Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga
Fortaleza, uma cidade em TrAnSfOrMaÇãO!!!


Blog sobre essa linda cidade, com suas praias maravilhosas, seu povo acolhedor e seus bairros históricos.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

A arquitetura do ferro em Fortaleza



A segunda metade do século XIX e início do século XX foram de grande impacto na vida da cidade, pois diversos equipamentos foram instalados e mudanças importantes ocorreram:

Criação das linhas de navio a vapor de Fortaleza para o Rio de Janeiro e Europa (1866); o surgimento do sistema de canalização pública (1867); a criação das linhas de bondes (1880); o telégrafo submarino que ligava a cidade ao sul do país e a Europa (1882), o telefone (1883) e a construção do Mercado da Carne (1897), importado da França. Também tivemos acontecimentos importantes como o Plano da Cidade de Fortaleza e Subúrbios de Adolfo Herbster (1875) complementado em 1888, bem como a aprovação do Código de Postura (1893) deram um novo impulso à capital com relação ao seu traçado e ordenamento. A construção da 
Igreja do Pequeno Grande (1903) e a instalação do Teatro José de Alencar (1910).


Esse conjunto de acontecimentos representavam evidências que o processo civilizador capitalista se implantava no Ceará e na Capital.

De acordo com a historiadora Cacilda Teixeira Costa, a partir do final do século XIX passou a existir um consenso mundial quanto ao repertório de edifícios públicos que as cidades deveriam ter para serem verdadeiramente “uma cidade”. Construídos na maior escala possível a cada cidade constavam basicamente de uma prefeitura ou palácio do governo, um fórum, uma bolsa de valores, uma ópera ou um grande teatro, um museu ou uma galeria de arte, uma ou mais estações ferroviárias, mercados, uma alfândega (caso se tratasse de um porto) e, se fosse capital do país, uma câmara e um senado, e um ou mais ministérios. Todas as cidades deveriam ter ao menos um parque público, na maior dimensão possível, e quando houvesse condições para isso, um jardim zoológico. Além disso, os novos costumes exigiam lojas, banhos públicos, restaurantes, cafés e salões de chá, instalações sanitárias, artefatos de iluminação.


As obras arquitetônicas dos engenheiros do século XIX baseavam-se amplamente no emprego do ferro. A história do ferro como material de utilidade mais que meramente auxiliar na arquitetura inicia-se durante a Revolução Industrial, depois de 1750, ao se descobrir uma maneira de produzi-lo industrialmente. Logo se fizeram tentativas de substituir a madeira ou a pedra pelo ferro. As vantagens do ferro e também do vidro eram evidentes para mercados cobertos e estações ferroviárias, dois tipos de construção trazidos para primeiro plano pelo extraordinário aumento da população urbana nos princípios do século XIX e pela crescente troca de materiais e de produtos entre as fábricas e as cidades.

Ainda segundo a historiadora, nesse entendimento, no período compreendido entre a segunda metade do século XIX e início do século XX, houve no Brasil uma grande importação de edifícios e complementos de ferro, pré-fabricados nas indústrias europeias, empregados para os mais variados fins, desde teatros, mercados, estações ferroviárias e quiosques, até fontes, postes de iluminação e todo tipo de acessórios de construção, cuja procedência variava entre Grã-Bretanha, França, Bélgica e Alemanha.

Através do porto de Fortaleza se dava a exportação de matérias-primas e a importação de produtos industrializados do continente europeu. Com a inauguração da Estação Central de Fortaleza, em 1880, surgia também pela primeira vez uma estrutura de ferro pré-fabricada¹ em uma edificação na cidade. Contudo, Fortaleza passou por um período de pouco investimento em sua infraestrutura, um pouco antes, durante a grande seca (1877-1879); e logo após, em 1880, retoma os investimentos no seu aformoseamento e novas construções urbanas.

A cidade assistiu a implantação de edificações inteiramente pré-fabricadas em ferro, importadas da Europa, num momento, talvez único, em que edificações completas se tornaram produtos industrializados, vendidos através de catálogos, como mercadorias. Três edificações, o Mercado da Carne² (1897), a Igreja do Pequeno Grande (1903) e o Teatro José de Alencar (1910), ainda existentes na cidade de Fortaleza, são representantes da arquitetura do ferro.

