A Ceará Tramway, Light & Power Co., Ltd., registrada em Londres em 11/12/1911, comprou os sistemas da Companhia Ferro-Carril do Ceará e da Ferro Carril do Outeiro e inaugurou a primeira linha de bondes elétricos da capital cearense em 9/10/1913, com bitola de 1.435 mm. Os britânicos tinham sido decerto desencorajados por suas experiências na Amazônia, e as suas instalações cearenses foram menos ambiciosas que os empreendimentos em Manaus e Belém.
Bonde de primeira classe (permitido a entrada apenas de pessoas decentemente vestidas*) em frente a Pharmácia Galeno na Major Facundo - Foto do Álbum de Fortaleza 1931
Em 08 de maio de 1911 cria-se a Usina de Luz e Força do Passeio Público, da firma The Ceará Tramway Light & Co., para alimentar os bondes, que eram de tração animal e passariam a ter tração elétrica.
09 de maio de 1912 foi o lançamento da pedra fundamental da usina e casa das máquinas para bondes (Tramways) elétricos de Fortaleza, da The Ceará Tramway Light & Co., no Passeio Público (Usina).
A Estação Central era no chamado calçamento de Messejana, depois Boulevard Visconde do Rio Branco, entre a Rua Padre Valdevino e a Rua da Bomba (hoje Rua João Brígido).
A Estação Central era no chamado calçamento de Messejana, depois Boulevard Visconde do Rio Branco, entre a Rua Padre Valdevino e a Rua da Bomba (hoje Rua João Brígido).
Na pedra inaugurada lê-se a seguinte inscrição. “Esta pedra foi lançada no dia IX de Maio de MCMXII, para inaugurar o começo dos trabalhos de eletrificação dos Tramways da cidade de Fortaleza sendo presidente do estado o coronel Antônio Frederico de Carvalho Motta e intendente municipal o Dr. Marinho de Andrade.”
Em 06 de junho de 1912 são transferidos os direitos da Companhia Ferro-Carril do Ceará (bondes de tração animal), já da firma J. Pontes & Companhia, para a The Ceará Tramway Light & Co Ltd.
Bonde de segunda classe – Foto do Álbum de Fortaleza 1931
Segundo o jornal Folha do Povo de 27/09/1913 os fios elétricos da Ceará Light ocasionavam perigo para a população:
“Escrevem-nos
Agora, sr. Redator que estamos nas vésperas de inauguração dos serviços de bondes urbanos por tração elétrica e de luz elétrica para as casas particulares, é bem justo que se pergunte por que razão a companhia inglesa não impregnou fios isolados na construção desse ultimo serviço?
Quem quer que tenha contato, em dadas condições, com estes fios condutores de energia elétrica para os domicílios da urbs, estará fulminado.
Bastará tão somente para isto que estes fios fiquem em contato direto ou indireto com os postes de ferro colocados nas calçadas, para que a corrente a ele se transmita, ficando assim uma ameaça.”
Agora, sr. Redator que estamos nas vésperas de inauguração dos serviços de bondes urbanos por tração elétrica e de luz elétrica para as casas particulares, é bem justo que se pergunte por que razão a companhia inglesa não impregnou fios isolados na construção desse ultimo serviço?
Quem quer que tenha contato, em dadas condições, com estes fios condutores de energia elétrica para os domicílios da urbs, estará fulminado.
Bastará tão somente para isto que estes fios fiquem em contato direto ou indireto com os postes de ferro colocados nas calçadas, para que a corrente a ele se transmita, ficando assim uma ameaça.”
O Jornal O Unitário de 28 de novembro de 1913 já contava a novidade que estava por vim:
Acompanhado dos engenheiros e electricistas da companhia, o seu gerente, que ante-hontem mesmo chegára no "Sergipe", fez sahir um dos carros da estação, percorrendo com elle todo o trecho da linha que se prolonga dalli pela esrrada de Mecejana afora.
Grande massa de curiosos invadio o carro que, embora os protestos dos electricistas inglezes , percorreu ainda grande parte da linha da estação.
Como já dissemos, foi magnifico o resultado da experiencia, sendo bem possivel que a inauguração official se dé nos primeiros dias de outubro."
