Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga : Major Facundo
Fortaleza, uma cidade em TrAnSfOrMaÇãO!!!


Blog sobre essa linda cidade, com suas praias maravilhosas, seu povo acolhedor e seus bairros históricos.
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sábado, 25 de julho de 2015

Lojas Milano - Meio século no coração da cidade


Em 31 de agosto de 1965, era inaugurada a loja Milano Roupas S/A., dirigida por Oscar Roque Bezerra, presidente; Anselmo Roque Bezerra, Vice-presidente; Expedito Leite de Sousa, diretor comercial; e Venício Prata, diretor financeiro, na rua Major Facundo nº 584, na Praça do Ferreira

É inaugurada em 03 de dezembro de 1971, com bênção de Dom Miguel Câmara, na rua Barão do Rio Branco, sua filial Di Roma. Em nome dos proprietários falou Clóvis Arrais Maia, presidente da Federação do Comércio.



Em 14 de outubro de 1972,
Oscar Roque lança com sucesso em suas lojas Milano e Di Roma, as bolsas capanga (A capanga é um dos mais clássicos modelos de bolsa masculina, que fez bastante sucesso nos anos 70 e 80), para homens. 

Nesse local, seria construído o prédio que abrigou a Lojas Milano durante 50 anos. 
A foto é de 1955

A fachada da Milano. 
Foto de Davi M.

Milano era sinônimo de tradição!
Foto de Igor R.


A Milano foi vizinha da Farmácia Oswaldo Cruz por meio século... É, será difícil olhar naquela direção e constatar que a Milano não estará mais lá... :(

Imagem Google Street

Imagem Google Street

Após 50 anos, Milano fecha as portas


"Inaugurada em 31 de agosto de 1965, as lojas Milano baixaram as portas para sempre. Milano significava seu Oscar, um comerciante respeitado em Fortaleza até os dias de hoje.

Segundo funcionários da Farmácia Oswaldo Cruz, outro comércio do século passado, os proprietários são um casal de idosos. O dono, seu Oscar, está com Alzheimer, a esposa, dona Socorro, é cadeirante. Eles decidiram fechar porque não tem filhos e nem parentes que deem continuidade ao negócio e eles estão muito debilitados.

Milano em seus últimos dias...


"Não é crise econômica, é falta de condições pessoais", comentam os vizinhos. "Não dá para ter certeza se fecharam de vez, pra sempre", comentou um cliente emocionado, com olhos marejados.

Mas eles vão mesmo fechar... Vão mesmo fechar."
Roberto Moreira 
(Diário do Nordeste)


A conceituada loja deixará saudades!!!

"...essa geração de consumidores alienados que consomem marcas na intenção de encontrar espaço em algum grupo social, perdem a oportunidade de consumir qualidade, padrão e estilo que a citada loja oferecia. Fui cliente, tenho uma calça estilo italiana que foi ajustada por um alfaiate da própria loja, que a percepção de valor pela qualidade se tornava bem barata.
É difícil um empresário que tem filosofia de qualidade se render ao consumo descartável que encontramos em modo geral."                    


"... a Milano tinha uma clientela fiel, é que falta a sucessão empresarial, proveniente do vínculo familiar. É uma pena."


"Bom gosto e qualidade são atemporais. Tudo é uma questão de estilo."



"Fez história, assim como a farmácia Osvaldo Cruz e o Cine são Luís fazem parte da praça do Ferreira e de Fortaleza."


"Milano e Di Roma, duas lojas chiquérrimas muito inovadoras para a época!"

"Sou advogado, morei em Fortaleza nos anos 90 e início dos anos 2000, tenho boas recordações desta loja, um senhor vendedor da Milano que me ensinou a dá nó de gravata, no início da minha labuta advocatícia."


"Que pena estou triste eu era cliente da Milano a muitos anos!!!"


"Eu lembro que minha mãe ia comprar meu fardamento num armazém próximo... eu devia ter uns 7 anos, passava por aquela loja bonita não muito grande... eu achava o máximo, vai deixar saudades, só quem é dessa época sabe bem o q falo... É uma pena, uma tradição na cidade passar por isso..."


"Que notícia triste! Meu pai só compra roupas lá, o atendimento era excelente."


