Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga
Fortaleza, uma cidade em TrAnSfOrMaÇãO!!!


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quinta-feira, 16 de agosto de 2012

A parceria entre Severiano Ribeiro e Alfredo Salgado - Parte II


Em dois de julho de 1911, foi inaugurada a sala do Cine-Theatro Polytheama. Pertencia ao supracitado José de Oliveira Rola (foto ao lado) e a seu irmão Joaquim de Oliveira Rola, ambos proprietários da Empresa Rola & Irmãos. No ano de 1922, o Cine-Theatro Polytheama é adquirido por Luiz Severiano Ribeiro, tornando-se apenas sala de cinema. No dia vinte de novembro de 1938, esta sala deixa de funcionar, para que com a sua demolição e de prédios vizinhos fosse construído o Cine São Luiz(¹), que veio a ser inaugurado em 1958.

Um dos mais audaciosos concorrentes de Luiz Severiano Ribeiro chamava-se  Henrique Mesiano. Nascido a 15 de março de 1887, Henrique Mesiano era filho de italianos e entrou no ramo de exibição cinematográfica no ano de 1912, ao assumir o Cine Rio Branco, que era de propriedade da extinta Empresa Muratori & Cia”, da qual fazia parte. 

Com o truste(²) de 1916, Henrique Mesiano tem de fechar o 
Cine Rio Branco, voltando à atividade em 1917, quando, além da reabertura desta sala, mais duas, de sua propriedade, são inauguradas, o Cinema da Estação e o Cine Tiro Cearense, que, apesar da iniciativa empreendedora de Henrique Mesiano, duram pouco tempo. O Cine Rio Branco é fechado em 21 de fevereiro de 1919, por meio de um contrato. 


Henrique Mesiano

Luiz Severiano Ribeiro consolidava-se como um poderoso concorrente. O contrato firmado com Henrique Mesiano afastava-o  por dez anos da atividade cinematográfica, em troca de uma renda fixa mensal.(³)
  
Com os Cines Riche, Polytheama e Majestic-Palace, Luiz Severiano Ribeiro irá consolidar em Fortaleza seus empreendimentos na área cinematográfica. Os seus concorrentes foram superados por meio de contratos de fechamento, foi assim com a família Júlio Pinto, com José de Oliveira Rola e com Henrique Mesiano

Cine Moderno em 1937

Na década de 1920, o Cine Riche é fechado em 11 de novembro de 1921 e o Cine Moderno é inaugurado em 7 de setembro de 1921 (O Cine Riche é fechado com a inauguração do Cine Moderno pois este era melhor estruturado). Além disso, a 19 de março de 1922, ocorre a reinauguração do Polytheama.
Com os Cines Majestic-Palace, Moderno e Polytheama, de propriedade de Severiano Ribeiro, só restavam alguns cinemas ligados à associações religiosas e leigas. Dos cinemas pioneiros, os que permaneceram nos anos de 1920 foram os seguintes: o Cine Polytheama, adquirido em 1922 por Luiz Severiano Ribeiro; o Cine São José, do Circulo de Operários e Trabalhadores Católicos e o Cine - Theatro Majestic Palace. 
Nesta década, dos cinemas que foram inaugurados, apenas o Cine Moderno e o Cine Polytheama (reinaugurado) eram de propriedade de Severiano Ribeiro. No entanto, os demais cinemas recebiam os filmes de uma única empresa distribuidora, exatamente a de 
Luiz Severiano Ribeiro. Os anos de 1920 são a década de Luiz Severiano Ribeiro, decênio em que este monopoliza a distribuição dos filmes em Fortaleza. Se, por um lado, ele havia eliminado os concorrentes do centro, como Júlio Pinto, José de Oliveira Rola e Henrique Mesiano, por outro lado, se beneficiava com a existência dos cinemas mantidos por associações religiosas e os de bairro(4), pois estes adquiriam os rolos de filme diretamente de sua empresa.