Arquivo Nirez

Página do Catálogo Guillot Pelletier com exemplo de mercado de ferro.
Fonte: www.delcampe.net

Conforme o historiador Sebastião Rogério Ponte, um grande estudioso da historiografia cearense, desde 1840, Fortaleza passou a deter a exclusividade do movimento exportador-importador, sendo assim o principal entreposto comercial da região. Diante dessa expansão econômica e urbana da cidade, os poderes públicos, as elites enriquecidas e os setores intelectuais realizaram um significativo conjunto de reformas urbanas capaz de alinhar a cidade aos códigos de civilização, usando como referência os padrões materiais e estéticos dos grandes centros urbanos europeus.

Estrutura de ferro da Igreja do Pequeno Grande.
Acervo de Maria Claudia Vidal Lima Silva.

Estrutura de ferro da Igreja do Pequeno Grande.
Acervo de Maria Claudia Vidal Lima Silva.

Sobretudo através de estratégicas medidas embelezadoras, saneadoras e higienistas para ordenar seu espaço e disciplinar sua população. A “civilização” enfim chegara a Fortaleza.
Mas não bastaria apenas dotar a cidade de equipamentos e serviços modernos: era necessário “civilizar e “domesticar” a população, acima de tudo os setores populares, “cujos hábitos e costumes eram tidos como rudes e selvagens pelos agentes daquele processo civilizador”.

No Brasil, dentre os edifícios pré-fabricados em ferro importados, nenhum tipo foi tão útil e tão disseminado quanto os mercados públicos. No período compreendido entre a segunda metade do século XIX e início do século XX, houve no Brasil uma grande importação de complementos e edifícios de ferro pré-fabricados, produzidos nas indústrias europeias, empregados para os mais variados fins, desde teatros, mercados, estações ferroviárias e quiosques, até fontes, postes de iluminação e todo tipo de acessórios de construção, cuja procedência variava entre Grã-Bretanha, França, Bélgica e Alemanha. Exemplares semelhantes ocorreram na mesma época, também em várias outras partes do mundo, como: Argentina, Peru, Chile, Uruguai, Paraguai, México, Vietnã, Índia, Marrocos, Austrália, África do Sul, Caribe, entre outros.

Como nessa época a siderurgia brasileira ainda não era capaz de tal produção em ferro, as construções foram importados para resolver demandas relativas ao crescimento, aformoseamento das cidades e muitas vezes eram entendidas como símbolo de progresso. Ao importar os produtor europeus, o Brasil recebia objetos “modernos”, frutos de uma tecnologia de ponta na época, sem que o país tivesse vivido o processo de industrialização e modernização.

Ilustração do Teatro José de Alencar no Suplemento especial Walter MacFarlane
Arquivo do IPHAN-CE.

Além das mudanças sócio-econômicas, as transformações tecnológicas ocorridas durante a segunda metade do século XIX provocaram também, modificações nos modos de habitar e construir. Com a instalação de ferrovias e linhas de navegação, novas condições de transporte no país, vieram permitir o surgimento desse novo fenômeno, edifícios importados e produzidos pela indústria.

[...] Fabricados nos países europeus, vinham desmontados, em partes, nos porões dos navios. A importação era completa, pois compreendiam de estruturas e vedações até coberturas, escadas e peças de acabamento, que eram aqui montadas, conforme as instruções e desenhos que as acompanhavam. [...] As peças, numeradas, facilitavam a montagem, tornando-a mais rápida e dispensavam em parte a mão-de-obra especializada no local (REIS FILHO, 1983: 156).