Atualização:
falindo, a Loja Milano fechou as portas em 2015.
Seu Oscar faleceu em 2017. 😥

Mais comentários AQUI


Fonte: Cronologia Ilustrada de Fortaleza de Miguel Ângelo de Azevedo e
Portal do Ceará de Gildácio Sá 




sábado, 24 de janeiro de 2015

Club Cearense - O primeiro clube de Fortaleza


Os clubes sociais recreativos foram criados pelos ingleses no século XIX. Formaram-se a partir de uma associação de pessoas reunidas, em lugares permanentes, com um objetivo comum - como os oficiais, que, retornando à Londres das guerras napoleônicas, buscavam um lugar de encontro para refeições e reminiscências. Até 1883, os clubes eram, em geral, restritos aos homens, quando, então, surgiram aqueles exclusivamente femininos. 


Expressão da sociabilidade e da utilização do tempo de lazer, os clubes representaram, no princípio, um privilégio das classes economicamente favorecidas. Com a diminuição das horas de trabalho e uma melhor distribuição da riqueza, surgiu, no século XX, um grande número destas associações, oferecendo atividades recreativas e culturais aos associados, os clubes atuam como agentes socializadores do lazer.

A partir de 1831, Fortaleza passou a manter relações comerciais regulares com a Europa. Para aqui vieram ingleses, portugueses, alemães e franceses que, estabelecendo-se nesta cidade, abastaram-se com seu comércio. 

Muitos destes estrangeiros tornaram-se parte do corpo diplomático. Como representantes dos vice-consulados estrangeiros no Ceará, uniram-se às importantes famílias da terra. Nessa época, a cidade desenvolveu sua integração com o capitalismo internacional, consolidando-se como centro político e econômico do Ceará. Foram os ingleses que construíram, em Fortaleza, os portos, os desembarcadouros (como a conhecida “Ponte dos Ingleses”) e a Via-Férrea. Trouxeram a iluminação da cidade com hidrogênio carbonado (The Ceará Gás Company Limited), o seu abastecimento de água (Ceará Water Work Co. Ltd.) e a eletricidade para o transporte coletivo dos bondes e para a iluminação elétrica de Fortaleza (The Ceará Tramway Light & Power Co. Ltd).

O baile de inauguração do Club Cearense

Antes da existência dos clubes, as reuniões da alta sociedade de Fortaleza aconteciam em seus salões residenciais. Formada por pessoas de sólida posição econômica, dispondo de condições de lazer e refinamento cultural nos grandes centros do Velho Mundo, a elite fortalezense, associando-se aos europeus aqui radicados, fundou no dia 19 de abril de 1867, copiado do modelo inglês, o seu primeiro clube: o Club Cearense. Inaugurado com deslumbrante baile* no dia 7 de setembro do mesmo ano, num sobrado residencial da rua Senador Pompeu, de propriedade de Dona Manuela Vieira, o Club Cearense posteriormente se instalaria defronte ao Passeio Público, emoldurando o logradouro mais elegante da cidade. Primeiramente, ocupou o prédio da esquina da rua Floriano Peixoto, que serviria, mais tarde, ao Hotel do Norte, depois pertencente à Coelce


Belíssimo prédio situado em frente ao Passeio Público, na esquina das ruas Floriano Peixoto e Dr. João Moreira. Segundo endereço do Club Cearense.




A seguir, ocupou o belo palacete na entrada da rua Major Facundo, que aparece num croqui** feito por Gustavo Barroso, reproduzido, a partir do seu livro de memórias. Este palacete serviria, depois de reformado, ao Palace Hotel, sendo hoje a sede da Associação Comercial do Ceará

O Club Cearense era frequentado pelas famílias mais destacadas de Fortaleza. Promovia encontros regulares de amigos e parentes, conversações, leituras, jogos de bilhar francês, recitais de poesia, apresentações musicais e deslumbrantes bailes. O Club Cearense conquistou, como escreveu Raimundo Girão, “o ápice do nosso aprimoramento social, com os seus salões sempre a giorno, com os seus jogos de recreação, a finura de seus dirigentes, o fausto de suas partidas dançantes”

Depois o Club Cearense ocupou o belo palacete na esquina da rua Major Facundo com Dr. João Moreira, em frente ao Passeio Público.