Com a Primeira Guerra Mundial, o mercado cinematográfico exibidor e distribuidor brasileiro irá sofrer grandes mudanças. É justamente neste momento que Severiano Ribeiro passa a atuar na atividade cinematográfica com domínio na distribuição de filmes. O cinema europeu, em virtude da guerra, entrou em decadência com a redução do seu mercado externo. Tal situação favoreceu a ascensão da indústria cinematográfica norte-americana. No Brasil, em 1915, são instaladas subsidiárias da Universal e da Fox. No ano seguinte, a Paramount abre uma filial no Rio de Janeiro e posteriormente a MGM, a United e a First Nacional também marcam presença no mercado brasileiro. Aproveitando-se da dificuldade de exportação no mercado europeu, as produtoras/distribuidoras dos Estados Unidos passaram a trazer os melhores filmes europeus, comprometendo, desse modo, a atuação dos produtores e importadores brasileiros que adquiriam os filmes diretamente no 
mercado europeu antes da guerra, sem a presença de intermediários. As distribuidoras norte-americanas inovaram também nas técnicas de distribuição cinematográfica ao 
utilizar, por exemplo, o recurso da “linha de exibição”, que consistia em um filme dessas distribuidoras seguir uma linha de salas de exibição com o seu lançamento sendo realizado exclusivamente em uma única sala, preferencialmente a que possuísse ingressos mais caros.

Na capital cearense, sendo a Empresa Luiz Severiano Ribeiro a única distribuidora cinematográfica local, o método da “linha de exibição” realizado pelas distribuidoras norte-americanas passa a ser adotado nos cinemas de Fortaleza. Se pautando na relação centro – periferia, capital – interior, utilizada na forma de distribuição feita pelas distribuidoras dos Estados Unidos, a Empresa Luiz Severiano Ribeiro definiu os cines Majestic e Moderno como as salas “lançadoras” da cidade. Desta feita, somente após o lançamento dos grandes filmes nestas duas salas, estes poderiam ser exibidos nas demais. 
Antes do monopólio de Severiano Ribeiro, vários grupos faziam a distribuição, como por exemplo, a firma J.R.Staffa, do Rio de Janeiro, que distribuía as fitas para o Cinema Júlio Pinto. No Cine Rio Branco, Henrique Mesiano mantinha contrato de exclusividade com a dinamarquesa Nordisk Film e a francesa Pathé Fréres. O Cine - Theatro Polytheama, quando de propriedade da Empresa Rola & Irmão, possuía contrato com as produtoras norte-americanas. Tal contrato foi feito no ano de 1912 com a firma Angelino Staurile & Ca., do Rio de Janeiro, e possibilitava que a Empresa Rola & Irmão fosse a única no Estado do Ceará a receber as fitas das fábricas Vitagraph e Biograph,  dos Estados Unidos. Em 1913, chega à Fortaleza a Companhia Cinematographica Brasileira que possuía sede na cidade de São Paulo e um capital de 4.000.000$000 (quatro milhões de réis). A citada empresa, criada em 1911 e pertencente a Francisco Serrador, veio para fazer contratos com os proprietários das salas de exibição cinematográfica locais, visando realizar lançamentos simultâneos de grandes filmes. No Cine Rio Branco, por exemplo, foi  exibido o filme italiano Quo Vadis?, enquanto nos cinemas Júlio Pinto e Polytheama foi apresentado o 
também italiano Branco contra Negro.
O próprio Severiano Ribeiro, quando ainda não era um grande exibidor cinematográfico e detentor do monopólio distribuidor, recorria à firmas distribuidoras como a J. R. Staffa, detentora do filme exibido na inauguração do Cine Riche, em 23 de dezembro de 1915(5).

Cine Polytheama e Majestic ao lado da Praça do Ferreira
  
No período de 1905 à 1915, temos no Brasil a presença do representante exclusivo de empresas brasileiras ou os representantes das produtoras – distribuidoras estrangeiras já citadas. Estes homens eram imigrantes europeus como Paschoal Segreto, Francisco Serrador e Jacomo Staffa, responsáveis pela importação tanto de películas quanto de equipamentos cinematográficos. Com o término da Primeira Guerra Mundial, a importação de produtos procedentes da Europa ficou comprometida, possibilitando a ocupação do mercado cinematográfico brasileiro pelas produtoras e distribuidoras norte - americanas. 
O mencionado Jacomo Staffa chegou a comprar com os próprios recursos financeiros filmes estrangeiros em Paris. Posteriormente, ele adquire o direito de exclusividade na revenda dos filmes das produtoras Itália e Film D’art. Além disso, em 1910, ele obtém a exclusividade com a produtora dinamarquesa Nordisk, que era uma das mais importantes empresas cinematográficas deste período quando a supremacia norte-americana ainda não era tão intensa. Este exibidor se fez presente em várias cidades brasileiras, com escritórios em São Paulo, Porto Alegre e Recife, chegando a estabelecer em Nova York e em Paris 
escritórios para aquisição de fitas.

