Inauguração da Praça Portugal
Em 27 de maio de 1947, é inaugurada a Praça Portugal, na Aldeota, no cruzamento da Avenida Dom Luís com Avenida Desembargador Moreira. O engenheiro que executou a obra foi Helio Teixeira Maia.
A praça foi reinaugurada em 06 de abril de 1968, na administração do prefeito José Walter Barbosa Cavalcante.
Foto do livro Praça Portugal
A Praça Portugal ainda deserta-1969 - Arquivo Nirez
O formato circular é único e chama atenção pelo tamanho e simetria. Vista do alto, o círculo
se completa com as formas quadradas e retangulares do comércio e dos edifícios da região. A
Praça Portugal, como que assinalasse o coração do bairro Aldeota, é um diferencial na capital cearense. Como uma nave espacial dos filmes de ficção, está no centro de duas das maiores e mais movimentadas avenidas do bairro, Dom Luiz e Desembargador Moreira. Por isso, vive, literalmente, circulada por muitos veículos, durante o dia inteiro.
Maravilhoso painel Caravela de Portugal, feito de pastilhas do artista plástico José Eduardo Pamplona, que ficava no lago da Praça Portugal. Foto dos anos 80.
O verde da natureza é pouco. Algumas árvores compõem o cenário e no meio do tráfego de veículos, ainda é possível ouvir o cantar de poucos pássaros. O céu azul, com poucas nuvens brancas como algodão, dá um toque contrastante, em meio ao mar de prédios coloridos e de diversos tamanhos que circundam a praça.
Nem só a forma do espaço é curiosa. Apresenta ainda alguns pontos que, muitas vezes, são passados despercebidos. Em cada recanto do cruzamento das avenidas há uma banca de jornais e revistas e um ponto de táxi. Nesses canteiros também é possível encontrar a tradicional banquinha do Paratodos (também conhecido como jogo do Bicho), quiosque que vende tapioca e churrasquinho, uma agência do Bradesco, vendedores ambulantes, o Shopping Bambuy, com sapataria, boate e butique e, claro, o Shopping Aldeota.
Os shoppings, construídos em formato da letra “L”, seguem os cantos da praça. Se a Praça Portugal, os canteiros e o shoppings fossem peças de quebra-cabeça, estes se encaixariam perfeitamente. A vista do vigésimo andar da torre comercial do shopping Aldeota, no escritório da SecrelNet prova que, no meio de tantos prédios, o céu ainda toca o mar e pontos verdes ainda compõem a paisagem da cidade.
Lugar de encontro de muitas gerações, há 20 anos a praça era bem mais movimentada, tão quanto a atual Avenida Beira Mar. Todas as sextas-feiras era quase impossível estacionar os carros. Os jovens se encontravam principalmente na fonte (já desativada), na parte central.
O extinto Shopping Portugal era a principal atração. Em seu lugar há uma obra, a qual, futuramente, dará lugar a mais um edifício, dentre muitos outros que já existem ao redor do grande círculo. Ponto de saída para festas ou apenas para “jogar conversa fora”, jovens, que agora são pais, frequentaram a praça com planos de diversão, apenas.
Hoje, aos sábados, encontrar um espaço para sentar na grama verde da praça é quase impossível. Agora ela é frequentada por jovens das mais diferentes tribos, com ideologias opostas, mas que possuem o mesmo objetivo dos mais antigos: se divertir.
Pontas de cigarro completam o cenário de garrafas de cachaça, vodka e refrigerante. Os flashes das câmeras (digitais, é claro) surgem a cada minuto, iluminando a noite de céu estrelado. A cor, independente do grupo, é a preta. Maquiagem, blusas, calças, meias, tênis All Star. Tudo preto.
O cenário da Aldeota começa a mudar às 18 horas. Meninos, meninas, rapazes e moças, que têm entre 14 e 19 anos, são os representantes oficiais de tribos como RPG , Emos e Otakus. A ida dos jovens à praça causa as mais diversas opiniões em comerciantes e moradores da região.
Segurança em primeiro lugar
De dentro do Shopping Aldeota, tudo parece estar nos conformes. Os seguranças, de ternos impecáveis e pontos de escuta nos ouvidos, rondam o local com o objetivo de manter a ordem e a segurança de lojistas e clientes.