Nascido no tempo do Segundo Reinado, o Club Cearense contava, entre seus associados, com titulares do Império, representantes consulares, comendadores, magistrados e médicos famosos da cidade, além dos mais ricos proprietários da terra. Para o pesquisador da história de Fortaleza, os sócios do Club Cearense representavam, com segurança, as figuras mais destacadas do Ceará no século XIX. Apesar do seu prestígio, o Club Cearense não superou as dificuldades financeiras nos tempos republicanos, cerrando suas portas na passagem do século XX.


Vanius Meton Gadelha Vieira



*O baile de inauguração foi iluminado por lampiões a gás hidrogênio carbonado. O clube surgiu da necessidade de congregar a gente elegante da terra. Seus jogos de salão, bailes e o luxo dos seus associados ofereceram a Fortaleza a formação do primeiro e mais importante reduto social da aristocracia da época. Muitos sócios do Club Cearense pertenciam à Associação Comercial do Ceará, inaugurada um ano antes do clube. Eram administradores, comendadores, representantes de consulados estrangeiros, juízes, vereadores.

** Croqui de Gustavo Barroso:



Fatos Históricos do Club Cearense:

  • 19/abril/1867 - Surge o Club Cearense na Rua Formosa (Rua Barão do Rio Branco) nº 50 (antigo), iniciando suas festas no dia sete de setembro num sobrado da Rua Senador Pompeu, pertencente a Manuela Vieira. Depois esteve no prédio da esquina da Rua Dr. João Moreira com Rua Major Facundo (hoje Associação Comercial) e depois na esquina da mesma Rua João Moreira com Rua Floriano Peixoto. Seu primeiro presidente foi Vitoriano Augusto Borges.

  • 07/setembro/1867 - Primeira festa realizada pelo Club Cearense, no sobrado na esquina da Rua da Misericórdia (hoje Rua João Moreira) com Rua Boa Vista (hoje Rua Floriano Peixoto). Sua sede ficava na Rua Formosa (hoje Rua Barão do Rio Branco) nº 50, ocasião em que houve a primeira experiência com a iluminação com lampiões a gás hidrogênio carbonado.

  • Janeiro/1901 - Extingue-se o Club Cearense.

Fonte: Cronologia de Fortaleza - Nirez









sábado, 13 de dezembro de 2014

Reinauguração do Cine São Luiz


26 de março de 1958 - Quarta-feira, inaugura-se, às 21h, o Cine São Luiz, na Rua Major Facundo nº 510, na Praça do Ferreira, do grupo Luís Severiano Ribeiro, exibindo o filme Anastásia - a princesa esquecida, de Anatole Litvak, com Ingrid Bergman, Yul Brinner e Helen Hayes, película da 20th Century Fox, em cinemascope.
Antes houve uma exibição somente para a imprensa, do filme Suplício de uma saudade, com Jennifer Jones e William Holden, da 20th Century Fox, em cinemascope e em cores de luxe.
A sala de projeção é dotada de 1.400 poltronas, adquiridas à firma paulista Brafor.
A tela tem 14 metros de comprimento, para filmes em cinemascope.
As paredes e o teto foram decorados em gesso, trabalho iniciado por Osório Ferreira e terminado por Marcelino Guido Budini.
A pintura foi feita por Schaffer & Harvath.
Foi o primeiro cinema em Fortaleza a ter ar-condicionado, da marca Carrier.
O projeto foi do arquiteto Humberto da Justa Mesnescal (Humberto Menescal).



A população cearense está prestes a receber de volta um dos equipamentos culturais mais emblemáticos do Estado. Após passar por uma reforma orçada em R$ 15,2 milhões, o Cine São Luiz será reinaugurado no dia 22 de dezembro deste ano. Sua nova configuração como cine-teatro - permitida a partir da instalação de uma tela móvel de exibição e da reestruturação da caixa cênica redescoberta no espaço - permitirá que o equipamento receba além de sessões de cinema, espetáculos de teatro, dança e música.

Iniciadas em dezembro de 2013, as obras de restauração e recuperação do Cine São Luiz agora estão bem perto de ser concluídas. O espaço recebeu um pacote de melhorias nos sistemas de iluminação, acústica, climatização, piso e revestimento, além de novos assentos e equipamentos de projeção. O investimento de R$ 15.287.832,21 feito pelo Governo do Estado, através da Secretaria da Cultura (Secult), possibilitará que o equipamento histórico-cultural seja devolvido à sociedade como um dos mais modernos da atualidade. Ao mesmo tempo, o Cine São Luiz ainda estará resguardado de memória, pois as características arquitetônicas originais, em suas qualidades estéticas e históricas, foram mantidas.


