As primeiras responsabilidades
A juventude num tempo de guerra
Quando Edson Queiroz (Edson é o de branco na foto) foi nomeado gerente do armazém de estivas do pai, a Europa já estava conflagrada pela Segunda Guerra Mundial. Em l939, Hitler ordenara a invasão da Polônia; França e Inglaterra haviam declarado guerra à Alemanha nazista.
O conflito mundial provocou um profundo remanejamento da economia internacional, possibilitando a ascensão dos Estados Unidos e da União Soviética à condição de primeiras potências mundiais, mas criando também condições para o desenvolvimento industrial de certos países atrasados e propiciando uma nova ordem econômica e empresarial.
De exportadores de certos manufaturados para o Brasil, como os produtos têxteis, os países europeus passariam a importadores. Desde 1940, o Brasil viveu um período rápido e intenso de substituição de importações, que criou condições para o florescimento da indústria nacional, principalmente nos Estados do Sul, e sobretudo em São Paulo. Mesmo o Nordeste teria sua antiquada indústria têxtil trabalhando a todo vapor. Com o fim da guerra, contudo, as desgostadas máquinas não seriam substituídas por outras e a indústria nordestina cairia a níveis ainda mais precários que os do pré-guerra.
Em 1939, o presidente Getúlio Vargas declarou a neutralidade do Brasil em face do conflito. Os Estados Unidos só entraram na guerra em 1941 e, nesse mesmo ano, em troca da permissão de instalação de bases militares em Natal, Belém e Recife, comprometeram-se a fornecer tecnologia e capital para a instalação da Companhia Siderúrgica Nacional, no Rio de Janeiro.
No dia 20 de agosto de 1942, o Brasil acordaria alarmado. Na véspera e na antevéspera submarinos alemães teriam torpedeado, na costa nordestina, cinco navios brasileiros, matando mais de seiscentas pessoas. No dia 22, o Brasil declarou guerra ao Eixo. As tropas da Força Expedicionária Brasileira -FFB - chegariam a combater os alemães nos campos da Itália, retomando após a tomada de Berlim pelos Aliados, em 1945.
Além de exportador de produtos têxteis, o Nordeste ganhou importância durante o conflito como supridor de produtos primários: açúcar, cera de carnaúba, algodão, cacau e sisal; depois da guerra, contudo, voltaria à condição de fornecedor secundário desses produtos.
A prosperidade da Genésio Queiroz & Cia
Ao estilo seguro, comedido e paciente de Genésio Queiroz, o armazém de estivas somara o espírito inovador e arrojado do novo gerente de 15 anos de idade, Edson Queiroz(Na foto ao lado, o soldado Edson em janeiro de 1943). E prosperava.
Lá, segundo o próprio Edson Queiroz, num depoimento à revista Manchete, de 4 de novembro de 1972, "vendíamos de tudo, açúcar, fósforo, papel de embrulho e, na entressafra, feijão que havíamos armazenado nos meses anteriores, aguardando preço melhor" -
O jovem gerente esmerava-se na escolha dos produtos que teriam maior aceitação pela freguesia, batalhava pelos preços, caprichava na exposição das mercadorias e aprendia com o pai sobre a melhor época de vendê-las.
Logo após o torpedeamento dos navios brasileiros pelos submarinos alemães, Fortaleza e todas as capitais do Nordeste foram povoadas por sombrios rumores de que as naves de guerra nazistas estariam rondando nosso litoral, prontas a afundar tudo o que vissem navegando. As companhias seguradoras, em conseqüência dos boatos e dos riscos de guerra, cobravam elevadas taxas de seguro para as embarcações que faziam as linhas costeiras. Assustados, todos os importadores de Fortaleza curvavam-se a essas taxas, e muitos acabaram quebrando. A Genésio Queiroz & Cia. fretava alguns pequenos barcos que traziam açúcar de Recife para Fortaleza. Edson Queiroz, então com 17 anos, não acreditava que "os equipadíssimos submarinos alemães desperdiçassem munição com inofensivos saveiros que transportavam açúcar". De fato, com a entrada dos Estados Unidos na guerra, a Alemanha começava a perder o controle do conflito, exatamente porque seu parque bélico já não conseguia produzir artefatos militares na quantidade necessária.
Por conselho do filho, Genésio Queiroz não gastou um único centavo com taxas de seguro e teve lucros fantásticos durante a guerra, embora passasse dias e noites na ponta do Mucuripe, torcendo para que os saveiros chegassem intactos. Por volta de 1943, ele já era o único fornecedor de açúcar de toda a cidade e manteve esse quase monopólio por vários anos.
Iniciativas como essa fizeram com que Genésio Queiroz, a princípio, concedesse uma comissão de 5% para o filho sobre o total dos lucros e, logo depois, o transformasse em sócio, na proporção de 30% de todo os seus negócios.