A importação de edifícios pré-fabricados de ferro não se deu, uniformemente pelo território nacional, como também, não se localizou especificamente em uma cidade ou região e nem tão pouco em grandes proporções. Essencialmente, esse tipo de edificação ocorreu em regiões beneficiadas pelo rápido crescimento econômico, subordinado à exportação de produtos agrícolas, tais como açúcar, algodão, café e borracha. Essas edificações metálicas ocorreram principalmente nos atuais estados do Rio Grande do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco, Ceará, Pará e Amazonas, mais especificamente em suas capitais, respectivamente, Porto Alegre, São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Fortaleza, Belém e Manaus. Nessas cidades e regiões aconteceu um intenso crescimento econômico na época. Porém, algumas dessas regiões tiveram um progresso econômico tardio, mas de intenso vigor, principalmente a partir do início do século XIX.

As fundições começaram a editar catálogos a partir do final da década de 1830, tanto na Grã-Bretanha, quanto no continente. Mas foi entre 1840 e 1870, o período de maior esplendor dessas publicações, em que as empresas de fundição ofereciam uma extraordinária série de produtos de ferro fundido, reunidos em catálogos ou álbuns comerciais com centenas de páginas ilustradas.
Os catálogos constituíam uma grande despesa para as fundições, tanto pelo custo de produção quanto pela necessidade de aumentar o número de modelos, que diversas vezes saiam de moda antes de serem reproduzidos o suficiente para se pagarem. Esses modelos ou protótipos exigiam mão de obra especializada, sobretudo dos moldadores, o que os encarecia demasiadamente.

Páginas de um dos Catálogos:





Trazia, ainda nos seus exemplos, os desenhos das vistas exterior e interior da platéia do Teatro José de Alencar, inaugurado em Fortaleza em 1910, como também algumas obras arquitetônicas completas escolhidas entre muitas apresentadas neste rico suplemento, desde mercados, casas, quiosques para venda de refrescos, coretos, jardins de inverno, fontes públicas, fachadas de edificações; além de equipamentos e peças de ferro em geral, como escadas, portões, grades, guarda-corpos, marquises, pias, banheiras, canos e equipamentos de esgotos.

Dificilmente poderia se imaginar como seriam as fachadas dos sobrados de cidades brasileiras sem as varandas de ferro fundido que as vestiam. As peças de ferro chegavam por mar, por trem ou eram transportadas por terra através de distâncias enormes.




¹ Cobertas das plataformas internas da Estação Central, construída segundo projeto do engenheiro austríaco Henrique Foglare.

² O local original onde foi montada a edificação, já não mais o possui. Atualmente encontra-se separado em dois Mercados independentes, um fica na Aldeota, denominado Mercado dos Pinhões, e o outro, o Mercado da Aerolândia, em bairro de mesmo nome. A estrutura de cobertura da rua, que ligava os dois pavilhões se perdeu depois da separação, no início da década de 1930.

Continua...


Crédito: Uma Revolução no tempo das trocas: Arquitetura do ferro na cidade de Fortaleza (1860-1910) - Maria Claudia Vidal Lima Silva
Fotos: Arquivo Nirez, Arquivo do Iphan, Arquivo do site e Acervo de Maria Cláudia.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Antiga cadeia pública de Fortaleza

  

No ano de 1850, é ordenado ao engenheiro Manuel Caetano de Gouveia que organizasse a planta e desse início a obra de construção da Cadeia Pública de Fortaleza, ficando o prédio pronto em 1866. 

Registro dos anos 70. Acervo Eugênio Arcanjo

Em 21 de novembro de 1867, os presos são então transferidos dos xadrezes que ficavam embaixo da Casa da Câmara, na rua Floriano Peixoto.
O prédio localiza-se no quadrilátero entre a rua SenadorPompeu, rua Dr. João Moreira, rua General Sampaio (antiga rua da Cadeia) e rua Senador Jaguaribe.
Contorna o prédio uma alta muralha que mede em quadro 396 m².


De acordo com o arquiteto e urbanista Totonho Laprovitera, o prédio começou abrigando somente homens e, no início do século XX, foi construída uma ala feminina.
Possuía uma cozinha espaçosa e diversos quartos para oficinas e o corpo da guarda, que ficava ao lado setentrional. No pátio, um poço fornecia água para a lavagem e outros misteres.

Arquivo Nirez

É um grande prédio assobradado no centro e dividido em dois raios no pavimento inferior, onde ficavam as celas em número de 28, medindo 6m de altura e no andar superior 11m.


Também no andar superior ficava o alojamento do carcereiro, o arquivo, a administração, o refeitório e as enfermarias que recebiam ar e claridade por grades de ferro que as fecham, e duas janelas que olham para o mar.
Em cada cela, ficavam de 12 a 20 presos. Eram fechadas por janela alta com grossos varões de ferro que deita para o pátio e grade de ferro para os corredores.

Foto da antiga cadeia pública pelo lado da praia - rua Senador Juagaribe. Um dos comércios que funcionava por trás do prédio, era "O Nosso Bar".
O Nosso Bar apareceu depois que a cadeia passou a Emcetur. Esta foto foi tirada entre os anos de 50 a 60. O caminhão lá atrás era um Ford dos idos de 40 e um pouco mais distante um carro PontiacOs carros naquela época ficavam nas ruas sem qualquer segurança esperando o dono. Como este estacionado na lateral da Santa Casa. Arquivo Nirez

É um dos primeiros edifícios públicos a atender as modificações impostas pela Legislação Penitenciária Imperial.
Em 1967, começou a desativação da cadeia. Nesse processo, conforme Totonho (já citado) surgiram duas correntes: uma queria que o local fosse demolido para dar lugar a um estacionamento e outra queria a construção de um hospital.
O prédio foi desativado em função da construção do Instituto Penal Paulo Sarasate e em 12 de setembro de 1969, os detentos deixam a velha cadeia e são transferidos para o IPPS, na BR-116. O primeiro diretor naquele local foi o coronel Francisco Bento.

Foto aérea dos anos 70 vendo-se a antiga Cadeia pública. 
Foto de Nelson Bezerra

O prédio de linhas neoclássicas caracteriza-se pela clareza e simplicidade das formas. Foi desocupado na Gestão do Governador Plácido deAderaldo Castelo.
Em 14 de setembro de 1971, instala-se em Fortaleza a Emcetur. O primeiro diretor foi Eliezer de Sousa Teixeira.

Arquivo Nirez

Conservando-se as mesmas linhas arquitetônicas e respeitando suas características neoclássicas, a antiga Cadeia Pública foi adaptada.
A responsabilidade do projeto coube aos arquitetos Francisco Afonso Porto Lima e Francisco Américo de Vasconcelos, ficando a execução do projeto sob a responsabilidade da Secretaria de Obras do Estado do Ceará (SOEC).


Em 31 de março de 1973, é inaugurado o Centro de Turismo de Fortaleza, pelo então governador César Cals.
As celas deram lugar as lojas de artesanato e o pavimento superior, foi adaptado para sediar a Empresa Cearense de Turismo (Emcetur). Após a extinção do órgão, passaram a funcionar no local o Museu de Mineralogia, que buscou expor ao público as riquezas minerais do solo cearense, e o Museu de Arte e Cultura Popular, que retrata a cultura do povo cearense, com esculturas feitas pelo artista Deoclécio Soares (Bibi), as artes esculpidas em cerâmicas feitas pelo artista Cícero Simplício do Nascimento (Cizin), e os bonecos feitos pelo Mestre Boca Ricca.


Interessante é perceber o nível de preservação, inclusive sendo mantida a fechadura antiga das celas, dando um ar ainda mais histórico para o prédio.
Belíssimo exemplar do século XIX, o prédio possui vários elementos de arquitetura, tais como: frisos, cornijas, molduras, grades, gárgulas (jacarés) nas fachadas e outros.
É protegido pelo Tombo Estadual segundo a lei n° 9.109 de 30 de julho de 1968, através do decreto n° 15.319 de 17 de junho de 1982.
Ao todo, são 105 lojas e dois quiosques, onde são vendidos diversos itens, de rendas de bilro e renascença a brinquedos de madeira, passando por cordéis, utensílios e objetos de decoração. Também é possível encontrar roupas de algodão cru, moda praia e produtos típicos da nossa gastronomia, tais como doces, castanhas, compotas, licores e cachaças.

Crédito da foto: http://emcetur.com.br/

De janeiro de 2008 a março de 2010, a infraestrutura do edifício passou por uma grande reforma. Diante da necessidade da restauração de um equipamento tão importante para o patrimônio histórico e turístico cearense, o Governo do Estado, por meio da Secretaria do Turismo do Estado (Setur), realizou as obras de melhoria nos blocos norte, central e sul. Todas as restaurações foram voltadas para preservar o espaço e permitir a acessibilidade das pessoas com deficiência e do público em geral. Pisos e telhados foram trocados. Toda a parte hidráulica, elétrica e sanitária foi substituída. A pintura foi refeita em todo o prédio. O jardim recebeu reformulação e nova iluminação. Os banheiros foram ampliados. A acessibilidade a cadeirantes foi contemplada por meio de um banheiro adaptado e da instalação do elevador que dá entrada ao 1º piso, onde fica o Museu de Arte e Cultura Popular.
A reforma custou R$ 1,9 milhão em verbas do Tesouro Estadual e do Ministério do Turismo.

Crédito da foto: http://emcetur.com.br/

Museu de arte e cultura popular - Crédito da foto: http://emcetur.com.br/

No pavimento térreo do bloco central, cuja área é de 2.834,94 m², a reforma incluiu as lojas e a instalação do elevador panorâmico. Já o andar superior, recebeu melhorias na diretoria e sala de reuniões, no almoxarifado e nas salas de guias turísticos. O bloco sul, com 752,55 metros quadrados, conta com estacionamento para 42 veículos, além da reforma das lojas e jardins.
A reinauguração se deu no dia 16 de março de 2010 com grande solenidade.

Horários de Funcionamento:
Segunda à Sábado: 8hs às 17hs
Domingo e Feriados: 8hs às 12hs

Crédito da foto: http://emcetur.com.br/

Crédito da foto: Blog História e Viagem

Curiosidade: 

*Há rumores, entre os comerciantes daquele local, que estranhas passagens secretas estão escondidas no chão do prédio.

*Um dos detentos da antiga cadeia pública, foi o jogador Idalino.
Leia sobre o crime que o levou para atrás das grades AQUI.





sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

Mudança nos nomes dos bairros


O crescimento urbano gerou a substituição dos antigos nomes dos bairros por denominações mais modernas e atuais

No rol das confusões entre os bairros, a memória e a modernidade travam uma luta diária. Enquanto as novas gerações conhecem nomes como Antônio Bezerra, Aldeota, Meireles, Bairro de Fátima, Castelão e Messejana, moradores mais antigos lembram do Outeiro, do Lagamar, da Praia do Peixe, da Estância e do Mata Galinha. Mesmo com os nomes antigos em desuso, a simples lembrança é significativa para a identificação da população com o bairro.


Bairro Aldeota em 1973 - Foto de Nelson Bezerra

O memorialista Miguel Ângelo de Azevedo, o Nirez, foi testemunha da mudança de nome de muitos bairros e também do desaparecimento de alguns deles por conta do crescimento de outros. O Porangabussu virou Rodolfo Teófilo, o Coqueirinho e o Campo do Pio se tornaram Parquelândia; o Outeiro passou a ser Aldeota; a Pirocaia ganhou o nome de Montese, etc. 

Nirez lembra de bairros que praticamente desapareceram do mapa da cidade, ou melhor, cujos nomes dificilmente se escuta hoje em dia. A Vila Monteiro, por exemplo, foi incorporada ao Joaquim Távora, o mesmo aconteceu com a vizinha Vila Zoraide. O bairro Tauape é outro exemplo, conta o memorialista. Identificado com a Lagoa do Tauape, no momento em que o manancial foi aterrado para a construção do canal do Jardim América, o nome do bairro praticamente desapareceu junto com as águas.

Foto ao lado do Bairro Meireles - Travessa Acaraú (Vila Bancária) em 1967. Foto de Cláudio Santos

Outro fato interessante relembrado pelo pesquisador é o caso da Piedade, bairro que nunca existiu. “As pessoas chamavam o bairro de Piedade por causa da igreja da Piedade, mas ele não existia”, lembra. Os casos são muitos, assim como as denominações. “Alguns nomes sobrevivem pela força da tradição, do poder político, outros não”, reflete a Dra. em Ciências Sociais Marinina Gruska Benevides
A nomenclatura de um bairro não é apenas uma questão estética, explica a professora. O nome que é dado a uma unidade urbana é resultado de um momento histórico e da organização da sociedade nesse dado período.

Portanto, por trás da mudança de nome de um bairro há vários fatores, como interesses sociais e políticos. Marinina Gruska observa que, anteriormente, as denominações das unidades da cidade eram escolhidas a partir de nomes da fauna e flora regionais (Coqueirinho - atual Parquelândia); das atividades econômicas que caracterizavam uma dada região (Brasil Oiticica, atual Carlito Pamplona); da tradição indígena (Pirocaia - hoje Montese) e também pelos marcos de sociabilidade da área (Açude João Lopes - hoje Monte Castelo).


Bairro  Monte Castelo em 1993

Esses nomes, continua a professora, refletiam a perspectiva histórica de uma sociedade coletivista. Com a modernidade e a ascensão dos valores individualistas, as nomenclaturas foram substituídas por nomes de personalidades, pessoas que tiveram importância para o bairro, indivíduos de poder e influência política ou que desempenharam um papel representativo na sociedade.

Assim, vemos surgir bairros como Edson Queiroz (industrial), Antônio Bezerra (escritor), Farias Brito (filósofo), etc. A professora explica que, para além das homenagens, a troca do nome de um bairro reflete uma relação política. “Apagando o nome de um bairro você apaga a memória de um povo que não se quer lembrar por diversos motivos”, reflete. Por outro lado, a ideia da mudança das denominações dos espaços da cidade são anunciadas como traços da modernidade.


Bairro Edson Queiroz em 1981 - Acervo O Povo

É o caso, por exemplo, do bairro Aeroporto. Localizado em uma área que até os anos 60 era conhecida apenas por Vila União, com a chegada do equipamento, o local passou a ser chamada de Bairro do Aeroporto. No entanto, com a transferência do terminal de passageiros para outro lugar, o nome Aeroporto praticamente caiu em desuso e a Vila União voltou a ser referência na cidade.

Consenso

Para a presidente da Federação de Bairros e Favelas, Gorete Fernandes, a mudança, seja do nome de uma rua ou bairro, não pode ser feita à revelia da população. “Tem que partir do debate, do desejo da população, precisa haver discussão”, afirma.

Ela explica que as trocas sem o consentimento da população geram problemas na entrega de correspondências e podem promover o distanciamento da comunidade. Para que a mudança seja democrática, Gorete Fernandes observa que é necessária a realização de audiências públicas e a coleta de um abaixo-assinado, que deve conter, no mínimo, 50% de assinaturas dos moradores.

Foi assim que se deu a denominação do atual Planalto Ayrton Senna. A comunidade, formada a partir de ocupações de terras, era conhecida como Pantanal. Em 2001, a população se organizou e votou pela escolha do nome atual do local. A troca foi uma forma de quebrar o estigma de violência e pobreza que a área carregava perante os outros moradores da cidade.

Benfica e Jacarecanga resistem às mudanças



Antigo Cartão Postal do bairro Benfica no início do Seculo XX.
Crédito: Carlos Augusto Rocha Cruz

Muitos bairros da cidade foram atingidos pela síndrome da mudança de nome, mas alguns deles, os mais tradicionais, permaneceram com a mesma nomenclatura ao longo dos anos, em uma demonstração de resistência simbólica. O Benfica e o Jacarecanga são exemplos de permanência. Bairros residenciais, durante muito tempo foram habitados pela classe dominante da Capital. No Jacarecanga, as chácaras e palacetes das famílias abastadas eram edificadas a partir das tendências arquitetônicas européias. Um dos exemplos disso, era a casa do intelectual Thomaz Pompeu Sobrinho, inspirada na arquitetura italiana. No entanto, a partir de 1930, com a chegada das fábricas ao bairro, essas famílias se mudaram para o lado leste da cidade e o Jacarecanga entrou em decadência. Apesar da impiedade do tempo, ainda é possível encontrar prédios que mantêm a estrutura original e relembram o tempo de opulência do bairro. Já o Benfica, corredor cultural que abriga o Campus de Humanidades da UFC, ainda guarda o tom residencial e tem como principal ícone de seus tempos áureos o prédio que hoje abriga a Reitoria da UFC, a mansão que pertenceu à família Gentil.