Em 09 de outubro de 1913 é o início, precisamente às 16h30min, do funcionamento da Usina do Passeio Público e dos bondes de tração elétrica, da The Ceará TramwayLight & Co., em substituição aos de tração animal, sendo a primeira linha do Joaquim Távora, que saía da Praça do Ferreira pela Rua Major Facundo, dobrava à esquerda na Rua Pedro I e ia até o Parque da Liberdade, dobrando à direita na Avenida Visconde do Rio Branco e voltando pela mesma avenida, Rua Pedro I, dobrando à esquerda na Rua Floriano Peixoto e chegando na Praça do Ferreira.
Mas os bondes puxados a burros ficariam ainda por algum tempo, administrados também pela Light.
Garagem com ônibus e seus 'chauffeurs' – Foto do Álbum de Fortaleza 1931
* Sobre os bondes de primeira classe, o jornal O Unitário de 19/10/1913 trazia a seguinte reclamação:
Era esse melhoramento de ha muito tempo almejado.
Entretanto, mal acaba de levação a effeito, surgem novas reclamações do publico, que pede seja supprida quanto antes, uma falta consideravel que ainda resta.
E’ o caso que os novos vehiculos, pertencendo a uma só classe, são destinados ao transporte de pessôas que vistam decentemente.
Ora, nem toda gente póde satisfazer de modo cabal esta condição.
Os moradores dos arrabaldes, por exemplo, si são humildes, deixam de vir ao interior da cidade, a negocio por falta de bondes de 2ª classe, pois nos de 1ª não são admitidos.
Mesmo nas vias mais centraes ficam prejudicados os servos, que precisam ir ao mercado, pela manhã, e não o fazem sinão a pé.
E’ fácil imaginar o transtorno causado por essa lacuna, cujo preenchimento é o que pretendemos solicitar nestas linhas, não só porque o achamos carecida e de alcance, como tambem porque, assim procedendo, satisfazemos grande numero de leitores que nos teem procurado e, concomitantemente, a população em geral.
O Jornal Folha do Povo de 23/11/1913 trazia algumas leis que o público precisava conhecer:
"A camara municipal de Fortaleza, resolve:
Art 1- É proibido fumar nos três primeiros bancos dos carros de passageiros das linhas de Tramways.
Art 2- É proibido cuspir nos mesmos.
Art 12- A velocidade dos carros eletricos será no máximo de 18 Kilometros por hora, podendo, nas linhas de "arrabaldes" atingir 25 Kilometros por hora.
As distancias a percorrer pelos bondes electricos, tomando como ponto inicial de partida a Praça do Ferreira, são pouco mais ou menos os seguintes:
Metros | |
Linha da Praia | 1530 |
Via Férrea | 930 |
Estação (Messejana) | 2450 |
Fernandes Vieira | 1800 |
Bemfica | 2630 |
Alagadiço | 5440 |
Outeiro | 2500 |
Praça dos Coelhos | 1100 |
O Outeiro aumentou mais um Kilometro por hora, em um minuto deve o bonde fazer trezentos metros (300ms)."
Ônibus da Ceará Light sentido Porangaba - Foto do Álbum de Fortaleza 1931
Um atropelamento noticiado pelo Jornal Diário do Estado de 13 de janeiro de 1916:
O motorneiro julgando ter morto o atropelado evadi se.
A policia do segundo districto teve conhecimento do facto."
Outro acidente, agora envolvendo um Carroção da Light versus carroça, também noticiado pelo Diário do Estado no dia 17 do mesmo mês e ano:
"Sabbado, ás 10 horas da manhã, na rua da Praia, o carroção da "Light" n. 34, guiado pelo motorneiro n. 148, Cicero Guedes, choucou-se com uma carroça, não se registrando, porém, em virtude desse incidente nenhum caso fatal."
O Bonde da Praça do Coelho - Diário do Estado do dia 18 de outubro de 1916:
"Diversas pessoas nos têm vindo trazer reclamações contra o estado quasi inascessivel em que fica o bonde da Praça do Coelho, no fim da referida linha. Com effeito, o estribo dos carros fica, naquelle ponto, a cerca de um metro de altura, a ponto de ser extremamente difficil a uma senhora descer ou subir no bonde.
Ao senhor E. du D. Scott, digno gerente da "Light", que sempre se tem mostrado solicito em bem servir ao publico, pedimos que mande tomar qualquer providencias no sentido de fazer cessar semelhante incommodo para os passageiros."
Ao senhor E. du D. Scott, digno gerente da "Light", que sempre se tem mostrado solicito em bem servir ao publico, pedimos que mande tomar qualquer providencias no sentido de fazer cessar semelhante incommodo para os passageiros."