Interior do Cine Majestic Palace

Quando Jacomo R. Staffa falece, Luiz Severiano Ribeiro estava expandindo sua atuação no mercado 
cinematográfico do Rio de Janeiro. Na década de 1920, Severiano Ribeiro comanda o mercado exibidor e 
distribuidor cinematográfico local e parte para outras cidades, com destaque para o Rio de Janeiro, a 
Capital Federal. Nesta década, os grupos distribuidores, como o de J. R. Staffa, são substituídos por um 
distribuidor exclusivo em Fortaleza, a Empresa Luiz Severiano Ribeiro. 

Ao se mudar para o Rio de Janeiro, em 1926, ele conseguiu ratificar o monopólio distribuidor local. 
Como a capital federal tinha em Francisco Serrador, o artífice da Cinelândia,  o 
grande monopolizador dos cinemas de qualidade, atuando de forma autônoma e 
independente, Luiz Severiano Ribeiro ganha pouco a pouco credibilidade e 

ingressa na associação da Metro-Goldwyn, First National e Empresas 
Cinematográficas Reunidas, criando em 1926 uma nova e poderosa frente para a 
distribuição de filmes no Brasil. Batalhador tenaz, estabelece-se a seguir como 
agente locador de películas trazidas ao Brasil pela Agência Paramount (que 
representava à época a Metro – Goldwyn e a First National) e a Cinematográfica 
Brasileira. É um dos fundadores, em 1926, da sociedade cooperativa de 
exibidores denominada “Circuito Nacional de Exibidores”. No mesmo ano, 
estabelece um acordo com as firmas exibidoras Ponce, Pontes & Cia. e Noriz  & 
Frota, tornando-se a seguir único proprietário do circuito a elas pertencentes. Já 
era então reconhecido pelo controle dos cinemas do Norte do Brasil, quando em 
agosto de 1926, adquiriu no Rio o controle acionário de inúmeros cinemas, 
dentre eles, o Atlântico e Ideal, e fazia sociedade com o Íris, de J. Cruz, Jr


A aposta na distribuição como importante elemento impulsionador do desenvolvimento e êxito da 
atividade cinematográfica foi priorizada também por Severiano Ribeiro. Na capital cearense, nos anos de 
1920, ele exerceu o domínio na distribuição, ampliando tal prática para outras cidades do Brasil até tornar-se um dos maiores nomes do cinema brasileiro, concentrando suas atividades na cidade do Rio de Janeiro, 
de onde comandava seus negócios. 

Por meio de acordos com empresas estrangeiras, em especial norte-americanas, Severiano Ribeiro adquiria 
o direito de exibir filmes destas produtoras. Ao pagar aos fornecedores norte-americanos, ele obtinha 
exclusividade de exibição, possibilitando que os filmes fossem lançados no Cine-Theatro Majestic 
Palace, no Cine Moderno e no Cine Polytheama, para posteriormente serem exibidos nos outros cinemas, 
no caso, os de bairro e os ligados à associações religiosas.  Quanto mais salas de exibição cinematográfica 
tivessem nos bairros e no interior do Estado, melhor para Severiano Ribeiro, pois ele estava aumentado 
seus rendimentos e ampliando seu domínio sobre o mercado cinematográfico. Tal tática era utilizada tanto 
no mercado local quanto em outras cidades do Brasil. 



Barrinhas e Divisórias

¹ A demora no término da construção do Cine São Luiz fez com que a população o incluísse nas “sinfonias inacabadas” de Fortaleza, no caso, as obras do Porto do Mucuripe (1938-1951) e a construção da Catedral (1939-1982). 

