursos, apontado, como principal recinto das mais lídimas libações nas noites enluaradas, sob um céu turquesa, onde as estrelas gravitam num faiscar brilhante qual cardume de pirilampos que, nos dias chuvosos invadem a imensidão do escuro com sua fosforescência no ar. Quem não viu, perdeu por não ter aproveitado as aprazíveis noites de “cabaré” com mariposa dengosa “cheia de requebros e molejos” numa vasta corte onde fazia parte um rei, um chalaça em caçoadas que passava as noites a distrair os que ali frequentavam em busca das meretrizes que no prostíbulo faziam o seu meio de vida, trocando carícias ou como diziam
nos seus versos o inesquecível compositor cearense - Aleardo Freitas - “vendendo amor a granel/ eu fico sem seu carinho/ me acostumo com esse papel/ sem dizer nada/ sem dizer nada”...


O que se tem de certo, é que Zé Tatá - José Vicente de Carvalho, foi o homossexual mais assumido da época, enfrentando sem destemor os preconceitos da sociedade para entrar no folclore cearense ganhando seu nome o viaduto da Avenida Alberto Nepomuceno, no cruzamento da rua José Avelino - antiga rua do Chafariz, General Mesquita ou SINGLEHURST (nome mais antigo), a denominação popular de TATAZÃO - em alusão ao trocadilho do nome ou pelo fato de se situar o último estabelecimento comercial e residencial no início da primeira quadra da rua José Avelino de logo reconhecido por todos pela opulência da estrutura e extensão do elevado ali erigido, permitindo passagem de cargas de alto porte, e demais veículos e pessoas que transpusessem por cima, por baixo e até servisse de morada dos desafortunados, que não têm onde morar.


O viaduto “Tatazão” veio aliviar sob forma o tráfego de carros e de pessoas, cortando as vias centrais Oeste-Leste, do Pirambu à AldeotaPraia.
Zé Tatá - não temia bravateadores e por vezes teve oportunidade de demonstrar sua valentia e quando forçado pelas circunstancias, era obrigado a por termo em situações vexatórias causadas por oprobiosos que se apresentavam na sua casa noturna para fazer baderna, que necessitavam urgente de corretivos.
Aí, Zé Tatá não tinha outra alternativa a não ser tomar as medidas drásticas e necessárias que o caso exigia. Por isso os que frequentavam seu ambiente noturno, não tinham receio de ser desrespeitados, porque contavam com a segurança e a valentia do dono da casa, que apesar de seus adamados gestos, na hora certa sabia defender seu estabelecimento pondo ordem e respeito a quantos lá permaneciam.


Assim o padrão de procedimento do famoso Zé Tatá somente a ele interessava, por inadmitir intromissão na sua postura porque não se mostrava “astroso”, manifestando muita astúcia no trato com os bordeleiros que reunidos em grandes número pareciam “abelha no coroamento do cortiço”, e, dificilmente, se abespinhava com os fregueses que o tratavam com respeito e cordialidade. Era uma casa de tolerância comandada por respeitado cáften, que no deslumbramento de suas atividades atraia para as “horizontais” que ali se hospedavam para o exercício da profissão.
Talvez se deva a esse conjunto de normas de conduta que pautaram sua existência, a grande popularidade que tomou conta de sua lendária personalidade, tornando-o conhecido e vulgarizando-o por suas aparências exteriores no folclorismo das tradições dos cearenses ou para investigações de folcloristas, ou, a quem pretende fazer estudo mais acurado sobre a sua personalidade, que só Freud explica ou os modernos psicanalistas.
Uma das coisas interessantes do ora focalizado, é que era conhecedor de todas as qualidades, defeitos e manias dos frequentadores, mantinha-se sereno, discreto dos segredos de alcova que tinha conhecimento e lhe eram confidenciados pelas raparigas... Era por assim dizer, confidente predileto dos casais que o amor procurava para dar alento a ilusão.Mas isso é coisa que o tempo levou e nunca mais devolveu aos corações apaixonados que acreditavam no amor da “grinfa” vendido a granel, coisa de antigamente e de cabaré!!!