Vista Parcial da Usina da Light - Foto do Álbum de Fortaleza 1931
"O engraxador Manoel Gomes da Silva, viajando, á noite, num bonde da “Light”, entendeu de injustificadamente, espancar o conductor do mesmo, provocando, assim, o estacionamento do carro, pelo que foi recolhido ao xadrez."
UM CONDUCTOR DESPUDORADO - O Nordeste de 14/04/1923:
"Os passageiros do bonde da linha da F. Vieira, que vinha fazer 9 horas da noite, na praça do Ferreira, viram-se, hontem, obrigados a assistir a scenas que não podiam deixar de indigná-los, pela offensa ao seu decoro.
É o caso que viajava, também naquelle vehiculo uma meretriz.
Pois bem: o conductor do bonde, sem o menor respeito aos passageiros, esteve todo o tempo da viagem a dirigir pilherias á mesma e a praticar outros actos que offendem, altamente, o decoro publico e revoltou aos que iam no bonde.
Denunciado o facto, que nos relatou um dos passageiros, esperamos que o digno gerente da Light tome, no caso, as providencias que se requerem. "
É o caso que viajava, também naquelle vehiculo uma meretriz.
Pois bem: o conductor do bonde, sem o menor respeito aos passageiros, esteve todo o tempo da viagem a dirigir pilherias á mesma e a praticar outros actos que offendem, altamente, o decoro publico e revoltou aos que iam no bonde.
Denunciado o facto, que nos relatou um dos passageiros, esperamos que o digno gerente da Light tome, no caso, as providencias que se requerem. "
"A carreta de concertos da Ceará Light, nestas ultimas noites, tem andado numa actividade vizivel, e ainda bem que os felizes dormentes accordados pela zoada de suas rodas, ao levantarem, de manhã, hontem, tiveram o prazer de observar que, pelo menos, o caminho do Cemiterio ficou melhor.
Temos escripto algumas notas sobre o serviço de bondes, e aqui estamos no dever de louvar o gesto de sr. Smith, actual gerente da Companhia.
É que s. s., attendendo ao mau estado dos cabos troley da linha Mororó, entre a praça Marquez do Herval, da rua General Sampaio ao fim da linha, ordenou a sua substituição. Esse serviço tem sido feito todo á noite visto que, durante o dia, perturbaria o trafego.
É assim que um dos cabos troley já é novo em fio, e, o outro, dentro em pouco tambem o será; o comprimento do fio substituido anda perto de mil metros."
A LIGHT VAE MAL... - Jornal do Comércio de 23/04/1924:
"Quase que diariamente são verificados descarrillamentos ou outros accidentes nos bonds da Light.
Hontem, por exemplo, o carro do Matadouro, que sahiu da praça às 11 horas, repleto de passageiros, ao chegar na curva entre à praça do Carmos e a rua Major Facundo, descarrillou, soffrendo os passageiros um atrazo de muitos minutos e ficando aquelle trecho sem poder dar passagem aos demais carros.
Foram feitas baldeações até que se restabeleceu o trafego interrompido naquelle ponto, o que se deu, cerca de uma hora depois do occorrido."
Temos escripto algumas notas sobre o serviço de bondes, e aqui estamos no dever de louvar o gesto de sr. Smith, actual gerente da Companhia.
É que s. s., attendendo ao mau estado dos cabos troley da linha Mororó, entre a praça Marquez do Herval, da rua General Sampaio ao fim da linha, ordenou a sua substituição. Esse serviço tem sido feito todo á noite visto que, durante o dia, perturbaria o trafego.
É assim que um dos cabos troley já é novo em fio, e, o outro, dentro em pouco tambem o será; o comprimento do fio substituido anda perto de mil metros."
Ponto de partida dos bondes
"Quase que diariamente são verificados descarrillamentos ou outros accidentes nos bonds da Light.
Hontem, por exemplo, o carro do Matadouro, que sahiu da praça às 11 horas, repleto de passageiros, ao chegar na curva entre à praça do Carmos e a rua Major Facundo, descarrillou, soffrendo os passageiros um atrazo de muitos minutos e ficando aquelle trecho sem poder dar passagem aos demais carros.
Foram feitas baldeações até que se restabeleceu o trafego interrompido naquelle ponto, o que se deu, cerca de uma hora depois do occorrido."