² Com relação ao truste de 1916, temos poucas informações. Mas ao que parece foi uma forma de Severiano Ribeiro centralizar em suas mãos gradativamente o controle da exibição cinematográfica local.  Algumas salas ficaram fechadas como foi o caso do Cine Rio Branco, recebendo uma parte do lucro obtido pelas salas em funcionamento. Os cinemas que permaneceram funcionando foram o Polytheama de José Rola e o Riche de Severiano Ribeiro. Para maiores informações ver: LEITE, Ary Bezerra. Op. Cit., pp. 282-285. De acordo com o Mini Aurélio Século XXI, truste se define por “ acordo ou combinação entre empresas, em geral com o objetivo de restringir a concorrência e 
controlar os preços”. 


³ Na década de 1930, Henrique Mesiano voltou à atividade de exibição cinematográfica na capital cearense, após ter ficado toda a década de 1920 impedido de exibir filmes devido ao contrato firmado com Severiano Ribeiro. Não possuindo mais sua própria sala de exibição cinematográfica, Henrique Mesiano chegou a utilizar o Teatro José de Alencar: “Cinema no Theatro José de Alencar - O conhecido cinematografista Sr. Henrique Mesiano acaba de obter mediante aluguel o Theatro José de Alencar e ali exibirá o grandioso filme ‘Itália’, película natural sobre a vida italiana, suas cidades, panoramas e monumentos. Aguardemos com ansiedade o enunciado filme que certamente fará sucesso em Fortaleza.” O Povo, 28 de janeiro de 1932.

4 Foram inaugurados neste período, além do Cine Moderno, os seguintes cinemas: Cine-Theatro Pio Xem 1922; o Cine Beira Mar, em 1924; o Cine -Theatro Centro Artístico Cearense, em 1926; o Cinema União de Moços Católicos, em 1927; o Cine Grêmio Dramático Familiar, em 1928; o Recreio-Iracema também denominado Cine Recreio, no ano de 1928; o Cinema Paroquial, em 1930; o Cine Merceeiros e o Cine Phenix, ambos em 1930.

O filme exibido na inauguração do Cine Riche foi 'O jockey da Morte', da Vay – Film, de Milão,com argumento, direção e interpretação de Alfred Lind.

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Fonte: Nas telas da cidade: salas de cinema e vida urbana 
na Fortaleza dos anos de 1920 - Márcio Inácio da Silva  e Arquivo Nirez

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

A parceria entre Severiano Ribeiro e Alfredo Salgado



O ingresso de Severiano Ribeiro na área da exibição cinematográfica ocorreu com a inauguração do Cine Riche, no dia 23 de dezembro de 1915. Este cinema estava localizado justamente onde, em 1908, Victor 
DiMaio havia instalado a primeira sala de exibição cinematográfica de Fortaleza, o Cine DiMaio. O sócio de Luiz Severiano Ribeiro era Alfredo Salgado, empresário e homem de negócios, que mais tarde irá 
investir no Cine - Theatro Majestic Palace
Alfredo Salgado foi um importante nome na luta pela abolição da escravatura. Nascido em Fortaleza, no 
dia 1º de setembro de 1855, era filho de Francisco Luís Salgado e Virgínia da Rocha Salgado. Aos 
quatorze anos de idade, vai estudar na Inglaterra, graduando-se em Comércio. Alfredo Salgado trabalhou na Casa Inglesa, uma filial cearense da firma Singlehurst & Cia., de Liverpool. Durante muitos anos foi intérprete no comércio local dos idiomas alemão, francês e inglês, sendo respeitado em seu meio social. 
Alfredo Salgado foi membro da Sociedade Perseverança e Porvir, dedicada à luta pela Abolição da Escravatura e transformada posteriormente na Sociedade Cearense Libertadora.  


Ele compartilhava suas idéias abolicionistas no Clube Iracema, cuja inauguração ocorreu em 1884, ano da Abolição da Escravidão no Ceará. Este clube era “...muito mais que um mero espaço para diversões refinadas, pois logo se transformou em um núcleo irradiador de expressivos movimentos sócio - políticos e círculos de saber em Fortaleza no final do século passado”. (Sebastião Rogério Ponte)

Transitando nestes espaços de lazer e fazendo parte da elite comercial da cidade, Alfredo Salgado era respeitado em seu meio social além de ser uma das figuras mais destacadas da cidade. Como ressalta o historiador Raimundo Girão, o cearense Alfredo Salgado era “Finamente educado, cavalheiroso, sempre brumelicamente trajado, mesmo durante 
a velhice, gozou de grande relevo social, e no seio das classes comerciais manteve-se como figura de alto acatamento “.