Mas quem subisse as escadarias de qualquer uma das casas noturnas do temível (no bom sentido) Zé Tatá, como por exemplo Pensão UbirajaraHollywood, Tabariz, General Bezerril ao lado do Departamento do Correio e Telégrafo, ou da rua José Avelino n° 309, sentia de perto que " a felicidade é como a pluma/ que o vento vai levando pelo ar/ voa tão leve/ mas tem a vida breve/ precisa que haja vento sem parar ”... plagiando assim os versos insuperáveis do samba de Antonio Carlos Jobim e Vinicius de Morais.

Naquele tempo porque era “chic” toda mulher da comédia, ou andorinha, fazia questão de oxigenar os cabelos, amarelo aleonado e fulvo para se transfigurar e não ser reconhecida no bordel, chegando mesmo a mudar de nome “preferindo usar nome de guerra”, colocando um dente capeado a ouro de preferência dos um pré-molares que dava mais encanto a boca e ao sorriso, dificultando sua identificação perante a família. Grandioso era o escândalo que poderia causar à família se fosse descoberto o seu paradeiro numa das  “pensões altas”  do Centro da cidade. Era como se o mundo tivesse desabado sobre aquele lar, antes pacato e recatado, perante toda vizinhança que contristadas, participava das desventuras dos amigos em sinal da mais alta solidariedade humana e demonstração de amizade, às vezes indo a “moça falada” parar no Bom Pastor, situado na Praça Fernandes Vieira - Liceu do Ceará, hoje Praça Gustavo Barroso, dirigido por irmãs de caridade, cujo objetivo maior
era cuidar das órfãos, que vinham de diversos recantos do Ceará, ensinado-lhes artes manuais - bordados nos diversos tipos, crochê, culinária etc. Situado no recanto da Praça ocupava grande terreno cujos fundos alcançavam as margens do açude João Lopes, como costumeiramente era chamado.



Para quem ultrapassava o portão de entrada do Bom Pastor, sentia a consternação no íntimo, estampada dentro d'alma até no percurso entre os muros que fazem ladear o caminho extenso que separa de nós visitantes até chegar à capelinha ali existente. Os que lá dentro estão a transparecer tristonhos a revelação de magoa ou aflição, da desventura que a vida lhes reservou pagando o tributo com o recolhimento ao asilo privando do convívio comum para purgação dos pecados. Triste sina que o mundo reservou a quem desafortunado e sem sorte é obrigado a dar a sua contribuição como pagamento de pecado... todas com bisonha aparência, para uma recuperação do pecado cometido e depois voltar à casa paterna, numa forma de se depurar de todas as culpas, ou, purgando os pecados cometidos nas andanças em devaneio numa cidade outrora jovem tranquila que a todos compungia, e hoje causa medo
à traição que assalta a urbe a lembrar com saudade o passado não tão distante, e cheio de vivas recordações que dão alento abrigando no peito as gratas emoções que o tempo levou, deixando tortura no presente com ausências queridas que encheram e enfeitaram nossas vidas de bilontras duma pacata cidade, outrora participativa, de tudo tomava conhecimento, registrando fatos e episódios dantescos e burlescos para transformar no fim, o cearense amolecado, nos ditos gracejadores que chegam à comicidade, tornando-os muitas vezes pela espirituosidade verdadeiros cômicos.

Mas queridos leitores, não levem a mal esta mistura de coisas e fatos, porque no fundo tem um objetivo. O de não deixar esquecer tanta coisa boa que de vez em quando devem ser resgatadas para avivar a nossa lembrança, provocadas pelo animador das noites - Zé Tatá - que sorrateiramente balançava os corações com lindas “andorinhas” que vinham fazer ninho no seu famoso lupanar. 