Na parte administrativa, Lúcio Flávio Batista da Silva é o responsável pela brigada de incêndio. Em seu uniforme de bombeiro e nos coturnos, Lúcio, um simpático e calmo rapaz, apesar da profissão, alega que nunca houve qualquer caso em que foi preciso acionar os bombeiros, seja na parte interna do shopping ou na praça.
Ao contrário da situação física do shopping, a região da praça pega “fogo” aos sábados. Quando os jovens frequentadores da Praça Portugal entram no Aldeota, Leonardo de Melo, segurança do Shopping, dobra a sua atenção. A “baderna”, como o segurança diz, pode começar num simples piscar de olhos. A primeira impressão não é a que fica quando se faz referência aos frequentadores da praça. A maioria possui comportamento exemplar.
São raros os atos de vandalismo. Mesmo assim, com as “antenas” sempre ligadas, os seguranças se comunicam com freqüência quando vêem um “montinho preto” caminhando na parte interna do shopping. E o trabalho dos “homens-de-preto-com-gravatas” redobra.
Durante a semana o movimento do Aldeota é tranqüilo. Trabalhando como segurança do complexo de lojas há um ano, Leonardo nunca presenciou algo mais grave no local. A segurança do shopping está restrita à calçada. Alguns passos à diante é responsabilidade da nunca vista guarda municipal. A violência, tão presente em Fortaleza, nunca fez vítima na porta do shopping. Não há registro de assaltos. Mas, mesmo assim, todo o cuidado é pouco.
Não é difícil ver clientes pedindo aos seguranças que os acompanhem até os seus veículos. O medo é visível: ao atravessar a porta do Aldeota, as pessoas olham para os dois lados. A presença de mendigos faz com que elas andem mais rápido.
No centro da praça, monumento
presta homenagem aos portugueses
Antes de ir à praça ...
Parece um ritual. Eles se encontram no Mc Donald's, vão ao Pão de Açúcar e passam o resto da noite se divertindo. Seja bebendo, fumando, lanchando ou conversando: a noite é o cenário e o palco é a praça.
Antes de tudo, um papo no Mc Donald's. Quem passa na porta, pensa que está havendo uma promoção imperdível por causa do tumulto. Mas, olhando de perto, nada mais é do que grupos reunidos. Detalhe: sem qualquer bandeja da lanchonete à frente.
As mesas da parte externa são ocupadas e, com freqüência, a gerente Ana Cristina precisa pedir para que os jovens se retirem para dar espaço a algum cliente. O pedido é feito uma, duas, cinco, dez vezes para grupos diferentes em apenas um sábado. Felizmente, o stress não é tão grande. Os (pré-)adolescentes resmungam, mas não negam a solicitação.
Ana Cristina, funcionária da lanchonete do Aldeota há um ano, sempre viu a praça lotada. Mesmo assim, o consumo dos jovens no Mc Donald's é pequeno. Apesar disso, as vendas são boas. A localização da lanchonete, em frente à praça e em um bairro nobre, é um fator favorável.
Muita conversa. Muito cigarro. A fome e a sede começam a bater. A solução para esses problemas está no térreo do shopping. O supermercado Pão de Açúcar é a fonte. As bebidas alcoólicas (vendidas apenas aos maiores de 18 anos) são acompanhadas de refrigerante, salgadinhos tipo Cheetos e Ruffles e biscoitos doces. Antes de passar no caixa, durante as compras, os jovens “aprontam” um pouco, como disse o gerente (a loja não permite a divulgação do nome de seus funcionários).
Foto da Praça Portugal, publicada no Jornal O POVO, em 08/09/1995
Eles cantam, dançam e brincam nos corredores. Biscoitos são arremessados de um lado para o outro, as vozes ecoam. Parece que tudo é motivo de festa. Os clientes se sentem incomodados. Uma vez, confessa o gerente, jovens ainda quiseram andar de skate no supermercado, mas não resistiram quando foram “barrados” pelos seguranças. Mesmo assim, nenhuma confusão entre clientes, “arruaceiros”, administradores e seguranças. O preconceito ainda é grande. Tudo que é diferente incomoda. E o Pão de Açúcar não foge à regra. O gerente já recebeu inúmeras reclamações. Não só pela bagunça, mas também pelo jeito deles se vestirem e se maquiarem. “Estranhos” e “esquisitos” são adjetivos bastante usados.