BONDE “VERSUS” AUTOMOVEL - Jornal do Comércio de 05/06/1924:
"Hontem, por volta das 13 1/2 horas, o auto particular n. 101, de propriedade do sr. Octavio Philomeno, guiado pelo chauffeur José Candido, ao fazer a curva entre as ruas Barão do Rio Branco e Misericordia, foi de encontro ao bonde da Light n. 13, que o poz a alguns metros de distancia, por ter perdido os freios e não ter podido o chauffeur fazer uma rapida manobra, em vista de se achar ao lado um montão de areia.
O carro fôra posto a serviço ha poucos dias e sahiu bastante damnificado.
Os passageiros, srs. Octavio Philomeno e Francisco Vieira Carneiro, sahiram illesos.
A policia tomou conhecimento do facto."
"Gabinete do prefeito
De ordem do exmo. sr. Prefeito Municipal de Fortaleza, dr. Acrísio Moreira da Rocha, torno público, para conhecimento geral, que s. excia., dando cumprimento ao disposto no Decreto número 25.232, de 15 de julho de 1948, emanado do Governo Federal, e publicado no Diário Oficial da República, de 17 do mesmo mês e ano, assumirá, hoje, segunda-feira, dia 19, a administração da “Ceará Tramway Light Power Company Limited”, cujos serviços que são os de energia elétrica da capital cearense, com o respectivo acervo de bens e instalações, passarão, assim, em virtude da determinação contida no art. 2º do decreto citado, à administração da Prefeitura Municipal de Fortaleza.
O ato terá lugar na séde dos escritórios daquela companhia, situada à Travessa Dr. João Moreira, canto com a rua Floriano Peixoto, iniciando-se às 17 horas.
Fortaleza, 19 de julho de 1948
R. ROCHA MOREIRA
Chefe do Gabinete do Prefeito."
"Hontem, por volta das 13 1/2 horas, o auto particular n. 101, de propriedade do sr. Octavio Philomeno, guiado pelo chauffeur José Candido, ao fazer a curva entre as ruas Barão do Rio Branco e Misericordia, foi de encontro ao bonde da Light n. 13, que o poz a alguns metros de distancia, por ter perdido os freios e não ter podido o chauffeur fazer uma rapida manobra, em vista de se achar ao lado um montão de areia.
O carro fôra posto a serviço ha poucos dias e sahiu bastante damnificado.
Os passageiros, srs. Octavio Philomeno e Francisco Vieira Carneiro, sahiram illesos.
A policia tomou conhecimento do facto."
Manutenção de bonde na Fortaleza dos anos 20
O veículo da foto é um caminhão destinado à manutenção da rede aérea do sistema de bondes da cidade de Fortaleza durante os anos 10 e 20. Pertencia à Ceará Tramways, Light & Power, empresa que implantou o serviço de bondes elétricos a partir do ano de 1913
LIGHT PASSA À ADMINISTRAÇÃO DA PREFEITURA MUNICIPAL DE FORTALEZA - Jornal O Povo de 19/07/1948:
De ordem do exmo. sr. Prefeito Municipal de Fortaleza, dr. Acrísio Moreira da Rocha, torno público, para conhecimento geral, que s. excia., dando cumprimento ao disposto no Decreto número 25.232, de 15 de julho de 1948, emanado do Governo Federal, e publicado no Diário Oficial da República, de 17 do mesmo mês e ano, assumirá, hoje, segunda-feira, dia 19, a administração da “Ceará Tramway Light Power Company Limited”, cujos serviços que são os de energia elétrica da capital cearense, com o respectivo acervo de bens e instalações, passarão, assim, em virtude da determinação contida no art. 2º do decreto citado, à administração da Prefeitura Municipal de Fortaleza.
O ato terá lugar na séde dos escritórios daquela companhia, situada à Travessa Dr. João Moreira, canto com a rua Floriano Peixoto, iniciando-se às 17 horas.
Fortaleza, 19 de julho de 1948
R. ROCHA MOREIRA
Chefe do Gabinete do Prefeito."
FOI INICIADA A RETIRADA DOS TRILHOS DE BONDE - Jornal O Povo 08/11/1948:
"A Prefeitura Municipal determinou a retirada de todos os trilhos de bonde da cidade, já tendo sido o serviço iniciado pela antiga linha de José Bonifácio, onde dois quarteirões já os não têm.
A reportagem do O POVO procurou entender-se, a respeito, com a gerencia da Light, sendo informada de respeito, com a gerencia da Light, sendo informada de que a retirada se processará em todas as linhas, ignorando entretanto, qual o destino a ser dado aos trilhos, que são de grande valor comercial e representam grande tonelagem."