Ah! Zé Tatá tão trêfego, no chamariz no seu bordelengo... As atrações se renovavam e, daí o sucesso, por estar sempre atualizando o plantel das “bagageiras” como parte dessa dicotomia na linguagem metafórica própria dos prostíbulos. Quem era Antônia passava a ser Marlene; RitaMarli, Sebastiana - Meire etc.

O astuto Zé Tatá, quando na sua pensão chegava “marafona” vinda do interior do Estado, a primeira providência era promover uma festa de confraternização, coincidente ou não com a data do aniversario da recém chagada. O que importava fazer era uma apresentação condizente da mesma a fim de atrair mais fregueses e a casa faturar mais. Mas com longos vestidos da mesma cor para o grande evento que se realizava para comemorar a chegada da rapariga adventícia.
Zé Tatá nunca exerceu o proxenetismo - Gay assumido e deslumbrado mas não era proxeneta, porque não intermediava casos amorosos para ganhar dinheiro. Mantinha em sua casa mulheres e quem lá comparecia estava disposto a participar das alegrias do ambiente, bebendo, dançando, sambando porque tudo era motivo de hilariantes saudações a “Baco” ao lado de lindas “moças-do-fado” que pululavam o recinto em forma de enxame a distribuir afagos, e, com perfumadas mãos acariciavam os assíduos participantes daquele festival de amor de mulher de cabaré.


Zé Tatá - estrela maior que cintilava do alto no sobrado comandando a trupe onde predominava a alegria e a satisfação das mulheres que desde a porta principal ou na entrada da escadaria que dava acesso ao sobrado, tinha como referência o ponto luminoso de uma lâmpada de cor vermelha a indicar que a parte superior do recinto destinado às libações dos dissolutos que por serem jovens, não tinham ainda senso de responsabilidade, mas também tarimbados, que aos principiantes davam verdadeiras aulas de ensinamentos de vida, cuja orientação servia como advertência na permanecia no prostíbulo. Para isso Zé Tatá, também era mestre, e dizia: “simpatia não se compra e nem se vende, nasce com a pessoa”... Era o seu lema de vida.

José Vicente de Carvalho, nasceu na cidade de Sobral, onde residiam seus familiares e se sentia orgulhoso por ter nascido na Princesa do Norte, embora permanecido mais tempo aqui nesta cidade, que lhe prestou uma homenagem ao pseudônimo ao viaduto conhecido como Tatazão por ser gigantesco e próximo ao seu recinto que serviu de
residência.


Dentre as moças camufladas que faziam residência fixa no chateau do Zé Tatá ou sejam as de mais idade, as “balzaquianas” ou coroas com mais de 30 anos, essas davam preferência aos rapazes mais jovens que por serem menos experientes careciam de orientação na desenvoltura do amor, o que ocorria inversamente, os maduros cidadãos, velhotes ou jovens há mais tempo, que só se acompanhavam dos brotinhos, hoje gatinhas que geralmente era lançamento novo da casa. Eram mais disputadas porque procedentes de outros estados ou mesmo de cidade interioranas, que de qualquer forma causavam sucesso, porque para cavalo velho capim novo...