Os meses de reparo e restauração serviram para que o cinema ganhasse uma nova funcionalidade: a de teatro. A redescoberta da potencial caixa cênica de 20 metros, que estava inutilizada, fez com que a as obras tomassem outro rumo. O cinema ganhou espaço de um teatro: um palco, que foi totalmente recuperado. Com ele também vieram reparos em outros agregados como camarins e o espaço para receber músicos de orquestra, o fosso.


Com a conclusão das obras, a Secult cumpre com o compromisso de entregar o equipamento pronto até o fim deste ano, destacado pelo secretário da Cultura, Paulo Mamede, como prioridade. A finalização da restauração do espaço foi um trabalho em conjunto realizado pela equipe de restauro, coordenada pelo restaurador José Luiz Motta, sob a supervisão de profissionais como o engenheiro Paulo Renato, daSecult, o arquiteto Robledo Duarte, do Departamento de Arquitetura e Engenharia (DAE), do Governo do Estado, e o engenheiro José Cardoso, da Construtora Granito, responsável pela execução da obra.


Cine histórico

Inaugurado em 1958 e fechado desde julho de 2010, o Cine São Luiz, tombado pelo Governo do Estado em 1991, em reconhecimento a seu valor como patrimônio histórico e arquitetônico, também receberá novos equipamentos de projeção e de áudio. “O Cine São Luiz vai ser o cinema mais bonito deste País e continuará servindo como referência para várias gerações do Estado do Ceará e de Fortaleza”, já reforçava o Secretário da Cultura, Paulo Mamede, em meados da execução da obra.


Créditos: Livro Cronologia Ilustrada de Fortaleza de Miguel Ângelo de Azevedo (Nirez) e http://www.ceara.gov.br/


domingo, 3 de agosto de 2014

O transporte coletivo em Fortaleza - Entre 1945 e 1960 (Parte III)


A retirada dos bondes 


Arquivo Assis Lima

Em 19 de setembro de 1946 o capitão Josias, seu Batista e o advogado da Ligth apresentaram pela primeira vez ao governo no Palácio da Luz um plano para suspender o tráfego de bondes em Fortaleza e salvar as finanças da companhia.
Os bondes já não serviam para a cidade e modelo de exploração estava esgotado. 
Restava garantir a continuidade do serviço de luz e cuidar para que os fortalezenses não pagassem a conta. 
Por outro lado, os apelos para a manutenção dos bondes sensibilizaram o novo interventor federal no Ceará, coronel José Machado Lopes, que, em resposta ao Memorial da Federação das Associações de Comércio e Indústrias do Cearáconsiderou que somente autorizaria a retirada dos bondes se a Light garantisse o transporte da população lançando mão de outra estratégia. Afinal, até então, “economia, eficiência e comodidade [eram] artigos que a Light reserva[va] exclusivamente para uso próprio”.



Vista de um postal de 1940 da rua Major Facundo - Arquivo Nirez

Se a suspensão dos bondes elétricos dividia opiniões, a ineficiência da Light em acompanhar o crescimento de Fortaleza era consensual. A cidade estava no caminho do progresso. Em breve atingiria a população de 200.000 habitantes e necessitava de mais bondes, mais linhas e da duplicação das que já existiam.
Os caminhos do Centro à Vila de Messejana e da Praia de Iracema ao promissor lugar do Mucuripe, onde estava sendo construído um porto, mereciam cuidados urgentes¹. Isso demandava recursos da concessionária – talvez por isso a sugestão do interventor José Machado Lopes em manter o novo transporte ainda sob a batuta inglesa não tinha agradado a opinião pública. 

Mas, infelizmente, a Ceará Light pouco ou nada liga ao progresso da nossa urbs. [...] parece primar em tratar-nos como se fôssemos povos coloniais, de civilização rudimentar e aspirações limitadas. [...] É o caso de perguntar-nos: quando nos veremos livres dessa malfadada companhia estrangeira que tão acintosamente abusa de nossa paciência?