Por conselho do filho, Genésio Queiroz não gastou um único centavo com taxas de seguro e teve lucros fantásticos durante a guerra, embora passasse dias e noites na ponta do Mucuripe, torcendo para que os saveiros chegassem intactos. Por volta de 1943, ele já era o único fornecedor de açúcar de toda a cidade e manteve esse quase monopólio por vários anos.
Iniciativas como essa fizeram com que Genésio Queiroz, a princípio, concedesse uma comissão de 5% para o filho sobre o total dos lucros e, logo depois, o transformasse em sócio, na proporção de 30% de todo os seus negócios.
A seta indica Edson durante o desfile.
Hora do "rancho" da companhia.
A dedicação ao trabalho e à aprendizagem no Liceu do Ceará e no armazém não faziam de Edson Queiroz(Foto: No álbum de família, uma recordação dos bons tempos) um jovem carrancudo. Pelo contrário, seu temperamento curioso e alegre o fazia procurar sempre coisas novas. Dentre suas inúmeras leituras, acabou se interessando também pelo ilusionismo. Comprou todos os livros disponíveis a respeito do assunto, encomendou equipamentos para a prática de mágicas e estudou o assunto com sofreguidão.
A provinciana Fortaleza da década de 40, dos fogões a lenha ou carvão, ainda se sentava à rua para conversar e ouvia notícias da guerra em rádios fanhosas. A principal diversão dos jovens eram as festinhas ou bailinhos em casas de família. Tendo aprendido a manipular os baralhos e gaiolas mágicas, Edson se apresentava nessas festinhas e sua fama começou a correr Fortaleza. Seus amigos o acompanhavam na pagodeira, alegrando o salão e ajudando a carregar a mala.
A fama correu tanto que o padre Arimatéia Diniz, seu primo em segundo-grau e ex-colega de seminário, e o bispo Dom Antônio de Almeida Lustosa, o convidaram para fazer espetáculos de mágica no círculo de operários católicos. Edson se apresentou algumas vezes, com grande sucesso, mas desistiu quando descobriu que seus amigos estavam cobrando ingressos da platéia. Ele doou a mala, com todos os seus artefatos, para os padres.
A mágica, contudo, ficaria em sua vida para os momentos de brincadeira com os novos filhos e os netos.
Nas viagens aos Estados Unidos, Europa e outros Estados brasileiros, no meio da bagageiro sempre incluía algum aparato para a prática da mágica. Pregar peça nos filhos ou amigos era uma de suas características mais mercantes.
A condição de sócio-gerente da Genésio Queiroz & Cia., por volta de 1945, começou a ser insuficiente para satisfazer a imaginação comercial de Edson Queiroz(Foto: O jovem sócio-gerente da Genésio Queiroz & Cia por volta de 1945). Com o apoio e a compreensão do pai, ele passou a frequentar regularmente a Alfândega, onde arrematava lotes dos mais variados artigos, que depois vendia em Fortaleza e cidades vizinhas.
Ele manteria essa prática por alguns anos, mesmo depois de casado. Yolanda afirma: "Ele não parava. Estava sempre fazendo novos negócios".
Em 1946, ganhou algum dinheiro com automóveis. Cada Estado, na época, tinha uma quota de importação e a quota do Ceará era maior que a demanda. Edson comprava os carros americanos e os revendia em outros Estados, reunindo com isso o capital necessário para os negócios que se seguiriam. Para a revista Manchete, de 4 de novembro de 1972, ele declararia: "Adquiríamos os carros por 48 contos e vendíamos, no Rio, por 80. Vendemos entre duzentos e trezentos automóveis Chevrolet, Ford, Hudson, no pós-guerra".
Hora do "rancho" da companhia.
No final de 1942 e em 1943, uma única coisa fez com que o empenho de Edson(Na foto, o cabo Edson, no 23º Batalhão) na Genésio Queiroz & Cia. se tornasse um pouco menor: o serviço militar. Ele serviu ao Exército na Companhia Quadros, 23º Batalhão de Caçadores, tendo dado baixa como cabo atirador.
Em virtude da guerra na Europa, o Exército brasileiro fazia o possível para incutir um rigoroso espírito de disciplina nos recrutas e adestrá-los efetivamente para os combates. A reconhecida disciplina posterior de Edson Queiroz no trabalho talvez tenha se desenvolvido nesse período, assim como sua pontaria, objeto de espanto para alguns e de verdadeiro culto para seus numerosos admiradores. Uma das lembranças correntes em Fortaleza é o pequeno susto que pregou ao pai. Ele lhe pediu para segurar um charuto e garantiu que o cortaria ao meio com um tiro. Genésio, que tinha uma confiança quase cega no filho, não hesitou em levar o charuto à boca, forçando aparentar calma. Com um único e certeiro tiro de revólver calibre 38, e à frente da platéia familiar, ele cumpriu sua promessa.