Zé Tatá - com passividade a tudo assistia com muita fleuma, que talvez ao antropólogo ou psicólogo servisse como subsídio para estudo mais apurado de um comportamento histrião contudo facilmente se comunicava e transmitia aos frequentadores uma serenidade de quem o desenrolar de espetáculo previamente encomendado para distração dos que faziam uma alegria inusitada deixando correr célere a fama do cabaré.
Cheios de salamaleques os jovens se apresentavam às moças nas noitadas naquele recinto de prazer mundano cuja experiência se transmitia com o correr do tempo pelo grande mestre - o mundo - que ensinava aos jovens que não tiveram ou não receberam no convívio do lar, uma orientação segura e desenturvadora do comportamento.
Mas o bom mesmo naquele tempo, era participar e sentir de perto o amor vendido pela “grinfa” que na inexperiência de vida o retalhava mesmo sabendo que tudo não passava de uma momentânea e mútua atração sexual impulsionado pelos instintos dos jovens.
Pouca gente sabia ou tinha conhecimento do seu verdadeiro nome - JOSÉ VICENTE DE CARVALHO, inupto por devoção e convicção inveterada de sua personalidade, porque a alcunha de Zé Tatá vinha de Sobral, sua terra de origem da qual muito se orgulhava.
A pessoa José Vicente de Carvalho, era um cidadão, ser humano respeitador, dizem que muito pontual e correto nas suas transações comerciais, daí o grande segredo de ser por todos muito acreditado e ter durado décadas e décadas o seu ramo de negócio sem sofrer nenhum constrangimento comercial.
Sobretudo se revela a sua parte cintilante e agradável, pitoresca, e cheia de cavilações que a todos agradava por ser a até certo ponto, misto de ingenuidade e ignorância, sendo uma pessoa de poucas letras e cheio E de ensinamentos, o que merecia as atenções de quantos com ele privassem sua amizade. 


Também naqueles idos anos cinquenta/sessenta, a cidade ainda não tinha evoluído e crescido o bastante para entender ou comentar porque ainda nem se conheciam pessoas afetadas por “hábitos de consumo caro” sob aspecto formal e nem na gama de sua diversidade. Fala-se a boca miúda dos que faziam uso da “cannabis sativa”, “liamba” ou a mais conhecida e popular “maconha” no que se tinha o maior receio e cuidados para se noticiar quando alguém era apontado de fazer uso de maconha; para dar tal noticia chegava ao pé do ouvido da pessoa a quem transmitia notícia mas tinha o cuidado de em tom sutil e segredado e dizer: “sabe o filho do Sr. fulano” gente tão boa, família tão organizada, viu, estão dizendo que anda com más companhias e ainda não se tem certeza, mas, comenta-se que está fumando maconha... Oh desgraça terrível...!!!

Era um deus nos acuda a noticia dada sob o mais profundo e sepulcral segredo para que não fosse para alguém menos credenciado para receber tal revelação.
Tudo isso fruto de uma época de mais recato e pudor de vida como se dizia em respeito aos hábitos e costumes de nossa querida cidade de Fortaleza.

Hoje tão diferente! Depois que liberdade desenfreada tomou conta do nosso espaço terrestre o destemor as coisas de Deus a desobediência ao Ser Supremo e sobremodo a falta de respeito imperou sob todos os aspectos, pois, fuma-se, aspira-se os mais variados entorpecentes nos diversos recintos sem menor receio ou constrangimento de ser molestado, porque faz parte de uma juventude “descompromissada”, “alternativa”, “independente”, cujos valores morais são outros e estão pouco interessados em saber se vão ou não agradar, porque querem tão somente, mesmo inconscientes da verdade, atingir o nirvana.