Bondinho na Avenida Pessoa Anta - Arquivo Nirez

Em março de 1947, o governo brasileiro firmou contrato com a Inglaterracriando uma comissão mista com representantes dos dois países para avaliar as condições financeiras e as necessidades da empresa “Great Western da Leopoldina Railway e dos serviços de força, luz e bonde de Manaus, Belém e Fortaleza”, com interesse de nacionalizá-los.
Como de praxe, no dia 17 de março, o capitão Josias prestou contas ao Governador Faustino de Albuquerque sobre “a calamitosa situação em que encontra a Light”. Revelou que o governo inglês repudiara a proposta brasileira de ceder os capitais congelados em Londres para os reparos nas instalações em Fortaleza, o que dificultava ainda mais a gestão da empresa. Sem manutenção na usina, a cidade corria sério risco de ficar às escuras. Entretanto, o interventor acreditava que, em cerca de um ano, a Light estaria saneada, com a usina operando com óleo diesel e livre do oneroso serviço de transporte público. 


Serão muito provavelmente retirados de circulação os bondes da Light, com o que os fortalezenses ficarão privados do seu principal meio de locomoção, pois não se pode negar que assim é, malgrado a quase imprestabilidade dos antiquados tramways.

O transporte, mais que nunca, virara um tema indigesto. Tanto a disposição pública em nacionalizar os prejuízos da empresa quanto a retirada dos bondes inspirou a indignação popular. Os deputados estaduais enviaram um ofício para o governador pedindo informações sobre o futuro dos serviços de força, luz e transporte da Capital e sobre o destino da Light, recebendo como retorno respostas lacônicas


Bonde Soares Moreno

E, com a inglesa com os dias contados, os bastidores das suas relações com o governo passaram a ocupar os políticos da ocasião. Udenistas e pessedistas protestavam na tribuna da Assembleia Legislativa contra o descaso da companhia com a população. Bradavam opiniões contra a proteção especial que os governos reservavam à empresa, fazendo vista grossa aos compromissos contratuais, elevando tarifas e deslocando recursos públicos diretamente para a empresa. 

Confrontando dados estatísticos de 1920 e 1940, o deputado Valdery Uchoa fez ver que aquela empresa estrangeira continuava, numa data e noutra, com o mesmo capital empregado na sua usina e no seu serviço de transporte. Ao referir-se à encampação da Light, foi aparteado pelo deputado Barros dos Santos, que perguntou: 
- V. Excia. sabe quanto a Light tem do governo? Estou informado de que o coronel Machado Lopes entregou 2.000 contos do povo àquela companhia! 
Ouviram-se palmas.


Interior dos antiquados Tramways.

É provável que os motivos de tantas reclamações de políticos se fundamentassem no impacto que o tema causava nos humores do eleitorado. A aceleração da urbanização das maiores cidades brasileiras no período pós-guerra fez com que os problemas de transporte público se destacassem nas preocupações da ainda tímida mas relevante classe média urbana, usuária de ônibus e bondes. Isso chamava a atenção dos candidatos.²
A presença da falida companhia estrangeira em cada uma das principais artérias da capital exaltava os ânimos dos defensores do nacionalismo econômico. Os privilégios que outrora a Light tivera podiam ser identificados com a proteção inconsequente do período autoritário. Em 24 de maio de 1947, a Gazeta de Notícias publicou uma reportagem com a manchete: Nos tempos da ditadura - Quando reclamar contra a cobiça da Ceará Light era considerado crime contra a segurança do regime em que era denunciada a perseguição a um ex-deputado opositor da empresa.



Vista Parcial da Usina da Light

No meio do debate, em maio de 1947, a Light resolveu paralisar duas caldeiras da Usina de Força e Luz que estavam danificadas e em risco de explosão. A medida, aprovada pelo governador para evitar o colapso total dos serviços, acarretaria uma considerável diminuição da geração de energia e gerava um impasse contratual: 

Impõe-se uma medida urgente para o racionamento de energia [...] A Light não pode tirar os bondes de circulação por não ter com que pagar as indenizações garantidas aos operários pelas leis trabalhistas. O Estado, igualmente, não pode autorizar tal retirada porque consequentemente se responsabilizaria pela indenização decorrente da 
dispensa dos operários. Outrossim, a suspensão de energia para deixar os bondes em circulação traria uma crise muito maior pois a consequente paralisação da indústria traria desemprego [...] ao passo que uma crise transportes seria de mais fácil solução.
Outrora símbolos do progresso da Capital, os bondes eram, passados 35 anos de funcionamento, obstáculos ao desenvolvimento. Entre paralisar a indústria e enfrentar uma crise de circulação, anunciavam-se os problemas de transporte de Fortaleza que chegavam. A solução, como de costume, foi conciliatória e improvisada. No dia 17, o prefeito da Capital, Jorge Moreira da Rocha, o capitão Josias e a comissão de técnicos federais acordaram com o Governo do Estado um plano emergencial para garantir o fornecimento mínimo de eletricidade, estabelecendo reduções do uso nas indústrias, nas ruas e retirando os bondes de circulação provisoriamente por cinco dias.


