Dom Juan surtara. Variara. Ninguém tinha outra explicação. Fortaleza dos anos 50 não falava n'outra coisa. Por meses o assunto ia e voltava nas palestras das curriolas. Inesgotável. O sobressalto corria solto nas sedes das agremiações futebolísticas, Praça do Ferreira, cafés, delegacias de polícias, redações de jornal e pensões alegres. Crime bárbaro. Requintes de crueldade e perversão. Logo ele. Ex-jogador de futebol. Fidalgo como alguns poucos. Conversa fácil. Fino trato. Famoso por ter jogado em primeiros quadros de escretes como Tramways Futebol Clube, Light, Ceará Sporting Club, Seleção Cearense e outros grêmios. Atuava na linha. Tempo que na defesa existiam backs. No ataque center forward. Centroavante. Half direito e esquerdo ocupavam as laterais das quatro linhas. Goleiro de verdade se orgulhava quando alguém enchia a boca para chamá-lo de goal keeper. Da época que match era chamada de peleja.
Pois sim, o mocinho que virou bandido do dia para noite. Era o center half José Ramos de Oliveira, o Idalino. Foi tricampeão cearense em 1940, 1941 e 1942. No primeiro ano pelo Tramways e duas vezes pelo time de Porangabussu. Um craque entranhado na memória do historiador Airton Fontenele, 75. Formou ataques inesquecíveis ao lado de Assis, Zecapinto, César e Djalma. Com a camiseta alvinegra mandava ver com João Brega, França e Mitotônio. Um jogador. Meia direita. Camisa 8. O homem da armação...
Armou um dia e jogou contra o próprio patrimônio. Pôs tudo a perder. Fama, mulher, amásia e nome na praça. Já estava fora dos gramados. Em 1948, chuteiras aposentadas. No dia 13 de outubro de 1950, voltara às primeiras páginas dos jornais da aldeia. Esporte? Polícia. Tava lá: ''Barbaramente decapitados!'. ''Falando à reportagem, às 13 hs de hoje, Idalino revelou que matara na Pensão da Graça com a cumplicidade da amante''. O ex-craque havia matado dois comerciantes paraibanos para se apossar de um Chevrolet 1950, placa 2127. Rodas embutidas. Top de linha. Tomou pra si o carro. Cobiça. Dívidas. Desespero.
Chevrolet 1950... Era o tempo também dos caríssimos Cadillacs norte-americanos. Conversíveis. Capota e vidros com acionamento automático. Quatro marchas e motor 8 cilindros. Rabos de peixe. Cara de buldogue. Arredondados. Metálicos e perolados. Dos britânicos e charmosos Triumphs. De encher os olhos e valer muito. Volante à direita, painel de madeira. Esportivo e competição. Do mesmo naipe do Chevrolet 50. Era a chance pra saldar as dívidas. Tirar a corda do pescoço. O pé-de-meia tinha ido ralo a baixo. Farras e pensões alegres. Bem aparentado, tava em todas. Homem pra mais de metro e oitenta. Bigode ralo. Pano passado. Metido a garanhão. Esposo, namorado e gigolô.
Pensão da Graça. Casa de mulheres de vida fácil. Fácil? Alcinda Leal era a dona e Idalino, amante. Proxeneta. Homem dela. Ia pra lá, mas não pagava. Bebia e comia. Regalias. A pensão ficava ali. Em frente ao portão do antigo Mercado Central. Entre a Praça dos Leões e a Catedral. Foi lá, na alcova real, onde Aloísio Milet Martins Ribeiro e Geraldo Cavalcante de Brito foram abatidos. Literalmente. Barras de ferro. Ocultação de cadáveres. Cumplicidade.
Depois de ter acertado a compra do Chevrolet, na Paraíba, Idalino convidou os dois para receber o restante do dinheiro em Fortaleza. No dia 1º de setembro executou o que tinha armado. Após serem recepcionados por Alcinda, o gigolô levou Aloísio até o quarto. Morte 1. O corpo foi escondido, primeiro, no depósito de bebidas. Depois guarda-roupa. Em seguida liquidou a fatura. Alcinda viu os corpos ensacados e enrolados em panos. Quis alarmar. Foi ameaçada de morte. Calou-se. Tarde da noite sumiu com os corpos. Idalino alugou um jeep. Foi do Centro de Fortaleza para a Barra do Ceará. Lá sepultou o que restou das vítimas. Na casa da mãe de Alcinda, ateou fogo nas roupas e teréns dos infelizes.
O carro dos comerciantes foi negociado. Idalino trocou o Chevrolet por um Nash. Recebeu ainda 40 mil cruzeiros. Na delegacia, um mês e pouco após o crime, confessaria o latrocínio. O dinheiro era pra honrar compromissos. Se livrar dos canos. Sair do prego. A amante estaria atolada em dívidas por causa do amante. O POVO do repórter policial Eutímio Moreira estamparia em manchete do dia 16 de outubro: ''Quase todo o dinheiro foi empregado no pagamento das dívidas de Alcinda''.
Empenhada. Doze mil cruzeiros foram parar as mãos de um agiota conhecido por Tobias. Resgate de jóias da amante. Em seguida fez um pagamento de 3 mil na Caixa Econômica. Penhor também. Disse ter pago ainda uma hipoteca de 7 mil cruzeiros que tinha feito com uma casa de Alcinda. Comprou, finalmente, um revólver por 3 mil e doou outros 3 mil para a dona da pensão. O restante foi empregado no conserto carro que recebeu e 700 estavam no bolso.