A presença de Alfredo Salgado, como investidor na área de cinema, mostra uma mudança em relação aos primeiros exibidores no país –estrangeiros, como por exemplo, os italianos Vitor DiMaio e Paschoal Segreto. Estes exibidores de outrora geralmente eram homens de posses medianas e ligados ao ramo da 
diversão. 
Vitor DiMaio, na condição de exibidor ambulante, esteve em várias cidades brasileiras e também chegou a instalar salas fixas de cinema, como foi o caso do já referido Cine DiMaio. Este pioneiro, nascido em Nápoles, a 14 de abril de 1852, dedicou-se ao cinema por toda vida chegando à velhice pobre e doente, vindo a falecer no dia 21 de abril de 1926, em Fortaleza, no Café Art – Nouveau, no mesmo prédio onde havia instalado o Cine DiMaio
Paschoal Segreto, imigrante pobre vindo da Itália, foi o primeiro grande empresário voltado para o entretenimento no Brasil. Junto com seu irmão Gaetano, chega ao Brasil em 1883, iniciando uma trajetória de bastante sucesso no ramo das diversões. Pioneiro, funda a primeira empresa de porte e de nome nacional do setor, a mitológica EMPRESA PASCHOAL SEGRETO, que Paschoal nunca formalizou e só foi registrada depois de sua morte. Paschoal observa o sucesso das exibições irregulares do cinematográfico realizadas no Rio e mesmo com a instabilidade da energia por vezes prejudicando a nitidez das sessões, resolve investir no negócio. Em 31 de julho de 1897, em sociedade com Cunha Salesfunda na privilegiada rua do Ouvidor o SALÃO DE NOVIDADES PARIS NO RIO, a primeira sala “fixa” de exibição cinematográfica do país. Com o extraordinário sucesso de público do SALÃO, o cinema seria a menina dos olhos de Paschoal, investimento no qual apostaria antes que qualquer outro aqui. Também com o cinema ficaria conhecido e daria uma nova dimensão a seus negócios. Duplamente pioneiro, além de importar fitas para a programação 
regular da sala, manda seu irmão Afonso para o exterior comprar e aprender a manejar um equipamento cinematográfico. Em agosto de 1898, um incêndio destrói por completo o SALÃO DE NOVIDADES PARIS NO RIO, assim como o resto, os dois outros andares onde os Segreto guardavam equipamentos e estoques e moravam. No entanto, o prédio estava no seguro, e, depois de contestado, Paschoal é pago e, em janeiro de 1889, reabre o cinematógrafo, já sem a parceria de Cunha Sales, que leva seus negócios para Petrópolis, onde era menos notório.


Afonso Segreto junto aos primeiros projetores 

Estando ligado ao ramo da diversão, Paschoal Segreto era um tipo de exibidor cinematográfico característico deste período inicial do cinema. A Empresa Paschoal Segreto marcou presença na capital cearense no ano de 1904 em uma breve temporada de 26 de novembro a 11 de dezembro.¹
Com relação a Alfredo Salgado, ele fazia parte daquela classe média que havia ascendido como elite na virada do século XIX para o XX. Por qual motivo ele investiu em cinema? O que significa sua inserção na atividade cinematográfica em parceria com Severiano Ribeiro? O fato do cinema ser um capital novo que passava a circular na cidade e as mudanças ocorridas com o cinema no âmbito mundial podem nos ajudar a entender a presença de Alfredo Salgado como sócio investidor de Luiz Severiano Ribeiro


Quando em 1915, Alfredo Salgado fez parceria com Severiano Ribeiro na criação do Cine Riche, buscava obter lucro com a atividade cinematográfica em um momento onde estavam ocorrendo mudanças significativas nas práticas de exibição cinematográfica em termos mundiais. À partir deste ano, a indústria cinematográfica visava atingir um público consumidor burguês, isto é, um público distinto daquele de outrora quando o cinema era um divertimento barato e voltado para o público masculino. 