¹“Em 24 de janeiro de 1948, a Empresa Iracema inaugura a linha Centro, da Praça Waldemar Falcão ao Cais do Porto, no Mucuripe, utilizando quatro ônibus mistos, para o transporte de cargas e passageiros”. O Porto do Mucuripe tinha um ramal ferroviário que o ligava à Parangaba desde 1941. ESPÍNOLA, Rodolfo. Caravalelas, jangadas e navios: uma história portuária. Fortaleza: Omni, 2007. 


Praça Waldemar Falcão

Ônibus da Empresa Iracema

² A constituição de 1946 excluiu o direito de voto aos analfabetos, legando à classe média, embora numericamente incipiente, um papel determinante nas escolhas políticas. Suas inclinações nacionalistas ligadas ao desenvolvimento e o processo de urbanização no segundo pós-guerra podem ser acompanhadas em SKIDMORE, Thomas. Brasil: de Getúlio a Castelo (1930 a 1964). Rio de Janeiro: Saga, 1969 e SAES, Décio. Classe média e sistema político no Brasil. São Paulo: TA Queiroz, 1985.  

Créditos: Patricia Menezes (Mestre em História Social pela Universidade Federal do Ceará). Dissertação: FORTALEZA DE ÔNIBUS: Quebra- quebra, lock out e liberação na construção do serviço de transporte coletivo de passageiros entre 1945 e 1960


quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

O Cajueiro da Coragem


Por volta do ano de 1797, no tempo do Brasil - Colônia, o Ceará era governado pelo oficial da Marinha Portuguesa Luiz da Mota Féo e Torres*. Fortaleza era ainda uma pequena aldeia, muito embora tivesse o status de capital do Estado.



Havia nas proximidades da atual Praça do Ferreira, um frondoso cajueiro, a cuja sombra um certo Fagundes talhava a carne, que vendia à população. Na época, o local onde hoje se encontra a Praça do Ferreira, havia uma vila de casas, conhecida por Beco do Cotovelo, de cuja extremidade partiam três ruelas  (Ruas Pedro BorgesMajor Facundo Liberato Barroso) e na saída de uma delas, estava o cajueiro.

Fagundes morava numa casinha em frente e fazia da sombra do cajueiro, seu açougue

Certa vez, passando a cavalo por baixo da árvore o Governador Feo e Tôrres, um galho baixo arrancou-lhe o chapéu, que caiu no chão.  
Feo e Tôrres chamou Fagundes, que estava por perto descansando, e mandou que lhe apanhasse o objeto caído. Fagundes não se moveu do lugar. O Governador repetia a ordem e o outro, ainda, não deu um passo, nem se alterou. Não gostava de ser mandado, muito menos quando o pedido não era feito com educação.


Feo e Tôrres, indignado por esta desobediência, avançou para Fagundes e disse-lhe que pretendia apenas cortar o galho baixo, mas que agora, mandaria derrubar a árvore toda. E seguiu para o Palácio.

Do palácio, na Rua Conde d’Eu, partiu a ordem de deitar abaixo o cajueiro. 
No dia seguinte vieram os homens do Governador armados de machados para cumprir a ordem recebida.
Fagundes protestou e à frente dos seus magarefes armados de facas, não deixou que os soldados executassem a ordem e expulsou-os.
Voltaram acompanhados de soldados. Já o Fagundes lançara pela pacata vila o brado da revolta. Auxiliado por açougueiros, fiandeiros, merceeiros, carapinas, ferreiros e até por pescadores, todos armados de pistolas e bacamartes, levantou trincheiras na encruzilhada de três ruas, e abriu fogo contra a tropa, que recuou.