Mas no Zé Tatá ou casa de José Vicente de Carvalho, não tinha disso não. A coisa lá girava de outra forma com pessoas de diversas camadas sociais de diferentes faixas etárias, mas todas com os mesmos propósitos de se divertirem e “pegar o sol com a mão” como se diziam nos velhos tempos - os jovens há mais tempo (velhotes) com a mesma euforia dos principiantes que durante a noite momentaneamente ficavam perdidos e apaixonados pela “horizontal” que só carinho tinha para dar e receber.
Também naqueles idos e recordados tempos ainda não se falava em “stress” ou “estressados”. Nem se tinha ouvido falar como hoje, em pessoas que apesar de jovens já suportam sobre si pesadas cargas emocionais que se valem dos cultores e especialistas no ramo, para tratar os “transtornos bipolares”; Naquele tempo, sobretudo, nos jovens a alegria
e a tristeza ocupavam o devido lugar nas horas certas. Mas com o mundo, mudaram as coisas também, evoluamos para ver onde as coisas vão chegar e principalmente os clones e outros inventos.
Pelo caminhar da carruagem vai chegar o tempo de se fabricar seres independentes de fecundação biológica, como exemplo já temos robôs?!... como tal, executando ordens sem pensar... fazendo miséria... teleguiados ou abúlicos? Mas fora brincadeira e deixemos de caçoada e vão pregar essa historia nos cafundós do Judas... Parece mais historia para inglês ver.
Mas o que vale a pena mesmo nesse despretensioso apanágio é o relato da figura de José Vicente de Carvalho, mais conhecido por Zé Tatá que por ser homenzarrão de corpo e estatura avantajada e que apesar de ter sido homossexual assumido, hoje “gay”, também tinha seu lado macho e quando entrava numa “imbuança” (como registra o termo Leonardo Mota) era temido e não levava desvantagem embora não gostasse de se envolver em “sururu” (brigas) porque não lhe metiam medo “os caga-baixinhos” nem suportava bafafá.
Não se perca da memória de nossa tão amada Fortaleza, quer por seus munícipes, pessoas estranhas, adventícias, nem queiram da lembrança apagar tipos que marcaram época e as que de certa forma engrandeceram com fatos e coisas de quaisquer natureza e se tornaram
valiosos, deixando registro de sua passagem no espaço de tempo que merece agora lembrar até porque insignificante que seja o relato, deve ter por todos nós o respeito pela própria cidadania e pelo aprendizado que se insere e transmite mesmo corriqueiros.

José Vicente de Carvalho dedicou a vida toda ao ramo negocial, cuja fonte principal era o de venda de bebidas. danceteria e casa de recurso.
Possuiu várias casas; umas melhores equipadas, mais chiques outras menos atraentes, mas todas obedeciam a certo padrão de preferência embora sem luxo, mas se comparava as que tinham bom estilo no mundo congênere.
Cultuava a boa música todas selecionadas com os cantores de sucesso da época onde desfilavam Nelson Gonçalves, Augusto CalheirosCarmem Costa, Ângela Maria, Augustinho dos Santos, Alcides Geraldi, Dircinha e Linda Batista e a famosa Araci de Almeida, Jorge VeigaDalva de Oliveira, Erivelto Martins, Carlos Augusto, Dorival CaymmiOrlando Silva, Jackson do Pandeiro, Silvio Caldas e uma gama imensa de cantores, que faziam o cancioneiro dos idos anos cinquenta/sessenta.

Tudo muda e não há nada eterno na nossa vida. A licenciosidade tinha a medida certa na sua dimensão. Naturalmente sempre houve de tudo e tudo se praticava, mas tinha local certo e não havia afronta direta em público. A turma mantinha mais respeito mesmo às raparigas que como profissionais mantinham-se dentro de uma certa linha de conduta no salão, deixando os afagos para o “quarto” - local certo para troca de carinhos. 



Dentre as casas que montou, sobressaíram muito bem durante muito tempo, - O Tabariz, casa noturna, situada na Avenida Pessoa Anta nº 120, prédio assobradado onde funcionou a Booth Line - Cia de Navegação; em seguida nos altos do prédio de rua Gal. Bezerril n° 156, em cima da garapeira - O Guará - ao lado dos Correios e Telégrafos;
depois montou nova pousada na rua José Avelino n° 309, vizinho ao Bar da Maria Cabelão; por último na rua José Avelino n° 156, ao lado do viaduto, que veio a tomar se nome, onde permaneceu até morrer, deixando lampejo do tempo, cintilando fagulha de recordações.



Mas onde quer que hoje esteja o velho “Chalaça” que não foi pária na sociedade e entrou e passou espontaneamente a fazer parte do folclore da nossa cidade, será sempre lembrado diante da homenagem tributada por populares como expressão da memória cognominando ao viaduto da Avenida Alberto Nepomuceno, lado do Quartel General, no cruzamento da rua José Avelino, que dar acesso à Avenida Mons. TabosaPraia de Iracema - Viaduto Tatazão - que por certo o imortalizará na concepção popular e se lhe for dada a feliz ventura de ouvir a música de sua maior preferência à bela página musical de Antônio Carlos JobimTom Jobim e Vinicius de Moraes, composta em 1957, inserida como
trilha sonora do filme “Orfeu de Carnaval” - A Felicidade - que repetidas vezes tocava durante as noites na Pensão Tabariz, embalou seu aprimorado gosto musical, cuja nobreza de sentimentos ainda hoje lembrada por todos que o conheceram, privaram de sua amizade, foram seus fregueses, frequentadores de suas casas noturnas.