O Cine Riche funcionava no mesmo prédio onde antes esteve o 
Café Riche, na Guilherme Rocha, ao lado da Praça do Ferreira

As mudanças nas práticas de exibição visavam atender a um público elitizado, abonado financeiramente, que passava a ter no cinema um elemento de diferenciação social. Vale ressaltar que a presença do público feminino passa a ser valorizada com a feitura de produções cinematográficas voltadas para as mulheres. O cinema mudou seu formato de exibição, deixando de ser uma simples curiosidade popular para atrair um novo público “...com as possibilidades narrativas abertas pela linguagem cinematográfica a atividade 
tende a se dignificar através das novas histórias que passa a contar, atraindo o público burguês, o que demanda mudanças nas práticas de exibição.” (SCHVARZMAN, Sheila. Op. Cit., p. 154)

Em Fortaleza, a elite composta por médicos, advogados, jornalistas, professores e sobretudo comerciantes, era o grupo social que passava a ter no cinema um lugar de distinção social. Certamente visando lucrar com este novo público consumidor e possuidor de capital, tendo a frente a elite comercial,  é que Alfredo Salgado, que já era um grande comerciante, passa a negociar com Luiz Severiano Ribeiro. Assim sendo, Alfredo Salgado investia nas salas de cinema, enquanto Severiano Ribeiro ficava responsável pela gestão do empreendimento. 



Apostando nesse novo público, em 1915, com o Cine Riche e, em 1917, com o Cine Theatro Majestic Palace, Alfredo Salgado e Severiano Ribeiro fizeram uma parceria que favoreceu a consolidação deste último como grande nome da atividade cinematográfica. Ao se aliar a Alfredo Salgado, Luiz Severiano Ribeiro fazia parceria com uma importante figura da sociedade cearense, o que lhe dava mais credibilidade e inserção neste grupo social influente da cidade. 
Ao entrar na atividade de exibição cinematográfica, Luiz Severiano Ribeiro não se contentou em ser apenas mais um proprietário de sala de exibição cinematográfica, ele queria ser o principal. E conseguiu, obtendo além disso, o monopólio na distribuição dos filmes.


Com relação aos seus concorrentes, Severiano Ribeiro adotou como prática pagar mensalmente para que estes mantivessem seus cinemas fechados. Os contratos de fechamento eram pelo prazo de dez anos. Os exibidores Júlio Pinto, José de Oliveira Rola e Henrique Mesiano eram os concorrentes que aos poucos foram sendo superados por Luiz Severiano Ribeiro. 
Júlio Pinto nasceu em Icó, no interior do Ceará, e era membro de uma tradicional família ligada à política cearense. A área de atuação de Júlio Pinto era o comércio e a indústria, sendo ele, um respeitável nome da sociedade de Fortaleza atuando do final do século XIX até o início do século XX, quando veio a falecer. O seu ingresso na atividade cinematográfica ocorreu com o patrocínio do Cassino Cearense, que pertencia a Empresa Carvalho & Cia, cuja instalação ocorreu em 1º de junho de 1909, com a utilização do equipamento “Stereopticon” Após a temporada do Stereopticon, logo a seguir, no dia 18 de setembro de 
1909, é definitivamente inaugurado o Cinema Júlio Pinto, cuja divulgação publicitária alterna-se com a denominação de Cassino Cearense. Ao ato inaugural tinha-se o prestígio da presença do Presidente Dr. Nogueira Aciolyautoridades do Estado.


A presença do político Antônio Pinto Nogueira Acioly na inauguração do Cinema Júlio Pinto é motivada pelos vínculos familiares que uniam o Presidente do Estado, Nogueira Acioly, e o exibidor cinematográfico, Júlio Pinto (foto ao lado). Além disso, em todo o Brasil era comum a presença de autoridades nas sessões inaugurais dos mais conceituados cinemas das capitais brasileiras.


Em 1916, com a morte de Júlio Pinto e a forte presença de Luiz Severiano Ribeiro na atividade cinematográfica, o Cine Júlio Pinto declina sendo fechado no início de 1920. 
José de Oliveira Rola, proprietário do Cine-Theatro Polytheama, foi outro concorrente de Luiz Severiano Ribeiro antes da década de 1920. Nascido no município de Trairí, no interior cearense, este exibidor 
cinematográfico era um comerciante que atuava sobretudo nos empreendimentos ligados ao lazer, como 
foi o caso da Maison Art-Nouveau
A José Rola a cidade deve, no início do século, um dos seus mais distintos estabelecimentos: a Maison Art-Nouveau, que instala com o genro Fiuza Pequeno, um misto de restaurante e café, ponto obrigatório de reunião da juventude, e que também abrigaria o primeiro cinema fixo de Fortaleza, o Cinema DiMaio.