Expectadores
Como em toda área movimentada, na Praça Portugal também há um local de apostas do Jogo do Bicho. O responsável pela banquinha de madeira com uma placa branca escrita “PARATODOS” com letras vermelhas é Leôncio Ferreira, que não sabe exatamente há quanto tempo trabalha no ramo.
Quatro pontos de táxi nos quatro cantos, da praça Portugal
Os clientes saem da rotatória, estacionam os carros próximos aos táxis, descem, fazem suas apostas e vão embora. Nada de jovens, gritaria, baderna ou qualquer outra coisa. Seu expediente é das 9 às 17 horas. Seu Leôncio vê, diariamente, centenas de carros passando à sua frente e algumas batidas, como ele mesmo diz, “bestas”. A praça só recebe visita de pássaros, garis e, no final do ano, decoradores para embelezar o período de festas natalinas.
Já no comércio da leitura a história é um pouco diferente. Os clientes, fiéis, visitam diariamente as bancas de Danilo de Almeida, dono, há menos de um ano, de duas das quatro bancas da praça.
As duas ficam em frente aos dois shoppings da praça e próximas aos pontos de táxis. A primeira, a mais antiga, na idade e na aparência, fica em frente ao Aldeota. A segunda, construída mais recentemente, está localizada no canteiro do Shopping Bambuy. O proprietário anterior ocupou os pontos por mais de 18 anos.
Assim, como na aparência e nos funcionários, as bancas se diferenciam também no quesito público, principalmente nos fins de semana. Os frequentadores da praça aos sábados visitam a banca próxima ao Aldeota. Danilo reclama e, com ar de chateação, diz que eles não são bons compradores.
A organização não é o forte desses adolescentes. Ao entrar na banca, sempre em grupo, mexem nas revistas e fazem uma “pequena bagunça”, como Danilo cita, a qual muitas vezes, é preciso ser interrompida pelos funcionários.
O local fica uma desordem quando eles saem. Os jovens maiores de idade consomem apenas cigarros, mas em grande quantidade. Maços e mais maços são vendidos por final de semana. As “mini-chaminés” ignoram os doces e a cultura que está presente no estabelecimento de dois metros quadrados. Os jornais só recebem atenção quando eles sabem que terá alguma informação que os interessa ou algo sobre eles.
Postal Praça Portugal
A outra banca, apelidada pelos jovens de “banca tecnológica”, recebe um público bem diferente. São pessoas mais adultas e moradores da região. Diariamente são vendidos livros, revistas e jornais para elas.
Apesar do pequeno espaço e da aparente desorganização, as bancas têm boas opções. Além dos serviços básicos de jornais e revistas, também é possível comprar refrigerantes, cigarros, balas, chocolates, salgadinhos como Fandangos, sorvete, picolé e livros.
“Canto ” Bambuy
O trabalho do taxista que fica no ponto da Praça Portugal é tranquilo. O carro muitas vezes vira casa e os bancos, camas. É comum encontrar um taxista cochilando, principalmente depois do almoço. Quando não, estão conversando ou falando ao celular. Os rádios estão sempre ligados, esperando algum chamado.
A paisagem e a calma da semana torna o trabalho menos estressante. Mesmo assim, é cansativo esperar que moradores da redondeza e turistas busquem seu serviço.
Aderaldo Soares de Morais Filho trabalha no ponto em frente ao Shopping Bambuy há dois anos, desde que se tornou taxista. Sobre os frequentadores da praça, nada a declarar. “Não são meus clientes”, ele diz. Mas na hora de descrever, seu Aderaldo é preciso: “Eles vêm a pé, todos vestidos de preto. Não ‘dou muito valor’ a eles”.
Mas, antes que receba algumas vaias ou críticas ele justifica sua opinião dizendo que seu pensamento seja este, talvez, por ser de outra geração.
A Praça nos anos 90
Tapioca, prato típico do Ceará.
Há restaurantes, lanchonetes e quiosques especializados em qualquer lugar: nas estradas, nos shoppings, nas ruas, em colégios e supermercados.