FORTALEZA E OS VELHOS BONDES DA LIGHT - O Estado - 19/10/1951:
"As picaretas da municipalidade retornaram, em ritmo acelerado, à ingrata tarefa de arrancar os trilhos dos bondes, no trecho central da Floriano Peixoto. São os últimos, parece. Mas levam consigo a dolorosa certeza de que a nossa capital jamais verá trafegar os velhos bondes, que lhe enchiam as ruas de poesia e de vivacidade. Não cabe a administração atual a menor culpa. E talvez nem mesmo possa ser apontado um culpado, exceto o descalabro a que foi condenada a velha Companhia inglesa.
De qualquer maneira, há um grande erro em tudo isto. Vivemos uma época de progresso e tumulto, perdoado o acacianismo da afirmação. Aí estão as máquinas cinematográficas, colhendo os flagrantes das festas onde o Prefeito aparece, com a jovialidade e a simpatia dos homens felizes. Mas ninguém se lembrou de fixar o flagrante do último bonde, transitando pelas ruas de Fortaleza. Não existem, sequer, conforme fomos informados, uma fotografia, um desenho, uma lembrança.
A retirada dos bondes mais pareceu um ato de condenação. Um ato que não deveria deixar a mínima memória. E agora a Prefeitura com rapidez e eficiência, a faina destraidora...
No entanto, os homens da Prefeitura, talvez com a mesma picareta que destroem o calçamento e com a mesma colher com que, decerto, o reconstruirão, deveriam também consertar as calçadas das nossas ruas. São buracos imensos, tijolos, arrancados, poças de água e de sujo. Um transeunte mais descuidado poderá tropeçar e quebrar um pé ou uma perna. É verdade que o perigo se destina apenas ás pessoas que andam a pé. E só elas o enxergam.
O Prefeito não os vê. E os engenheiros muito menos. Pois eles andam sempre de automóvel, o que é mais cômodo e menos perigoso.
Agora que as obras da municipalidade estão sendo executadas na própria rua, com a retirada dos trilhos, aí fica mais uma sugestão ao Prefeito. Vamos consertar as calçadas. Vamos obrigar os proprietários a faze-lo, se a obrigação não for da alçada da Prefeitura Municipal."
O FIM DA LIGHT - O Povo - 09/03/1955:
A velha usina do Passeio Público está vivendo os derradeiros momentos de sua lenta agonia de morte. Seguindo o destino natural das coisas, vai desaparecer, de uma vez para sempre, do cenário da vida social e comercial da cidade, à qual tão relevantes serviços prestou, quando em pleno rendimento de suas hoje esfaceladas caldeiras. Dentro de pouco tempo mais, deixarão de pulsar os seus geradores.
Não podemos saber ainda qual o destino que será dado ao acervo da arcáica maquinária. Temporariamente, pelo menos, permanecerá onde está. Talvez como o velho gasômetro, ficará no mesmo local onde funcionou por tanto anos, por coincidência bem próximo uma da outra – dois marcos do progresso urbanístico da capital cearense, marcando duas épocas já definitivamente ultrapassadas.
Embora agonizante, a velha Light se portou, até agora, como um verdadeiro gigante, resistindo, com uma têmpera britânica, aos embates do tempo, dando o último de sua potencialidade em benefício da cidade que serviu e desserviu na medida de suas possibilidades. Tudo tem um limite, até para os organismos meramente mecânicos. E a Light chegou ao seu limite.
BONDES ELÉTRICOS - Diário do Nordeste 10/09/2000 - Opinião do Leitor:
Sr. Editor,
Acabo de ler uma entrevista concedida por Acrísio Moreira da Rocha, ex-prefeito de Fortaleza no período de 1947/1950, vangloriando-se por ter conseguido a encampaçõa da empresa inglesa “The Ceará Tramways Light and Power & Cia”, concessionária de transporte por bondes elétricos e energia elétrica para Fortaleza desde 1913. À época da encampação uma passagem de bonde da Praça do Ferreira até o fim de cada linha custava cem réis (um tostão). Você com apenas cem réis ia até o fim da linha de qualquer bairro: Jacarecanga, Praia de Iracema, Benfica, etc. Esse ex-prefeito, incontinente, vendeu os bondes elétricos, os trilhos de ferro, os cabos de cobre que levavam eletricidade para movimentar os bondes para Recife-Pernambuco, sem no entanto, oferecer nenhuma outra opção de transporte coletivo. Naquele tempo não existia Ettusa (Empresa de Transporte Urbano S/A), nem qualquer outro meio de transporte público. Com tanto dinheiro não foi construída nenhuma obra de vulto para justificar. É lamentável a insensibilidade desse ex-prefeito.