Maison Art-Nouveau na Rua Major Facundo em 1904

¹LEITE, Ary Bezerra. Op. Cit.., p.99-101: Apenas o nome de Afonso Segreto é mencionado nos anúncios, ao passo que não é possível afirmar se Paschoal Segreto também esteve em Fortaleza. A área de atuação de Paschoal Segreto era a cidade do Rio de Janeiro, logo ele não foi um exibidor fixo cearense.

Continua...
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Fonte: Nas telas da cidade: salas de cinema e vida urbana 
na Fortaleza dos anos de 1920 - Márcio Inácio da Silva  e Arquivo Nirez

sábado, 11 de agosto de 2012

Severiano Ribeiro: o início de sua vitoriosa trajetória comercial



No dia sete de setembro de 1921, era inaugurado na Praça do Ferreira, o mais novo cinema de Fortaleza, o Cine Moderno¹, pertencente à Empresa Luiz Severiano Ribeiro. A década de 1920 iniciava com mais uma sala de exibição cinematográfica e o que aparentemente poderia ser apenas mais uma inauguração, era, na verdade, a “consolidação” de uma nova etapa do cinema na capital cearense.

Neste decênio, a figura de Severiano Ribeiro se “consolida” como a do mais importante proprietário de salas de exibição cinematográfica em Fortaleza e único distribuidor cinematográfico local. A cidade passava a conviver com uma nova realidade no que concerne à presença das salas de cinema.

Do final do século XIX até o início do século XX, a cidade de Fortaleza convivia com a presença de exibidores ambulantes que rodavam pelo país com seus aparelhos de projeção cinematográfica. A primeira sala fixa seria inaugurada em 26 de agosto de 1908 pelo italiano Vitor DiMaio na Praça do Ferreira. Era o Teatro Art – Nouveau, também denominado Cinematógrafo Art-Nouveau, Cine DiMaio e, no ano seguinte, Cinematografo Cearense. O italiano Vitor DiMaio era um pioneiro na exibição cinematográfica
no Brasil. De 1908 até 1920, a atividade de exibição cinematográfica, na capital cearense, era realizada por diferentes exibidores que concorriam entre si. No decênio de 1920, este cenário modifica-se a partir da atuação de Severiano Ribeiro que, paulatinamente, havia minado seus principais concorrentes, tornando-se nesta década o principal exibidor cinematográfico local. Desde 1915, Luiz Severiano Ribeiro tem seu nome ligado ao ramo das exibições cinematográficas. No entanto, antes de sua inserção na área de exibição cinematográfica em Fortaleza, ele já era um importante comerciante local. 

Baturité, cidade natal de Severiano Ribeiro - Arquivo Nirez

Nascido em Baturité, cidade serrana do Ceará, no dia 3 de junho de 1885, era filho do médico Luiz Severiano Ribeiro, que integrou os serviços médicos na Guerra do Paraguai e de Maria Felícia Caracas Ribeiro.
Quando tinha por volta de dezenove anos de idade, ele se muda para Fortaleza. Em 1910, então com 26 anos de idade, casa-se com Alba Morais, com quem teve cinco filhos: Luiz Severiano Ribeiro Júnior, que seria o sucessor do pai nos negócios, Germana Ribeiro de Lamare, Lais Ribeiro Pinto, Iolanda Ribeiro Portela e Vera Severiano Ribeiro de Sóllis.
Quando Luiz Severiano Ribeiro vem residir em Fortaleza, ele depara-se com uma cidade que estava passando por transformações no âmbito comercial e econômico, iniciadas no final do século XIX:

A produção algodoeira cearense, intensificada a partir da década de 60 do século 
passado (XIX) e que tinha na Capital o principal centro coletor e distribuidor do 
produto, provocou um acúmulo de capital em Fortaleza, proporcionando a 
emergência de novos atores sociais de poder econômico na cidade.  
Estes novos grupos sociais emergentes eram formados por elementos ligados ao 
setor comercial, fortalecidos pelo crescimento dos negócios de importação e exportação, e por um amplo contingente de profissionais liberais, constituído de 
bacharéis, médicos, engenheiros, jornalistas, literatos, entre outros, provenientes 
das academias de ensino superior espalhadas pelo Brasil e até pelo exterior. Os 
profissionais egressos desses cursos comungavam dos ideais de “progresso, 
civilização e modernidade”, que grassavam pelos grandes centros europeus e 
que tinham ressonância, também, na capital cearense, sobretudo no final do 
século passado e primeiras décadas do século XX. (
SOUZA, Simone de et alii. A gestão da cidade: uma história político – administrativa. Fortaleza: Fundação cultural de Fortaleza,1994, p.26)