Bairro do Jacarecanga em 1972

Planejamento urbano

No século XIX, o Centro era o núcleo comercial e habitacional da cidade. Com o passar do tempo, ele começou a inchar e as pessoas a buscar outros espaços com maior qualidade de vida. A população, então, migrou para os sítios e áreas mais distantes em que encontravam atrativos como vegetação, mas também vias e um mínimo de infra-estrutura.

Nas décadas de 1920 a 1950, surge o fenômeno das unidades de vizinhança, que eram círculos urbanos vizinhos ao Centro. A expansão dessas áreas acaba gerando o conceito de polarização, que corresponde ao crescimento de uma unidade em relação a outra.



Bairro do Centro no início dos anos 60

Na década de 1960, observamos o desenvolvimento das policentralidades , quando o Centro não é mais o coração da cidade e as unidades de vizinhança ficam independentes. Em Fortaleza, esse processo está associado à facilidade de transporte e à mobilidade da população.

Com a policentralidade, cada bairro passa a ter uso e atrativo diferentes para a população. O planejamento urbano tem o papel exatamente de gerir esse crescimento dos bairros. O planejamento tem que zelar para que os bairros cresçam de uma forma homogênea.

Se essas ferramentas de controle urbano não forem eficazes, os bairros acabam crescendo de forma desordenada e ganhando grandes proporções.

A policentralidade é um fenômeno natural que ocorre com intensidade nos países em desenvolvimento, onde o planejamento urbano é complexo. Temos que ter noção de que o planejamento e ordenamento da cidade não é uma responsabilidade apenas do poder público, mas também da sociedade civil, afinal, somos todos agentes desse espaço urbano.


Naiana Rodrigues


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Crédito: Diário do Nordeste

terça-feira, 15 de dezembro de 2015

A beleza do Mercado dos Pinhões



A beleza dos detalhes do Mercado dos Pinhões, os adornos de sua fachada, a delicadeza dos ferros que suportam as lâminas de vidro colorido, em rosa e amarelo, a leveza das colunas e recortes, a semelhança mantida com uma pequena gaiola de pássaros raros, que houvesse pousado, inesperadamente, em meio a casas e comércio, tudo isso é que deve ter conseguido o milagre de harmonizar as amenidades e o trabalho, a arte e a realidade, o feijão e o sonho – permitindo ao Mercado conservar-se mais vivo do que nunca. (LEAL, 2012, p. 53).

A pedra fundamental do antigo Mercado da Carne de Fortaleza, que deu origem ao atual Mercado dos Pinhões, foi lançada no dia 18 de abril de 1896. Exatamente um ano depois, no dia 18 de abril de 1897, o mercado público foi inaugurado e entregue à população da capital cearense. 

Antigo Mercado da Carne em 1913. Acervo Nilson Cruz

Ao lado - Jornal O Figarino de 26 de janeiro de 1896

Construído em ferro, com estruturas pré-fabricadas na França – especificamente nas oficinas Guillot Pelletier, em Orleans – tinha 40 m de comprimento de cada lado e uma área de 1.600 metros quadrados, com 48 colunas internas e 44 externas, que apoiavam sua cobertura de zinco. Tinha uma altura máxima de 12 m e dispunha de seis para-raios para proteção contra descargas elétricas sobre suas 210 toneladas de estruturas metálicas. A obra foi realizada na gestão de Guilherme César da Rocha, intendente municipal de Fortaleza, sob a direção do engenheiro Antonio Teodorico da Costa Filho e a administração do artista Manoel de Vila Nova.