Tristeza não tem fim/ Felicidade sim/ A felicidade é como a gota/ De orvalho numa pétala de flor/ Brilha tranquila/ Depois de leva oscila/ E cai como uma lágrima de amor/ A felicidade do pobre parece/ A grande ilusão do carnaval/ A gente trabalha o ano inteiro/ por um momento de sonho/ Pra fazer a fantasia/ De rei ou de pirata ou jardineira/ Pra tudo se acabar na quarta feira/ Tristeza não tem fim/ Felicidade sim/ A felicidade é como a pluma/ Que o vento vai levando pelo ar/ Voa tão leve/ Mas tem a vida breve/ Precisa que haja vento sem parar/ A minha felicidade está sonhando/ Nos olhos da minha namorada/ É como esta noite/ Passando, passando/ Em busca da madrugada/ Falem baixo, por favor/ Pra que ela acorde alegre como o dia/ Oferecendo beijos de amor/ Tristeza não tem fim/ Felicidade sim.

Zenilo Almada

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Parte I


Zé Tatá - O Rei da noite

Fonte: O Bonde e outras recordações - Zenilo Almada



domingo, 13 de abril de 2014

Especial Fortaleza 288 anos - Ontem e Hoje da cidade





Ontem a antiga Alfândega na rua da Praia (Pessoa Anta). Hoje é o Caixa Cultura.

O contraste da senhora de bermudinha e os dois guardinhas sentados num banco da Praça Almirante Saldanha.

Estamos na Praia de Iracema, ao longe a Igrejinha de São Pedro.

Rua da Praia - Hoje Avenida Pessoa Anta, homenagem a João de Andrade Pessoa Anta.

Ainda na mesma avenida

Bondinho da Prainha percorrendo a então rua da Praia, que também já se chamou rua da Alfândega.

Na Aldeota, vemos na Avenida Santos Dumont (Antiga rua do Colégio das Órfãs) a belíssima mansão da família Jucá. Foi adquirida da família em 1971 e hoje é Sede do Tribunal Regional do Trabalho do Ceará. Para quem não sabe, a casa foi inspirada na mansão que serviu como cenário para o filme "E O Vento Levou".
  

Avenida Almirante Barroso - Indo




Voltando...


Ideal Clube em sua sede do Meireles, construída entre 1940 a 1946.
  
Edifício São Pedro - Antigo Iracema Plaza Hotel, o "Copacabana Pálace" da capital cearense.


Inaugurado em 1929 na Praia Formosa. Em 1948, dá-se o lançamento da pedra fundamental da nova sede na Praia do Meireles (foto).

Curva da Avenida Alberto Nepomuceno, próximo a Sefaz.


Avenida Alberto Nepomuceno, já foi Avenida rua da Ponte e Avenida Sena Madureira.
  

Palacetes construídos por Emílio Hinko, ladeando o então Castelo do Plácido, local hoje ocupado pela Praça Luíza Távora




Ainda bem que pelo menos os palacetes resistem até hoje.


Prédio ainda conservado no cruzamento da rua Adolfo Caminha com rua Maranguape.
  


Ao lado da igreja, temos a Praça do Cristo Redentor, que na época, não passava de um areial. 

De um lado a Praça Cristo Redentor e do outro, ao invés das casas, o Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura.


Fotos ontem: Arquivo Nirez/IBGE
Montagem: Marcelo Luna


NOTÍCIAS DA FORTALEZA ANTIGA: