Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga
Fortaleza, uma cidade em TrAnSfOrMaÇãO!!!


Blog sobre essa linda cidade, com suas praias maravilhosas, seu povo acolhedor e seus bairros históricos.

domingo, 8 de julho de 2012

Avenida Duque de Caxias – Antigo Boulevard do Livramento


Boulevard Duque de Caxias - Álbum Fortaleza 1931

O Antigo nome 'Boulevard do Livramento', foi em razão da antiga Igreja do Livramento, hoje Igreja do Carmo.

Fatos Históricos da Avenida:


 06/abril/1860 - Ganha o nome de Boulevard Duque de Caxias (hoje Avenida Duque de Caxias), a via antes denominada Rua Pedro I, que limitava a parte construída da Cidade. 



Convento dos Cappuchinhos -Álbum Fortaleza 1931
 13/outubro/1903 - Ocorre o assentamento da pedra fundamental do Convento dos Padres Capuchinhos na Avenida Duque de Caxias, esquina com Rua Barão de Aratanha, por trás da Igreja do Coração de Jesus, solenidade presidida pelo reverendo Vigário Geral do Bispado, Monsenhor Bruno Rodrigues da Silva Figueiredo.

 10/março/1904 - Inaugura-se o Convento dos Capuchinhos, na Avenida Duque de Caxias esquina com Rua Barão de Aratanha, por trás da Igreja do Coração de Jesus, construção sob a responsabilidade do Frei Mansueto.
Hoje é a Cúria Provincial.


 15/janeiro/1908 - Iniciam-se os trabalhos de construção da Escola Pio X, na Avenida Duque de Caxias nº 201, na Praça Coração de Jesus, que seria inaugurada em 05/07 do mesmo ano.

 05/julho/1908 - Inaugura-se o prédio da Escola Pio X, na Avenida Duque de Caxias nº 201, na Praça Coração de Jesus.
Na época chamava-se Escola Dominical Pio X.




Centro Artístico Cearense - Arquivo Nirez
 28/abril/1912 - Inaugurado o prédio do Centro Artístico Cearense, na esquina da Avenida Tristão Gonçalves nº 1008 com Avenida Duque de Caxias.
Hoje nada mais existe do prédio, no local há a extensão da firma Acal



Colégio Cearense - Arquivo Nirez
 04/janeiro/1913 - Fundado o Colégio Cearense Sagrado Coração, pelos esforços do cônego Climério Chaves, padre Misael Gomes da Silva, monsenhor Otávio de Castro e monsenhor José Alves Ribeiro Quinderé (Monsenhor Quinderé).
Funcionou na Rua da Amélia nº 146 (Rua Senador Pompeu), Rua 24 de Maio, na praça Marquês do Herval (atual Praça José de Alencar), onde depois esteve a Rádio Iracema, indo depois para a Rua Barão do Rio Branco, no local onde hoje se levanta o Edifício Diogo e por fim foi para prédio próprio na Avenida Duque de Caxias nº 37(antigo, hoje 101), em 1917.
Em 1916, a administração passou para os Irmãos Maristas, sendo seu primeiro diretor o Irmão Epifânio.
Em 1921, editou a revista Verdes Mares.... 


Colégio Cearense nos primeiros anos da década de 30 - Arquivo Nirez
 11/dezembro/1913 - Inaugura-se a linha de bondes de tração elétrica da linha do Alagadiço, que saindo da Praça do Ferreira pela Rua Major Facundo dobrava à direita na Rua Clarindo de Queirós indo até a Praça Paula Pessoa (São Sebastião), Avenida Bezerra de Menezes e voltando pelo mesmo caminho até chegar a Rua Clarindo de Queirós, onde segue até a Praça do Carmo, dobrando na Avenida Duque de Caxias e entrando pela Rua Floriano Peixoto para voltar à Praça do Ferreira. 


Fábrica Santa Maria - Arquivo Nirez
 14/setembro/1918 - Surge a Fábrica Santa Maria, de Manuel J. Lima, que depois seria Fiação e Tecelagem Santa Maria Ltda., na Avenida Duque de Caxias nº 345. Fechou em 1964. 


Arquivo Nirez
24/janeiro/1921 - Inaugurada na Avenida Duque de Caxias, em frente à Igreja de Nossa Senhora do Carmo, o monumento a Nossa Senhora da Paz, adquirido através de subscrição pública iniciada em 1912, por iniciativa de comissão chefiada por Milton Sousa Carvalho e Adolfo Gonçalves de Siqueira.Ficava no passeio, no meio da avenida.
Depois foi transferida para o patamar da Igreja de Nossa Senhora do Carmo


Praça do Carmo - Arquivo Nirez
 29/junho/1922 - Instituído o Hino do Centro Artístico Cearense, com versos de Renato Viana e música do maestro Euclides da Silva Novo, em festa realizada na sede da agremiação, na esquina da Avenida Tristão Gonçalves com Avenida Duque de Caxias.
O hino foi tocado e cantado às 13h, no início da festa e no encerramento. 


 03/fevereiro/1923 - O Cine Pio X, na Avenida Duque de Caxias nº 201, na Praça do Coração de Jesus, inaugura-se com o filme A rainha dos brilhantes e, posteriormente, estréia seu palco. 

 1926 - Inaugurado o Cine Centro, no prédio do Centro Artístico Cearense, na esquina da Avenida Tristão Gonçalves nº 338, com Avenida Duque de Caxias.
O prédio não mais existe. 



Prédio do DNOCS -  Arquivo Nirez
 12/novembro/1932 - Criada a Comissão Técnica de Piscicultura, subordinada a Inspetoria Federal de Obras Contra as Secas - IFOCS, do Ministério da Viação, tendo como diretor o naturalista gaúcho Rodolpho Teodor Wilhelm Gaspar von Ihering (Rodolpho von Ihering).
Ficava em prédio no antigo bairro do Tauape, hoje Gentilândia.
Depois foi Serviço de Piscicultura e hoje é a Diretoria de Pesca e Piscicultura do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas - DNOCS.
O setor de piscicultura do DNOCS depois esteve em casa na Rua Barão do Rio Branco nº 1926, na Avenida do Imperador nº 1313, no 6º andar do Edifício Herculano e hoje está no prédio da Administração Central do DNOCS, Edifício Arrojado Lisboa, na Avenida Duque de Caxias nº 1700, projetado pelo arquiteto Marcílio Dias de Luna


 Janeiro/1934 - Fundada a Fábrica Vitória*, de caramelos, bombons, balas, doces e similares, do português Viriato da Ressurreição Ludovino, na Avenida Duque de Caxias nº 437.
Depois mudaria para Fábrica Viriato, por existir no Rio de Janeiro uma homônima.
Curioso é que uma palavra é anagrama da outra. 


Continua... 


*"Naquela época se fazia necessário instalar uma fábrica de chocolate e balas adotando forma 'modernizada' como uma indústria visando a competir com o mercado e pioneira no Nordeste - afinal, atividade era quase toda com processo manual. 

Com a não obtenção de recursos públicos para fazer a customização foi fechado a Fábrica Vitória para ato contínuo houve a mudança de ramo.

Aí o tio Viriato com seu sobrinho Alcindo (meu pai, também Português) - confeiteiro profissional formado em Lisboa em grande confeitaria como a do Chiado - tomaram a decisão de montarem uma "confeitaria" (que cabia em Fortaleza) - com certo refino nos docinhos (pasteis de nata, bombas, bolos, confeitos, pizza , enfim, estilo europeu) e tendo como 'parâmetro' a Confeitaria Colombo, no Rio, ainda hoje lá no centro, na Rua Gonçalves Dias.

No ano de 1955 aconteceu sua inauguração com o nome de CONFEITARIA VIRIATO, no mesmo prédio, onde durante anos lá foi o encontro da sociedade local sendo a primeira a lançar como 'novidade' a PIZZA napolitana. Uma confeitaria com bar e restaurante associada - repito, estilo a Colombo"


Rogério Gonçalves 
(sobrinho-neto de Viriato da Ressureição Ludovino)


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Fontes: Cronologia Ilustrada de Fortaleza de Miguel Ângelo de Azevedo e Arquivo Nirez

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Fortaleza, uma cidade em mutação


A partir de fotografias cedidas pelo MIS (Museu da Imagem e do Som), o fotógrafo Kid Jr. foi a campo fazer o registro desses mesmos locais na atualidade, repetindo o ângulo original de cada uma delas. "A única que permanece praticamente igual, e que deu para refazer exatamente como o fotógrafo no passado fez, foi a Praça da Estação, no Centro", diz Kid.

A original (antiga) mais recente data da década de 1960 e a mais antiga mostra uma imagem da cidade no fim do século XIX. 

Uma linda homenagem que o Diário do Nordeste fez para cidade!









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Fotos: Antiga - Thomaz Pompeu (cedida pelo MIS) / Recente - Dennis Nunes

quarta-feira, 4 de julho de 2012

Bode Ioiô - O bode cidadão


Na encarnada sala do Museu do Ceará, repousa sereno um herói cearense. Boêmio inveterado (apreciador de uma boa aguardente), pós-graduado em becos do Centro de Fortaleza, companheiro de artistas e intelectuais em noturnos cafés e, ainda, político honesto, já que ganhou sem se candidatar e não cumpriu, mas também não prometeu.

Ele, bode Yoiô, protagonizou alguns dos causos mais memoráveis da Praça do Ferreira, no coração de Fortaleza.

O caprino era mestiço (com forte predominância da raça alpina - é o fraco!), que viveu na Capital cearense perambulando entre bares e ruas do centro no início do século XX. Segundo se difunde, o bode teria vindo junto a retirantes, fugidos da seca de 1915.

Seu então proprietário, diante do dilema entre a panela e o bolso, preferiu - para sorte da boemia de Fortaleza - arrecadar uns vinténs com o animal. Foi vendido para um representante de uma empresa britânica no nordeste, a Rossbach Brazil Company, da qual se tornou uma espécie de mascote. Com propriedade agora localizada na Praia de Iracema, o bode, outrora mofino, puxado por uma corda de amarrar punho de rede, já não estava na pior. 


Propaganda de 1929 da empresa que comprou o bode ioiô

No entanto, não demorou para que a comilança do mato que circundava as dependências da empresa lhe entediasse por demais. O caprino era mesmo afeito a vadiagens e logo seguiu sua sina de andarilho, descobrindo o trajeto que lhe daria a alcunha de "ioiô". O bode aprendeu a partir da praia a seguir para a Praça do Ferreira, realizando o mesmo percurso diariamente. 

Imagem meramente ilustrativa, pois na época dessa foto, o bode ioiô ainda não havia chegado por aqui. Estamos na Rua Floriano Peixoto - Detalhe na foto para o Mercado de Ferro ainda com as duas partes. A foto é de 1908 e o bode apareceu por aqui em 1920. Álbum Vistas do Ceará 1908  

O boêmio

E foi nos passeios que conheceu a noite fortalezense e seus muitos companheiros. No entorno do famoso Café Java (sede-mor da Padaria Espiritual, inclusive), conheceu escritores, pensadores, músicos, atores, inúmeros artistas de mesas de bar.

Com eles, passeava pelas ruas, ia a teatros, saraus, coretos; deles fora batizado Yoiô e por eles conheceu ainda as delícias da cana-de-açúcar, a bebida destilada preferida, que recebia gratuitamente a cada estabelecimento frequentado. De cara, simpatizou-se por ele o pintor Raimundo Cela, mas foi por todos amado, considerado um cidadão como outro qualquer.

O político

Ainda em 1921, Yoiô aprontaria uma molecagem que o consagraria como autêntico amigo do povão. Naquela época, inaugurava-se nas imediações da praça aquele que seria um dos cinemas mais movimentados da época: o Cine Moderno.

A população chegava de bonde e as celebridades desciam de seus Chevrolets e aguardavam com expectativa a chegada do governador Justiniano de Serpa e do intendente Godofredo Maciel para a cerimônia.

Mas o danado do bode (provavelmente "cheio dos pau", como se diz em bom "cearês") cansou de esperar. Trotou com suas quatro patas até a fachada do prédio e fez as vezes de político: comeu a fita inaugural do cinema. No mesmo ano, lá estavam os intelectuais candidatando Yoiô para vereador de Fortaleza. Mas candidatura não quer dizer vitória! Quem disse? Quando se abriram as urnas, em 1922, o nome do bode saltava das cédulas. Não pode assumir o cargo, mas, mais uma vez, entrou para a história da cidade. 

Essa foto do bode Ioiô, é bem antiga. Importante destacar que o rabinho do bode ainda não havia sido furtado. Se for um bom observador, verá que o de hoje, é um pouco diferente. 
A cidade perdia seu mascote e o museu ganhava uma de suas maiores atrações...



O amante

Segundo afirmavam as companhias, além do jeito para as artes, o bode era um exímio entendedor de mulheres. Buliçoso, levantava com o chifre as barras das saias e dos vestidos das moças, garantindo ao macharal a boa vista.


 

A vida de boemia e libertinagem naturalmente não lhe pouparia da mortalidade, ao contrário, a aproximaria dela. O caprino deixou as ruas de Fortaleza em 1931, encontrado morto nas proximidades da Praça do Ferreira. Como homenagem, Adolfo Caminha resolveu empalhá-lo e é justamente sua figura que se encontra preservada no Museu do Ceará. Bom, preservada em termos, já que, em 1996, lhe roubaram o rabo (o que protagonizou nova história, ainda que "in memoriam").

Nos anais da história, consta que a "causa-mortis" fora, de fato, resultado da vadiagem: cirrose hepática. As malignas línguas, no entanto, dividem-se em duas hipóteses: noivo furioso ou atentado político.



"O bode vivia solto em constantes idas e vindas da Praça do Ferreira para a sede da empresa na Praia: Acabou ganhando o apelido de Yoiô.
Nessas andanças, Yoiô tornou-se conhecido e querido por todos, principalmente boêmios e escritores. Há relatos sobre o bode Yoiô em livros de diversos memorialistas cearenses.

O bode fumava charuto, tomava uns tragos, sentava-se num tamborete e parecia interessado nas conversas de bêbados, poetas e políticos, a quem distribuía chifradas democraticamente.

Como membro da elite intelectual da cidade Yoiô participou de atos públicos em coretos, praças e saraus literários; Passeou de bonde, perambulou por igrejas e assistiu a peças no Teatro José de Alencar. Consta que comandava passeatas democráticas e comia a fita das inaugurações quando os discursos se tornavam chatos.

Na Praça do Ferreira, capital da república do Ceará Moleque, o bode fazia alegria do macharal quando cismava de levantar as saias das moças, correr atrás dos tipos populares ou mesmo tomar uns tragos de cachaça nas mesas do Café Java.

Yoiô ficou tão famoso que recebeu expressiva votação para vereador. Eis o seu apogeu e decadência.

Um mistério paira no ar: em 1931 o bode Yoiô apareceu morto.Qual a causa da sua morte? São muitas as hipóteses.

Foi um crime político devido a sua expressiva votação? Cirrose hepática, consequência de uma vida boêmia? Talvez um crime passional cometido por algum marido enciumado pelas gracinhas do bode? O mais provável é que Yoiô morreu mesmo foi de velho.

A empresa inglesa empalhou o bode e entregou ao museu, o mais estranho: o museu aceitou e hoje faz alegria de todos aqueles que visitam o Museu do Ceará."

Evaldo Lima


Saiba Mais

As leis proibiam a circulação de animais desacompanhados pelas belas ruas da cidade. Ainda assim, Ioiô não era perturbado nem pelos fiscais municipais fato devido à conquista da simpatia popular conquistada pelo animal. Seu aspecto descuidado e seu cheiro característico e desagradável não impediam que o carinho dos fortalezenses o atingisse. Fazia companhia aos beberrões da época, tornando-se um deles. “Reza a lenda” que Ioiô fazia companhia nas bebedeiras dos boêmios da cidade, e uma companhia ativa. Fala-se ainda que sua fama era alargada por ter sua atenção chamada pelo efeito que o vento da Praça do Ferreira fazia nos vestidos das moças e nas batinas dos padres. Isso estimulava o bode a correr atrás desses dois grupos.


Ainda como manifestação de profundo amor ao Bode e revolta pelos desmandos e corrupções exercidos pelos políticos da época, em 1922, os eleitores de Fortaleza elegeram o Bode Ioiô para vereador da cidade, inclusive, com a maior votação daquela eleição. Não foi empossado (claro!), mas sua “eleição” foi considerada na época como uma representativa manifestação de protesto ao poder público e isso fez com que sua fama se expandisse além das fronteiras de Fortaleza. Bem além…Pois hoje existe uma réplica de Ioiô no Museu de Hollywood.

No decorrer dos anos, a cidade ia se desenvolvendo e o vigor físico do animal, em contrapartida, diminuindo. Por esse motivo, tornava-se cada vez menos comum encontrar o Bode Ioiô em meio à boemia. Até que, no ano de 1931, foi encontrado morto próximo à Praia de Iracema. Seu falecimento foi publicado e sentido por grande parte da população fortalezense.

Créditos: Diário do Nordeste, Blog do Professor Evaldo Lima e http://www.infoescola.com

Desenhos de Julião Jr.

terça-feira, 3 de julho de 2012

Tipos de Fortaleza



No final do século XIX e primeiras décadas do século XX ficaram famosos em Fortaleza “tipos populares” que riam e faziam rir de qualquer coisa jocosa que acontecesse nas ruas – daí tal comportamento, profundamente censurado pelas elites e classes médias, ter ganhado a alcunha de “Ceará Moleque”, expressão inclusive existente já à época.
Os tipos populares eram na maioria das vezes pessoas pobres, desocupadas ou sem trabalho fixo, depauperadas e maltrapilhas, que perambulavam pelas ruas, apresentando aparência ou comportamentos “excêntricos e cômicos”. Entre eles, destacaram-se:
(…) O “Casaca de Urubu”, que em 1915 causava rebuliço público quando ouvia coro de pessoas entoarem “casaca de urubu… bu… bu” – lutara na Guerra de Canudos quando moço e chegou a ser oficial de justiça, sendo expulso do emprego por ser epiléptico. O “De Rancho”, que munido de uma velha carabina desativada saía pelas calçadas gritando e “metralhando” os pedestres – inclusive o automóvel de um presidente estadual que, assustado com o “atentado”, mandou que o prendessem imediatamente –, teria enlouquecido durante a Primeira Guerra Mundial. (…) O “Pilombeta”, que odiava a palavra “trabalho”, fora agrimensor em Minas Gerais, era exímio jogador de xadrez e sabia tocar piano. O “Tertuliano”, que se vestia de beato e fazia pregações engraçadíssimas pelas praças, era dono de uma pequena venda. Assumira aquele furor místico depois de ficar ferido em violenta luta com policiais que o prenderam por não ter atendido a uma intimação policial[1].
Chaga dos Carneiros

Existia ainda o “Chaga dos Carneiros”, ferrenho monarquista, que andava sempre conduzindo três carneiros pintados, cada qual, em uma sátira à República, apelidados com nomes de alguns presidentes. Exemplo maior, contudo, foi o legendário Bode “Ioiô”. O animal, trazido por um flagelado da seca de 1915 para Fortaleza, acabou comprado pelo dono da firma exportadora Rosbach Brazil Company (situada na Praia do Peixe, hoje Praia de Iracema) e, em vez de virar uma suculenta buchada, foi mantido vivo, passando a perambular como “boêmio” pela cidade com grande simpatia e carinho da população, sem ser molestado. Em 1931, “Ioiô” morreu, de velhice, causando grande consternação pública e merecendo até destaque na imprensa. Seu “corpo” foi embalsamado e oferecido ao Museu Histórico do Ceará, onde ainda hoje pode ser visto.
Bode Ioiô
O local preferido para as manifestações e “excentricidade” do povo era a Praça do Ferreira – logo ali, o “coração da cidade”, por onde passavam bondes, gente com as últimas modas e novidades, os sisudos senhores proprietários e onde se encontravam as lojas mais elegantes, os principais cafés! Qualquer pessoa ou episódio que “quebrasse a rotina” eram pretextos para a divertida molecada soltar vaias, gracejos, palavrões ou bolar os apelidos e escárnios os mais engraçados. Imagine-se o ódio das camadas “destacadas da sociedade” ao terem seus nomes como alvos das chacotas do “canelau”…
Pode-se entender os tipos populares e o “espírito amolecado” do povo – em outras palavras, a irreverência popular –, num momento de disciplina e higienização da cidade, como uma forma de alívio ante a pressão social representada pelas más condições de vida e trabalho daquela massa de pobres, bem como uma expressão de descontentamento perante a normatização urbana que as elites tentavam impor. Ao serem “feios”, sujos, anti-higiênicos, “estranhos, exóticos e diferentes”, os tipos populares e o comportamento jocoso do povo chocavam-se frontalmente e ofendiam os padrões “civilizados” que os grupos médios e dominantes se esforçavam em estabelecer para acompanhar os valores “modernos” da Belle Époque. No fundo, era uma tática de resistência popular.
Airton de Farias
Fonte: [1] PONTE, Sebastião Rogério.Fortaleza Belle Epoque. Fortaleza: Fundação Demócrito Rocha. Multigraf Editora Ltda, 1993, pág. 177.

sábado, 30 de junho de 2012

Rodolfo Teófilo - O Benfeitor


"Nas suas barbas brancas de apóstolo, no seu recolhimento e na sua tristeza, é uma das mais belas figuras veneradas do Ceará.

Toda uma longa vida de trabalho, de fé e de coragem está naqueles setenta e oito anos fatigados que parecem mais velhos, no esgotamento do seu grandioso esforço.

Vinte livros já saíram das suas velhas mãos trêmulas, mãos que fizeram tanto bem e espalharam tanta luz, mãos que hoje só se exercitam nos dois grandes gestos do amor: a esmola, que socorre, que alimenta e que conforta; a benção, que eleva, que purifica e que perdoa.

Vinte livros. Toda a história dolorosa das secas e a tragédia nostálgica dos êxodos, nas páginas atormentadas de "Fome", do Paroara". Os grandes  dramas de sangue, as velhas lendas heroicas de banditismo e sertão, no "Os Brilhantes", no "O Condurú", em "Maria Rita". E a irônica vergastada de "Memórias de um engrossador", a encantadora utopia do "Reino de Kiato", e o doce lirismo intelectual de "Telesias", e o sombrio satanismo de "Violação"...

E toda uma obra de paciente saber, de apaixonado estudo, na grande bagagem dispersa copiosamente em meio da produção artística.



Hoje, o dono da alma heroica que venceu a peste negra, naquela luta gigantesca em que ia procurar lá dentro da sua cidadela de casebres a praça forte da miséria e da morte hoje,  como uma grande relíquia preciosa, é que vive, branco e trêmulo, luz cansada que invoca a grande noite, desejoso do doce sono que o venha libertar do peso amargo da vida, da saudade da velha e amada companheira que se foi, saudade que é seu único mal e sua única e infinita tortura.

Mas é preciso que não se vá. Velho avô bem querido, que nos ensinou a chorar nossas dores e a curar nossos males, velho avô, carecemos demais do muito que aprendeu, do muito que sabe dedicar-se, do muito que sabe amar...

E, se a inveja, a inconsciência e a ignorância conseguissem fazer apagar e esquecer o que sua mão escreveu, nas cicatrizes benfeitoras que cada cearense traz nos braços, está gravada para sempre a marca da sua ciência generosa, velho avô..."


Rachel de Queiroz


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Texto publicado no Álbum de Fortaleza de 1931

sexta-feira, 29 de junho de 2012

A Faculdade de Farmácia e Odontologia do Ceará


A mocidade estudiosa do Ceará de há muito que ansiava por uma Faculdade de Farmácia e Odontologia, que lhe viesse dar o passaporte oficial necessário a vida pública.


Graças aos esforços de uma plêiade de incansáveis e abnegados cearenses, a cuja frente, é de justiça destacar, se encontrava o Dr. Raimundo Gomes, que desde os seus primeiros instantes tem sido o batalhador incansável do progresso odontológico e farmacêutico de nossa terra, foi a 12 de março de 1916 fundada em Fortaleza a "Faculdade de Farmácia e Odontologia do Ceará".


Compreendendo a ingente vantagem que adviria para o ensino daquela Faculdade a sua oficialização, foi a mesma em outubro do mesmo ano, por lei estadual nº 1.391, considerada de utilidade pública e um ano depois a Assembléia, pela lei nº 1.458, autorizava a fiscalização oficial e bem assim determinou que, "Os diplomados pela Faculdade gozarão, para efeitos de sua profissão, dos direitos e privilégios conferidos pelas leis do Estado aos titulados em Farmácia e Odontologia pelas Faculdades oficiais da República".


A Faculdade na Rua Formosa (Barão do Rio Branco). Nesse prédio, esteve antes o Clube Iracema. O prédio já não existe mais, foi demolido. Arquivo Nirez


Funciona esse conceituado estabelecimento, em edifício próprio à rua Barão do Rio Branco nº 309, adaptado às exigências do ensino, dispondo de um bem organizado gabinete de Física e de Química; de um importante museu para estudos de História Natural; de um bem montado gabinete dentário com assistência pública diária, onde é ministrada a prática indispensável aos odontolandos e de uma farmácia para os farmacolandos se habilitarem à prática necessária à vida profissional farmacêutica.

Texto publicado no Álbum Fortaleza 1931

A iniciativa de fundar uma instituição de ensino médico na capital do Estado do Ceará partiu de um grupo de médicos, dentistas e farmacêuticos, tendo à frente o cearense Francisco de Sá Roriz, diplomado em odontologia no ano de 1912 pela então Faculdade de Medicina de Porto Alegre. Inicialmente, o objetivo era a criação de uma faculdade de medicina, mas devido à escassez de recursos decidiu-se pela Faculdade de Farmácia e Odontologia. Depois de reuniões consecutivas no consultório dentário de Raymundo Gomes (foto ao lado), a instituição foi fundada no dia 12 de março de 1916. Nesta época, na região norte e nordeste, já havia sido criadas a Escola de Farmácia do Pará e Escola Livre de Odontologia do Pará; Escola de Farmácia de Pernambuco e a Escola de Odontologia de Pernambuco. Nas cidades de Salvador e do Rio de Janeiro, desde o século XIX, já existiam os cursos de farmácia e de odontologia que funcionavam anexos à Faculdade de Medicina da Bahia e à Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro.

A aula inaugural da Faculdade de Farmácia e Odontologia do Ceará versou sobre anatomia, sendo proferida por Sá Roriz na sede do Centro Espírita Cearense, situado na rua Major Facundo, contando apenas com dois alunos.

Prédio onde funcionou a Faculdade na Rua Barão do Rio Branco

No mês seguinte à sua fundação, foi apresentado o projeto do regulamento redigido e aprovado pelo diretor Francisco de Sá Roriz. Este determinava que a instituição se espelhasse nas leis e regulamento do Governo Federal, além de organizar uma clínica dentária gratuita para atendimento aos pobres e também para aprendizado dos alunos, dirigida por um lente de clínica. A diretoria era composta por um diretor, um vice-diretor, um secretário, um tesoureiro e um bibliotecário, eleitos por dois anos pela Congregação, formada pelos lentes e substitutos em exercício. O ingresso dos alunos era feito mediante exame vestibular.

Os cursos tinham duração de dois anos cada, sendo constituídos pelas seguintes disciplinas:

Gif de hospitalFarmácia:

1ª série: história natural, química inorgânica, física e farmacologia;

2ª série: química orgânica, química analítica e arte de formular.

Gif de hospitalOdontologia:

1ª série: anatomia descritiva da cabeça, histologia, fisiologia e patologia dentária;

2ª série: anatomia médico-cirúrgica, higiene da boca, clínica odontológica e prótese dentária.

De início, o corpo docente ficou constituído por seus fundadores: os farmacêuticos Affonso de Pontes Medeiros, Joaquim Frederico Rodrigues de Andrade e José de Morais Studart; e os odontólogos Francisco de Sá Roriz, Raymundo Gomes, Pedro Veríssimo de Araújo(foto ao lado), Américo de Marães Picanço, Mozart Catunda Gondim e Mamede Cirino de Lima. Mais tarde, os médicos José Odorico de Moraes, Raymundo Leopoldo Coelho de Arruda e o naturalista Francisco Dias da Rocha também se envolveram na organização da instituição. Este último, embora não fosse diplomado médico, era entomologista e naturalista cearense reconhecido nacionalmente; e por isso lhe foi concedido o diploma de farmacêutico pela instituição, que o admitiu como professor catedrático de História Natural. Durante o período inicial de funcionamento da Faculdade, esses professores abriram mão de seus vencimentos para aplicação na compra de material necessário para o desenvolvimento dos estudos. Além disso, destacaram-se as doações feitas por Francisco Dias da Rocha, de seu Museu de História Natural, formado por animais empalhados, classificados e fichados; e pelo farmacêutico Juarez Furtado, que, ao se desfazer de seu estabelecimento comercial, a Farmácia Amazonas, transferiu suas instalações para a Faculdade, incluindo materiais e substâncias para laboratório.

Ainda em 1916, a diretoria requereu à Assembléia Legislativa cearense que a instituição fosse reconhecida como de utilidade pública para efeitos jurídicos. Pelo parecer n° 57 de 23/09/1916, lhe foi concedido tal reconhecimento pela Comissão de Instrução Pública, que considerou a instituição merecedora de apoio do governo estadual. Foi decretada então a lei n° 1.391 de 2 de outubro do mesmo ano, pela qual foi autorizado o governo do Estado a reconhecer como de utilidade pública a "Faculdade de Pharmácia, Odontologia e Curso de Parto do Ceará". Embora presente na denominação do estabelecimento, o Curso de Parto não chegou a funcionar naquela época.

Maria da Penha, eleita a Rainha dos Calouros, ingressa no curso de farmácia em 1962.
"Queria uma área médica, mas não medicina, porque não iria conseguir enfrentar uma cirurgia. Minha avó sugeriu que fizesse farmácia. Fui para a área de análises clínicas. Sou da primeira turma da Faculdade de Farmácia de 1966, na Universidade Federal do Ceará." Maria da Penha


A partir de então, o número de matrículas se ampliou, com a Faculdade passando a receber estudantes dos Estados vizinhos. Visando o reconhecimento oficial de seus diplomas, a instituição solicitou a fiscalização do governo do Estado, que lhe foi concedida pela lei n° 1.458 de outubro de 1917. Neste mesmo ano, em dezembro, formou sua primeira turma com quatro odontólogos e oito farmacêuticos.

Quanto às suas instalações, mudou diversas vezes de endereço desde sua fundação até 1923, quando obteve sede própria, situada na rua Barão do Rio Branco, adquirida do Club Iracema.

A primeira diretoria ficou assim constituída: Francisco de Sá Roriz (diretor); Mozart Catunda Gondim (primeiro secretário); Pedro Veríssimo de Araújo (segundo secretário); Raymundo Gomes (tesoureiro); e Mamede Cirino de Lima (bibiotecário).

Faculdade na Rua Liberato Barroso nº 525, esquina com rua 24 de Maio


Diretores:

Francisco de Sá Roriz (1916-1918); Raymundo Leopoldo Coelho de Arruda (1918- 1920); Affonso de Pontes Medeiros (1920-1922); José Odorico de Moraes (1922- 1923 e 1940-1943); José Nelson Catunda (1923-1924); Carlos da Costa Ribeiro (1924-1925); Raymundo Gomes (1925-1927 e 1948-1949); Amadeu Furtado (1927-1929, reeleito 1929-1931); Raymundo Leopoldo Coelho de Arruda (1931-1933, reeleito 19/03/1934-agosto 1934, quando faleceu, ocupando seu lugar o vice-diretor Francisco Dias da Rocha); Américo de Marães Picanço (1936-1939).

Professor Dias da Rocha

Denominações: Faculdade de Farmácia e Odontologia do Ceará (1916); Faculdade de Farmácia e Odontologia da Universidade do Ceará (1954); Faculdade de Farmácia e Faculdade de Odontologia da Universidade Federal do Ceará (1965)


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Fontes: MARANHÃO, Leite. Resenha histórica. In: UNIVERSIDADE DO CEARÁ.FACULDADE DE FARMÁCIA E ODONTOLOGIA. Anais. Tomo I. Fortaleza: Imprensa Universitária, [1963]. (CCS – UFRJ) - FARIAS SOBRINHO, José Ribeiro. 140 anos do ensino farmacêutico no Brasil: 1832-1972. João Pessoa: ESLF, 1973. (BCOC), Álbum Fortaleza 1931 e arquivo do blog
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