Característica do século XIX, a técnica de pré-fabricação de estruturas de ferro, desenvolvida principalmente na Inglaterra e na França, trazia a vantagem da portabilidade, além da construção de edifícios mais leves. As estruturas do Mercado da Carne de Fortaleza quando chegaram da França estavam numeradas uma a uma e acompanhadas de uma maquete de madeira, com o objetivo de facilitar o trabalho de montagem.

Mercado na Praça Carolina (Valdemar Falcão). Acervo Caroline Gurgel

Localizado na então Praça José de Alencar (anteriormente Praça Carolina e hoje Waldemar Falcão), o prédio do Mercado era dividido em três grandes seções, uma central, com 5 m de largura por 40 m de comprimento, e outras duas iguais, com aproximadamente 700 metros quadrados cada, destinadas ao comércio de carnes, linguiças, vísceras e peixes. Uma dessas seções, com 700 metros quadrados, deu origem 41 anos depois, ao Mercado dos Pinhões.

Além de servir de entrada geral, o vão central também era o local para a venda de verduras e hortaliças. O edifício, com oito entradas, três em cada uma das frentes e duas nas laterais, foi dotado de condições satisfatórias para a higiene pública da época.


A arquitetura do prédio, com grandes espaços abertos para a entrada da luz natural e de ventilação, era adequada à temperatura dos trópicos.
Ao lado - Jornal O Figarino de 8 de junho de 1896

No seu entorno, como mostram as fotografias e cartões postais de então, floresciam vendedores ambulantes e pequenos comerciantes, tonando-se também um ponto de encontro na cidade.

Apesar do impacto positivo que causou a construção do Mercado da Carne, depois de apenas onze anos, em 1908, a imprensa cearense já denunciava a sua degradação e decadência, fruto de descaso administrativo.


O Mercado de ferro antes do desmonte

Em 1937, na gestão do prefeito Raimundo Alencar de Araripe, foi assinado um decreto autorizando o seu desmonte. Suas antigas estruturas de ferro foram desmontadas e guardadas em depósitos da administração municipal.

Um ano depois, em 1938, o antigo Mercado da Carne transformou-se em dois mercados distintos: um dos seus antigos pavilhões foi para a Praça São Sebastião, mudando-se depois para o bairro Aerolândia, e o outro seguiu para o bairro da Aldeota, situado no lado leste da cidade, dando origem ao hoje conhecido Mercado dos Pinhões.

Jornal A Esquerda de 1928

Foi inaugurado oficialmente no dia 12 de julho de 1938, na Praça Visconde de Pelotas, entre as ruas Gonçalves Ledo e Nogueira Acioly, conhecida popularmente como Praça dos Pinhões, devido a grande quantidade de pinheiros existentes no local.

Em dezembro de 1998, por meio de um convênio entre a Prefeitura de Fortaleza, o extinto Instituto de Planejamento Municipal e a Embratur, começaram as obras de recuperação da estrutura do Mercado, ampliando posteriormente seu uso para fins culturais e turísticos.

A partir de 11 de janeiro de 2006, tornou-se um bem cultural da cidade, sendo tombado pela Prefeitura Municipal de Fortaleza, através do Decreto nº 11.962.

Foto: Jarbas Oliveira

Foto: Ricardo Freire

Atualmente, reformado, preservado e administrado pela Prefeitura, o Mercado dos Pinhões é um local de difusão e valorização da cultura regional.

Do lado de dentro oferece gratuitamente diversas apresentações artísticas e culturais, palestras, oficinas, exposições, feiras de artesanato, desfiles de moda, entre outros eventos, sendo uma opção de lazer para a população e os turistas.

Foto: Ricardo Freire

Na sua parte externa, voltada para a Rua Nogueira Acioly, toda sexta-feira é realizada uma feira, onde é possível comprar frutas, legumes, verduras e produtos apreciados pela culinária regional, como o queijo do sertão, o mel de abelha, ovos de galinha caipira, feijão verde...



Fonte: GASPAR, Lúcia. Mercado dos Pinhões, Fortaleza, CE. Pesquisa Escolar Online, Fundação Joaquim Nabuco, Recife. / Biblioteca Pública

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