José de Lima Monteiro - Aldeota
A reportagem do O POVO procurou entender-se, a respeito, com a gerencia da Light, sendo informada de respeito, com a gerencia da Light, sendo informada de que a retirada se processará em todas as linhas, ignorando entretanto, qual o destino a ser dado aos trilhos, que são de grande valor comercial e representam grande tonelagem."
A fotografia dos anos 30 nos mostra um bonde elétrico da Ceará Tramways, Light & Power em Fortaleza. Está perto da Praça do Ferreira, na rua Pedro Borges esquina com Floriano Peixoto, em Frente à Mercearia Leão do Sul
NUNCA MAIS OS BONDES VOLTARÃO A TRAFEGAR “OS TRILHOS SERÃO VENDIDOS A QUEM DER O MELHOR PREÇO” FALA O PREFEITO SOBRE A RETIRADA DO PRECIOSO MATERIAL DA LIGHT - Correio do Ceará de 09/11/1948:
Desfazendo boatos
54.000 metros lineares com o peso de 2.000 toneladas
Aumento do patrimônio da antiga companhia inglesa
Já começou, pelo fim das linhas de José Bonifácio e Alagadiço a retirada dos trilhos dos antigos bondes da Ceará Tramways.
Os trabalhos estão sendo desenrolados de maneira acelerada, encontrando-se já removidos os trilhos dos três últimos quarteirões das linhas mencionadas.
Segundo estamos informados, o trabalho será logo mais iniciado também nas demais linhas, devendo ser concluído dentro de pouco tempo.
FALA-NOS O PREFEITO MUNICIPAL
Interpelado hoje de manhã a propósito da retirada dos trilhos de bondes, disse-nos o Prefeito Acrísio Moreira da Rocha.
“A retirada dos trilhos de bondes, das ruas da cidade é um ato de ordem técnico-administrativa tomado por mim como supervisor da Ceará Light, depois de estudos acurados que me levaram à convicção do acerto dessa medida.
Sei que inimigos de administrações criteriosas e honestas olham para esse ato meu, enxergando nele, malevolamente, um pasto para boatos tendenciosos e mentiras eivadas todas da mais acentuada falta de escrúpulo. Sei também, o propósito do assunto que um intrigante havia dito ter eu prometido, na campanha eleitoral, a volta dos bondes para agora, retirar os seus trilhos.
Jamais prometi volta de bondes e, para esses perturbadores profissionais, que vivem de inverter os fatos, adulterando a verdade dos mesmos, aqui vai a minha resposta: - estou retirando, por livre e espontânea vontade e por minha absoluta e inteira responsabilidade, os trilhos de bondes, numa extensão de cinquenta e quatro mil metros lineares, com uma pesagem total de cerca duas mil toneladas. Destinam-se à venda esses trilhos retirados, com exceção de apenas quatrocentos metros que, colocados por empréstimo no fim da antiga linha de José Bonifácio, dali foram tirados, há poucos dias, por ordem minha, para serem devolvidos à R.V.C., repartição a que pertencem.
Eu, que estudei o assunto, com todos os seus detalhes, posso assegurar ser melhor ter os trilhos guardados e expostos à venda do que tê-los enterrados sujeitos exclusivamente ao desgaste.
Ao expor os trilhos a venda, entrega-los-ei a quem der melhor preço aplicando a renda assim obtida em melhoramentos para o serviço de fornecimento de energia elétrica da capital cearense.
Uma parte, porém, do total de trilhos eu a tirarei para usá-la no serviço de distribuição de linhas, destinando-a a sustentar os postes de alta tensão.
No final, só resultados benéficos – tenho certeza – advirão dessa medida, inclusive o aumento do patrimônio da “Ceará Light” que, presentemente administrada pelo Prefeito de Fortaleza, vai ascender a um estágio mais elevado de eficiência, pois, dentre outros o meu governo tem os propósitos de aparelhar eficazmente a Usina, estender amplamente as redes de iluminação, fazendo-as acompanhar o rítmo de progresso da cidade, produzir com mais baixo custo, a energia elétrica e garantir as obrigações da empresa para com seus servidores.