Se essa habilidade era capaz de gerar lendas, também lhe permitiria ganhar medalhas verdadeiras, muitos anos depois, já um empresário bem-sucedido, em memoráveis temporadas de caça na Europa. Todos os amigos que iam à sua casa eram convidados a ver a cabeça de um belo cervo, com longos chifres, por ele abatido na Iugoslávia.
Em virtude da guerra na Europa, o Exército brasileiro fazia o possível para incutir um rigoroso espírito de disciplina nos recrutas e adestrá-los efetivamente para os combates. A reconhecida disciplina posterior de Edson Queiroz no trabalho talvez tenha se desenvolvido nesse período, assim como sua pontaria, objeto de espanto para alguns e de verdadeiro culto para seus numerosos admiradores. Uma das lembranças correntes em Fortaleza é o pequeno susto que pregou ao pai. Ele lhe pediu para segurar um charuto e garantiu que o cortaria ao meio com um tiro. Genésio, que tinha uma confiança quase cega no filho, não hesitou em levar o charuto à boca, forçando aparentar calma. Com um único e certeiro tiro de revólver calibre 38, e à frente da platéia familiar, ele cumpriu sua promessa.
Se essa habilidade era capaz de gerar lendas, também lhe permitiria ganhar medalhas verdadeiras, muitos anos depois, já um empresário bem-sucedido, em memoráveis temporadas de caça na Europa. Todos os amigos que iam à sua casa eram convidados a ver a cabeça de um belo cervo, com longos chifres, por ele abatido na Iugoslávia.
A dedicação ao trabalho e à aprendizagem no Liceu do Ceará e no armazém não faziam de Edson Queiroz(Foto: No álbum de família, uma recordação dos bons tempos) um jovem carrancudo. Pelo contrário, seu temperamento curioso e alegre o fazia procurar sempre coisas novas. Dentre suas inúmeras leituras, acabou se interessando também pelo ilusionismo. Comprou todos os livros disponíveis a respeito do assunto, encomendou equipamentos para a prática de mágicas e estudou o assunto com sofreguidão.
A provinciana Fortaleza da década de 40, dos fogões a lenha ou carvão, ainda se sentava à rua para conversar e ouvia notícias da guerra em rádios fanhosas. A principal diversão dos jovens eram as festinhas ou bailinhos em casas de família. Tendo aprendido a manipular os baralhos e gaiolas mágicas, Edson se apresentava nessas festinhas e sua fama começou a correr Fortaleza. Seus amigos o acompanhavam na pagodeira, alegrando o salão e ajudando a carregar a mala.
A fama correu tanto que o padre Arimatéia Diniz, seu primo em segundo-grau e ex-colega de seminário, e o bispo Dom Antônio de Almeida Lustosa, o convidaram para fazer espetáculos de mágica no círculo de operários católicos. Edson se apresentou algumas vezes, com grande sucesso, mas desistiu quando descobriu que seus amigos estavam cobrando ingressos da platéia. Ele doou a mala, com todos os seus artefatos, para os padres.
A mágica, contudo, ficaria em sua vida para os momentos de brincadeira com os novos filhos e os netos.
Nas viagens aos Estados Unidos, Europa e outros Estados brasileiros, no meio da bagageiro sempre incluía algum aparato para a prática da mágica. Pregar peça nos filhos ou amigos era uma de suas características mais mercantes.
A condição de sócio-gerente da Genésio Queiroz & Cia., por volta de 1945, começou a ser insuficiente para satisfazer a imaginação comercial de Edson Queiroz(Foto: O jovem sócio-gerente da Genésio Queiroz & Cia por volta de 1945). Com o apoio e a compreensão do pai, ele passou a frequentar regularmente a Alfândega, onde arrematava lotes dos mais variados artigos, que depois vendia em Fortaleza e cidades vizinhas.
Ele manteria essa prática por alguns anos, mesmo depois de casado. Yolanda afirma: "Ele não parava. Estava sempre fazendo novos negócios".
Em 1946, ganhou algum dinheiro com automóveis. Cada Estado, na época, tinha uma quota de importação e a quota do Ceará era maior que a demanda. Edson comprava os carros americanos e os revendia em outros Estados, reunindo com isso o capital necessário para os negócios que se seguiriam. Para a revista Manchete, de 4 de novembro de 1972, ele declararia: "Adquiríamos os carros por 48 contos e vendíamos, no Rio, por 80. Vendemos entre duzentos e trezentos automóveis Chevrolet, Ford, Hudson, no pós-guerra".
Leia sobre a infância de Edson Queiroz aqui
Crédito: Livro Edson Queiroz: Um homem e seu tempo de Mario Ernesto Humberg, 1986.