E na Praça Portugal não poderia ser diferente. O quiosque de Maria José está na calçada do Shopping Bambuy, em frente à sapataria Meia Sola.
Dona Maria é uma das duas sócias do quiosque, no qual trabalha há um ano. O ponto existe desde a abertura do shopping. A clientela é a mais variada possível. Funcionários das lojas, moradores da cidade, turistas...
Os frequentadores dos sábados não incomodam nem interferem no trabalho de dona Maria. Mesmo assim, os funcionários do shopping não gostam deles. O motivo: banheiro. O banheiro do shopping é público. A bagunça e a sujeira que eles fazem incomodam. Mas esse é um problema mais fácil de resolver. O incômodo
maior são os mendigos. A presença dessas pessoas, para dona Maria, gera uma má visão do shopping e do seu comércio.
É inevitável a aproximação deles, principalmente quando as pessoas estão comendo. A prefeitura não consegue resolver esse problema que incomoda não só a ela, mas a todos da praça. Sobra para os seguranças do shopping resolverem essa questão.
Mas não são apenas os mendigos que incomodam os comerciantes do Shopping Bambuy. Duas vendedoras da loja Moda.com, que pediram para não ser identificadas, dizem que a localização do shopping prejudica as vendas. As árvores escondem o letreiro da loja e não há estacionamento gratuito (o estacionamento do shopping é Zona Azul, no qual o cliente precisa pagar uma taxa para ocupar uma das poucas vagas existentes).
Alguns frequentadores estacionam no local, mas não sabem que o estacionamento é pago, passando por constrangimentos na hora de retirar o veículo. O movimento da loja é pequeno. A clientela é fiel e de classe média/alta.
As vendedoras acham que os frequentadores da praça não prejudicam as vendas, já que a loja encerra seu expediente antes da praça estar cheia. Até o momento, não receberam reclamações dos clientes.
Os “ocupantes” da praça
Jovens. Classe média/alta. Ambos os sexos. Alguns (poucos) assumem a bissexualidade ou a homossexualidade.
Muitos frequentam a Praça Portugal escondidos dos pais, por medo do que eles possam dizer.
Eles dizem que não se encaixam em nenhuma tribo, que estão lá “só para curtir”. Frequentam a praça há mais de três anos, quase todos os dias da semana, todos os sábados. São moradores da Aldeota. Não seguem estilos e se denominam “grupo restrito” ou “esquadrilha da fumaça”.
Durante a conversa, Caio, Jonatan, Michel, Felipe, Iuri e o outro Caio, tragam seus cigarros, quase sincronizadamente.A bebida ainda não está na roda porque é dia. Quase todos são maiores de idade. Drogas ilícitas não fazem parte dessa tribo, ao contrário de algumas outras, que eles dizem fumar maconha.
Quando a “esquadrilha da fumaça” não está na praça, seus integrantes gostam de jogar futebol e tentam andar de skate na beira mar ou na própria praça. Ao contrário do que se pensa, as tribos vivem “em paz”. Não há brigas. Cada uma respeita o espaço da outra. A tribo “da moda” são os Emos, com maior número de “integrantes”. Um ambiente diferente Este é o cenário da Praça Portugal. Uma praça que, além do movimento de pessoas, registra grande fluxo de veículos, a qualquer hora. O comércio está funcionando normalmente. E o movimento é maior no final de novembro, quando o Natal já está próximo. O trânsito
flui lentamente, pois é noite de sábado. Pessoas atravessam as ruas correndo, jovens se divertem na praça.
A Praça Portugal era rodeada por casas em 1969. Hoje é um reduto verde em meio ao paredão de prédios.
Uma explosão inicia uma seqüência de três outras. Os seguranças se preocupam. Os pedestres se assustam.
Todos procuram de onde vieram os sons. Ah, tudo bem! Nada de mais. Foram “só” alguns jovens que subiram na armação da árvore de Natal da praça e lançaram algumas bombinhas. Nada que a polícia, que apareceu logo em seguida, não resolva.
Assim são os jovens. Independente da tribo a qual pertencem, sempre surpreendem, sempre conseguem o que querem: chamar atenção.