Daí o nome das três ruas perpetuando o episódio: Rua do Cajueiro (Pedro Borges), Rua das Trincheiras (Liberato Barroso) e Rua do Fogo (Major Facundo)
Após o ocorrido, o governador desistiu de derrubar a árvore, Fagundes ficou triunfante e o cajueiro no seu lugar.

A questão do cajueiro não foi uma simples briga de galos, mas um acontecimento retumbante, quase uma revolução. Deve ter sido um conflito sério e grande, bastante para passar à História e à crônica.


Livro Fortaleza Velha de 
João Nogueira



*Luiz da Motta Féo e Torres e seu governo no Ceará

Resolvida a muitas vezes impetrada a exoneração do governador Coutinho de Montaury, houve por bem a Metrópole mandar a governar a Capitania do Ceará, o cadete e moço fidalgo Luiz da Motta Féo e Torres.
A Carta Régia de sua nomeação data de 12 de janeiro de 1789.



Caso curioso: 

Partindo ele do Reino, aportou à colonia a 14 de novembro e com as formalidades prescritas foi empossado ao cargo a 9 do mesmo mês.
Teve por secretário José de Faria, o mesmo que servira com seu antecessor.
Como militar que era, e pelo muito atraso e desarranjo que encontrou nesse ramo de serviço, foi das primeiras ocupações do novo governador a de fazer construir em frente do aquartelamento um pequeno reduto de madeira, em que trabalhou a tropa terraplenando o terreno, reduto que ficou guarnecido com peças e alguns reparos vindos de Pernambuco.
O que havia limitava-se a algumas peças quase desmontadas e incapazes de servir, colocadas sobre um monte de areia sem mais estacada ou coisa que o valha, e tudo isso condecorado com o título pomposo de forte. rsrsrs
A tropa compunha-se então de um bando de maltrapilhos, que de longa data não conheciam outro fardamento senão a camisa e ceroulas, figurando mais de mendigos do que de soldados e portanto provocando a compaixão dos nacionais e o escárnio de algum estrangeiro, que por acaso aportava e percorria a colonia.



Revista Instituto do Ceará de 1890



segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Cine Merceeiros - 1930


O Cine Merceeiros da Associação dos Merceeiros

No dia 5 de abril de 1914 era fundada, em Fortaleza, a sociedade beneficente Associação dos Merceeiros, que se propunha a desenvolver atividades instrutivas e de defesa dos comerciantes de estivas e miudezas a retalhos e empregados no comércio, entidade que se mantem ainda hoje em pleno funcionamento.

A associação instalaria, dezesseis anos depois, na sua sede à rua Major Facundo, 421, esquina com rua Clarindo de Queirós, na Praça do Carmo, o Cine Merceeiros. A festiva inauguração ocorreu, no sábado, 1º de novembro de 1930, com a comédia A Ver Navios (Why Sailors Go Wrong; Fox Film Corp., 1928, 6 rolos, direção de Henry Lehrman, argumento de William Conselman, cenário de Randall H. Faye, com Sammy Cohen, Ted McNamara, Sally Phipps, Nick Stuart, Jack Pennick e Carl Miller).

O “Correio do Ceará” (3.11.30), registrou assim a inauguração:

INAUGUROU-SE ANTE-HONTEM O CINEMA DOS MERCEEIROS

Ás 19 horas, do dia 1º, na sede da conceituada Associação dos Merceeiros, fez-se a inauguração festiva do Cine Merceeiros, o qual se apresentava com todo o conforto e escrupulosa organização, representando mais um serviço de vulto conseguido pela atual Diretoria do pujante Centro de classe.

Convidados fomos para assistir o acto, e enviamos aos dirigentes os nossos parabéns, bem como toda nossa sympathia.
O cinema a partir dessa data ofereceu uma programação semanal, com filmes já lançados pelo circuito Severiano Ribeirotendo exatamente cinco anos de existência...

Quando comemorava o seu quinto aniversário, na noite de 1º de novembro de 1935, o Cine Merceeiros foi atingido por um incêndio que determinou o fim de suas atividades. Na festiva noite, que a fatalidade marcou, o filme exibido era “Manda Quem Pode" (Disorderly Conduct; Fox Film Corp.,1932, 7.400 pés, direção de John W. Considine, estória e diálogos de William Anthony McGuire, continuidade de Del Andrews, edição de Frank Hull, fotografia Harry Dawe, com Spencer Tracy, Sally Eilers, El Brendel, Ralph Bellamy, Ralph Morgan, Alan Dinehart, Cornelius Keefe, Sally Blane, Nora Lane, Dickie Moore, Claire Maynard, Pat O'Malley, Frank Conroy e Pat Harmon).