Isto conseguirei – finalizou o Prefeito Acrisio sorrindo – mesmo enchendo de máguas os boateiros impenitentes e sem critério que, não tendo ocupações na vida, profissionalizam-se em difundir maledicências como autênticos solapadores de boa ordem administrativa que, entretanto, comigo nada conseguem porque, de qualquer modo, cumprirei o meu programa doa a quem dor”.
Desfazendo boatos
54.000 metros lineares com o peso de 2.000 toneladas
Aumento do patrimônio da antiga companhia inglesa
Já começou, pelo fim das linhas de José Bonifácio e Alagadiço a retirada dos trilhos dos antigos bondes da Ceará Tramways.
Os trabalhos estão sendo desenrolados de maneira acelerada, encontrando-se já removidos os trilhos dos três últimos quarteirões das linhas mencionadas.
Segundo estamos informados, o trabalho será logo mais iniciado também nas demais linhas, devendo ser concluído dentro de pouco tempo.
FALA-NOS O PREFEITO MUNICIPAL
Interpelado hoje de manhã a propósito da retirada dos trilhos de bondes, disse-nos o Prefeito Acrísio Moreira da Rocha.
“A retirada dos trilhos de bondes, das ruas da cidade é um ato de ordem técnico-administrativa tomado por mim como supervisor da Ceará Light, depois de estudos acurados que me levaram à convicção do acerto dessa medida.
Sei que inimigos de administrações criteriosas e honestas olham para esse ato meu, enxergando nele, malevolamente, um pasto para boatos tendenciosos e mentiras eivadas todas da mais acentuada falta de escrúpulo. Sei também, o propósito do assunto que um intrigante havia dito ter eu prometido, na campanha eleitoral, a volta dos bondes para agora, retirar os seus trilhos.
Jamais prometi volta de bondes e, para esses perturbadores profissionais, que vivem de inverter os fatos, adulterando a verdade dos mesmos, aqui vai a minha resposta: - estou retirando, por livre e espontânea vontade e por minha absoluta e inteira responsabilidade, os trilhos de bondes, numa extensão de cinquenta e quatro mil metros lineares, com uma pesagem total de cerca duas mil toneladas. Destinam-se à venda esses trilhos retirados, com exceção de apenas quatrocentos metros que, colocados por empréstimo no fim da antiga linha de José Bonifácio, dali foram tirados, há poucos dias, por ordem minha, para serem devolvidos à R.V.C., repartição a que pertencem.
Eu, que estudei o assunto, com todos os seus detalhes, posso assegurar ser melhor ter os trilhos guardados e expostos à venda do que tê-los enterrados sujeitos exclusivamente ao desgaste.
Ao expor os trilhos a venda, entrega-los-ei a quem der melhor preço aplicando a renda assim obtida em melhoramentos para o serviço de fornecimento de energia elétrica da capital cearense.
Uma parte, porém, do total de trilhos eu a tirarei para usá-la no serviço de distribuição de linhas, destinando-a a sustentar os postes de alta tensão.
No final, só resultados benéficos – tenho certeza – advirão dessa medida, inclusive o aumento do patrimônio da “Ceará Light” que, presentemente administrada pelo Prefeito de Fortaleza, vai ascender a um estágio mais elevado de eficiência, pois, dentre outros o meu governo tem os propósitos de aparelhar eficazmente a Usina, estender amplamente as redes de iluminação, fazendo-as acompanhar o rítmo de progresso da cidade, produzir com mais baixo custo, a energia elétrica e garantir as obrigações da empresa para com seus servidores.
Isto conseguirei – finalizou o Prefeito Acrisio sorrindo – mesmo enchendo de máguas os boateiros impenitentes e sem critério que, não tendo ocupações na vida, profissionalizam-se em difundir maledicências como autênticos solapadores de boa ordem administrativa que, entretanto, comigo nada conseguem porque, de qualquer modo, cumprirei o meu programa doa a quem dor”.
Ônibus da Ligth-Arquivo Assis de Lima
"As picaretas da municipalidade retornaram, em ritmo acelerado, à ingrata tarefa de arrancar os trilhos dos bondes, no trecho central da Floriano Peixoto. São os últimos, parece. Mas levam consigo a dolorosa certeza de que a nossa capital jamais verá trafegar os velhos bondes, que lhe enchiam as ruas de poesia e de vivacidade. Não cabe a administração atual a menor culpa. E talvez nem mesmo possa ser apontado um culpado, exceto o descalabro a que foi condenada a velha Companhia inglesa.