Condenado, Idalino puxou xadrez na Cadeia Pública de Fortaleza. Prédio onde funcionou a Emcetur. Em 1968, a desembargadora Auri Mora Costa concedeu a liberdade condicional ao ladrão do Chevrolet 1950. Foi a deixa para seu desaparecimento. Correu para as bandas do Rio de Janeiro. Família. Amigos de futebol. Velhas histórias. Dia daqueles acharam um corpo em Belfort Roxo. Boataria. Traços do center half. Era conhecido por onde passou e jogou bola. Suspeita desfeita por repórter de O POVO que viajou ao Rio. Não era o homem. Chá de sumiço.
Pois sim, o mocinho que virou bandido do dia para noite. Era o center half José Ramos de Oliveira, o Idalino. Foi tricampeão cearense em 1940, 1941 e 1942. No primeiro ano pelo Tramways e duas vezes pelo time de Porangabussu. Um craque entranhado na memória do historiador Airton Fontenele, 75. Formou ataques inesquecíveis ao lado de Assis, Zecapinto, César e Djalma. Com a camiseta alvinegra mandava ver com João Brega, França e Mitotônio. Um jogador. Meia direita. Camisa 8. O homem da armação...
Armou um dia e jogou contra o próprio patrimônio. Pôs tudo a perder. Fama, mulher, amásia e nome na praça. Já estava fora dos gramados. Em 1948, chuteiras aposentadas. No dia 13 de outubro de 1950, voltara às primeiras páginas dos jornais da aldeia. Esporte? Polícia. Tava lá: ''Barbaramente decapitados!'. ''Falando à reportagem, às 13 hs de hoje, Idalino revelou que matara na Pensão da Graça com a cumplicidade da amante''. O ex-craque havia matado dois comerciantes paraibanos para se apossar de um Chevrolet 1950, placa 2127. Rodas embutidas. Top de linha. Tomou pra si o carro. Cobiça. Dívidas. Desespero.
Chevrolet 1950... Era o tempo também dos caríssimos Cadillacs norte-americanos. Conversíveis. Capota e vidros com acionamento automático. Quatro marchas e motor 8 cilindros. Rabos de peixe. Cara de buldogue. Arredondados. Metálicos e perolados. Dos britânicos e charmosos Triumphs. De encher os olhos e valer muito. Volante à direita, painel de madeira. Esportivo e competição. Do mesmo naipe do Chevrolet 50. Era a chance pra saldar as dívidas. Tirar a corda do pescoço. O pé-de-meia tinha ido ralo a baixo. Farras e pensões alegres. Bem aparentado, tava em todas. Homem pra mais de metro e oitenta. Bigode ralo. Pano passado. Metido a garanhão. Esposo, namorado e gigolô.
Pensão da Graça. Casa de mulheres de vida fácil. Fácil? Alcinda Leal era a dona e Idalino, amante. Proxeneta. Homem dela. Ia pra lá, mas não pagava. Bebia e comia. Regalias. A pensão ficava ali. Em frente ao portão do antigo Mercado Central. Entre a Praça dos Leões e a Catedral. Foi lá, na alcova real, onde Aloísio Milet Martins Ribeiro e Geraldo Cavalcante de Brito foram abatidos. Literalmente. Barras de ferro. Ocultação de cadáveres. Cumplicidade.
Depois de ter acertado a compra do Chevrolet, na Paraíba, Idalino convidou os dois para receber o restante do dinheiro em Fortaleza. No dia 1º de setembro executou o que tinha armado. Após serem recepcionados por Alcinda, o gigolô levou Aloísio até o quarto. Morte 1. O corpo foi escondido, primeiro, no depósito de bebidas. Depois guarda-roupa. Em seguida liquidou a fatura. Alcinda viu os corpos ensacados e enrolados em panos. Quis alarmar. Foi ameaçada de morte. Calou-se. Tarde da noite sumiu com os corpos. Idalino alugou um jeep. Foi do Centro de Fortaleza para a Barra do Ceará. Lá sepultou o que restou das vítimas. Na casa da mãe de Alcinda, ateou fogo nas roupas e teréns dos infelizes.
O carro dos comerciantes foi negociado. Idalino trocou o Chevrolet por um Nash. Recebeu ainda 40 mil cruzeiros. Na delegacia, um mês e pouco após o crime, confessaria o latrocínio. O dinheiro era pra honrar compromissos. Se livrar dos canos. Sair do prego. A amante estaria atolada em dívidas por causa do amante. O POVO do repórter policial Eutímio Moreira estamparia em manchete do dia 16 de outubro: ''Quase todo o dinheiro foi empregado no pagamento das dívidas de Alcinda''.
Empenhada. Doze mil cruzeiros foram parar as mãos de um agiota conhecido por Tobias. Resgate de jóias da amante. Em seguida fez um pagamento de 3 mil na Caixa Econômica. Penhor também. Disse ter pago ainda uma hipoteca de 7 mil cruzeiros que tinha feito com uma casa de Alcinda. Comprou, finalmente, um revólver por 3 mil e doou outros 3 mil para a dona da pensão. O restante foi empregado no conserto carro que recebeu e 700 estavam no bolso.
Condenado, Idalino puxou xadrez na Cadeia Pública de Fortaleza. Prédio onde funcionou a Emcetur. Em 1968, a desembargadora Auri Mora Costa concedeu a liberdade condicional ao ladrão do Chevrolet 1950. Foi a deixa para seu desaparecimento. Correu para as bandas do Rio de Janeiro. Família. Amigos de futebol. Velhas histórias. Dia daqueles acharam um corpo em Belfort Roxo. Boataria. Traços do center half. Era conhecido por onde passou e jogou bola. Suspeita desfeita por repórter de O POVO que viajou ao Rio. Não era o homem. Chá de sumiço.
Fonte - Jornal O Povo (Demetrio Túlio)