Reportando o incêndio que determinava o fim do Cine Merceeiros, o “Correio do Ceará”, no dia 4 de novembro de 1935, publicou a seguinte matéria:

O INCÊNDIO DO CINE MERCEEIROS

UMA COMMEMORAÇÃO FATÍDICA:
MANDA QUEM PÓDE!

Estava commemorando o seu 5º anniversario, o “Cine-Merceeiros” que é um dos mais populares cinemas da capital, quando, na 3ª parte da fita do dia, irrompeu o inesperado fogo, cerca das 9 horas da noite do dia 1º.

A Origem do Incêndio
Começou o fogo na “cabine” no momento em que a fita “quebrava" tendo o operador, no intuito de desembaraçar a pellicula, demorado um pouco a corrente sobre o espelho voltaico, occasionando o calor excessivo sobre o celluloide. Das versões que corriam no momento, esta nos parece mais razoavel. As chammas tomaram violentamente, toda a cabine de madeira, transmitindo as Iabaredas ao forro.
Percebida a realidade do perigo, estabeleceu-se ƒormidavel confusão. A “cabine" que fica atraz da platéa, estando coberta de Iabaredas, impediu a unica porta de acesso ao salão; sendo as inumeras portas laterais todas de “varanda". Ficou a assistencia toda cercada sem sahida rapida.
No primeiro instante, o "elemento masculino” não tergiversou: voou pelas varandas. Mas, num momento de heroica reflexão, numerosos cavalheiros voltaram a acudir o “elemento feminino” que assombrado, gritava tragicamente.
Viu-se, então, “raro trabalho" de salvação: senhoras, senhoritas e crianças carregadas, com viva presteza, por cima das grades de ferro que “avarandam todo o quarteirão” ocupado pelo majestoso palacete da “Associação dos Merceeiros" localizado à rua General Clarindo, entre Major Facundo e Marechal Floriano.

Os Seguros 
Informaram, no momento, de não haver seguros, nem no predio, nem no cinema. O presidente do cine, sr. Ignacio Costa, esteve presente, mostrando-se vivamente surprehendido com o sinistro.

“Manda Quem Pode!"
Era este o titulo da fita que se exhibia na occasião. O povo, seguindo a ação dos Bombeiros, applaudindo a coragem dos soldados e recuando aos estrondos mais fortes, fazia trocadilhos sobre o titulo, alludindo o poder do fogo, deante da lamentavel falta dagua, o que se verificou tres vezes.

A Fita da Bayer
O apparelho synchronizador da fita da Casa Bayer não trabalhava na filmagem da cinta “Manda quem póde".

O sr. José Penha, viajante da Casa Bayer calcula os prejuizos com o incendio do seu apparelho e do film em quantia superior a cincoenta contos de réis.

Ainda sobre o incêndio do Cine-Merceeiros, o “Correio do Ceará", na edição de 5 de novembro, publicou entrevista com o Presidente da Empresa mantenedora do cinema com novos esclarecimentos:

"A causa do fogo não fora propriamente aquela que em nossa noticia anterior julgamos veridica. O motivo real do incendio, assegura-nos o nosso informante - foi uma faísca desprendida da chave de ligação em curto circuito, vindo dita fagulha cahir justamente sobre os pedaços de fita que estavam proximos.
A proposito, lembramos aqui a grandeza de intuitos com que foi creado aquelle cinema.

A Associação dos Merceeiros possue uma importante escola para os filhos de seus associados, e, durante algum tempo, Iuctou com certa difficuldade financeira.
Alguns directores da Associação à frente da qual estava o proprio sr. Ignacio Costa naquelle tempo, lembraram a idéa de montar-se um cinema com o fim de serem empregados os lucros na manutenção da escola.

-Infelizmente queimou-se o nosso cinema, mas felizmente estava no seguro..."

O grande inimigo dos cinemas, o fogo, encerrava a iniciativa da Associação dos Merceeiros, de dar aos seus sócios e à cidade, um cinema alternativo.


(Grafia da época) 

Fonte:  Livro Fortaleza e a Era do Cinema de Ary Bezerra Leite


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