De qualquer maneira, há um grande erro em tudo isto. Vivemos uma época de progresso e tumulto, perdoado o acacianismo da afirmação. Aí estão as máquinas cinematográficas, colhendo os flagrantes das festas onde o Prefeito aparece, com a jovialidade e a simpatia dos homens felizes. Mas ninguém se lembrou de fixar o flagrante do último bonde, transitando pelas ruas de Fortaleza. Não existem, sequer, conforme fomos informados, uma fotografia, um desenho, uma lembrança.
A retirada dos bondes mais pareceu um ato de condenação. Um ato que não deveria deixar a mínima memória. E agora a Prefeitura com rapidez e eficiência, a faina destraidora...
No entanto, os homens da Prefeitura, talvez com a mesma picareta que destroem o calçamento e com a mesma colher com que, decerto, o reconstruirão, deveriam também consertar as calçadas das nossas ruas. São buracos imensos, tijolos, arrancados, poças de água e de sujo. Um transeunte mais descuidado poderá tropeçar e quebrar um pé ou uma perna. É verdade que o perigo se destina apenas ás pessoas que andam a pé. E só elas o enxergam.
O Prefeito não os vê. E os engenheiros muito menos. Pois eles andam sempre de automóvel, o que é mais cômodo e menos perigoso.
Agora que as obras da municipalidade estão sendo executadas na própria rua, com a retirada dos trilhos, aí fica mais uma sugestão ao Prefeito. Vamos consertar as calçadas. Vamos obrigar os proprietários a faze-lo, se a obrigação não for da alçada da Prefeitura Municipal."
Ônibus da Ligth-Arquivo Assis de Lima
A velha usina do Passeio Público está vivendo os derradeiros momentos de sua lenta agonia de morte. Seguindo o destino natural das coisas, vai desaparecer, de uma vez para sempre, do cenário da vida social e comercial da cidade, à qual tão relevantes serviços prestou, quando em pleno rendimento de suas hoje esfaceladas caldeiras. Dentro de pouco tempo mais, deixarão de pulsar os seus geradores.
Não podemos saber ainda qual o destino que será dado ao acervo da arcáica maquinária. Temporariamente, pelo menos, permanecerá onde está. Talvez como o velho gasômetro, ficará no mesmo local onde funcionou por tanto anos, por coincidência bem próximo uma da outra – dois marcos do progresso urbanístico da capital cearense, marcando duas épocas já definitivamente ultrapassadas.
Embora agonizante, a velha Light se portou, até agora, como um verdadeiro gigante, resistindo, com uma têmpera britânica, aos embates do tempo, dando o último de sua potencialidade em benefício da cidade que serviu e desserviu na medida de suas possibilidades. Tudo tem um limite, até para os organismos meramente mecânicos. E a Light chegou ao seu limite.
Ônibus da Ligth-Arquivo Assis de Lima
BONDES ELÉTRICOS - Diário do Nordeste 10/09/2000 - Opinião do Leitor:
Sr. Editor,
Acabo de ler uma entrevista concedida por Acrísio Moreira da Rocha, ex-prefeito de Fortaleza no período de 1947/1950, vangloriando-se por ter conseguido a encampaçõa da empresa inglesa “The Ceará Tramways Light and Power & Cia”, concessionária de transporte por bondes elétricos e energia elétrica para Fortaleza desde 1913. À época da encampação uma passagem de bonde da Praça do Ferreira até o fim de cada linha custava cem réis (um tostão). Você com apenas cem réis ia até o fim da linha de qualquer bairro: Jacarecanga, Praia de Iracema, Benfica, etc. Esse ex-prefeito, incontinente, vendeu os bondes elétricos, os trilhos de ferro, os cabos de cobre que levavam eletricidade para movimentar os bondes para Recife-Pernambuco, sem no entanto, oferecer nenhuma outra opção de transporte coletivo. Naquele tempo não existia Ettusa (Empresa de Transporte Urbano S/A), nem qualquer outro meio de transporte público. Com tanto dinheiro não foi construída nenhuma obra de vulto para justificar. É lamentável a insensibilidade desse ex-prefeito.
José de Lima Monteiro - Aldeota
Créditos: Cronologia Ilustrada de Fortaleza – Nirez,
Museu virtual do transporte Urbano, Cepimar e Assis de Lima