Neste período de transformações na virada de século do XIX para o XX, Fortaleza passa a ter um considerável crescimento industrial, como bem destaca o historiador Geraldo Nobre:
 
Em 1895, a capital cearense, ainda modesta, com população de menos de 50 mil habitantes, apresentava um parque industrial que, para as condições da época, se podia considerar apreciável. 
Eram os estabelecimentos mais importantes as fabricas de fiação e tecelagem de Pompeu & Irmãos, pioneira no ramo, e a de Holanda e Gurjão, ambas na rua Santa Isabel. No interior do Estado já se encontravam em funcionamento, produzindo fios e tecidos, a Popular Aracatiense e a Sobralense, respectivamente em Aracati e Sobral
Outro ramo de atividades industriais, que apresentava certo desenvolvimento na capital cearense, era o de bebidas, notadamente de vinho de caju, produzido pelas fábricas de Januário Jefferson de Araújo, Mamede & Irmão, Antero Teófilo, Joaquim Teófilo Rabelo e Rodolfo Teófilo
Para atender ao consumo diário da população, existiam, estabelecidas somente na capital, as moageiras de Roberto Ferreira Sampaio e Januário Irineuabastecidas de matéria-prima pelos cafeicultores da serra de Baturité, cuja decadência já se acentuara. 
Iniciara-se o aproveitamento das oleaginosas, por iniciativa de Alfredo Salgado, que representava uma tradição no comércio cearense fortalezense, e de Bernardino Proença, um dos principais empreendedores da época, estabelecido na cidade de Baturité. 
A fabricação de sabão contava em Fortaleza com dois estabelecimentos, os de P.A. Mota & Cia. e Bernardo Ferreira da Cruz, existindo outro, de  João Gomes de Matos, no Crato, e mais o de Clementino de Oliveira & Cia., em Pacatuba
O ramo de fundição concorria, em 1895, para as atividades de transformação, na capital cearense, com a fundição a vapor que montada, em 1868, pelos ingleses Spear e Marsden, fora transacionada em dezembro de 1891 com José Cândido Freire, que confiara a direção a Raimundo Soares Freire, antigo e experimentado mestre de estabelecimento. A oficina da Estrada de Ferro de Baturité igualmente fazia trabalhos da espécie, atendendo aos interessados.

Além destes empreendimentos locais, houve uma presença marcante de firmas estrangeiras que, no início de 1870, possuíam 40% dos estabelecimentos comerciais então existentes. A presença delas na capital cearense dinamizou o crescimento comercial de Fortaleza, destacando-se as casas exportadoras, dentre elas “A Exportadora Cearense”, a “Gradvhol & Filhos”, a “Boris Frères & Cia”, sendo esta última, uma das mais importantes e com grande prestigio junto aos poderes públicos. Entre outras colaborações com o Estado, consta que os Boris receberam dos governos cearenses as seguintes incumbências: presidência da comissão organizadora da mostra de produtos alencarinos na Exposição Internacional de Chicago (1892-1893), intermediação de diversos empréstimos contraídos junto a bancos europeus, agenciamento, na Escócia, de acordos para a compra de equipamentos metálicos para as obras do porto (1891) e do Theatro José de Alencar (1910). Além do mais, segundo o historiador Raimundo Girão, por mais 
de uma vez a Fazenda do Estado teve de recorrer a empréstimos financeiros da firma (operações de financiamento era uma atividade dos Boris, dela se servindo fazendeiros, pecuaristas, lojistas e usineiros) para cobrir déficits momentâneos dos cofres públicos.

A firma Boris Frères foi criada no ano de 1868 e possuía sede em Paris. Além da atividade comercial de exportação e importação, era detentora de fazendas agropecuárias, projetos de estrada de ferro, navegação e finanças, empréstimos feitos inclusive ao poder público. A figura de Luiz Severiano Ribeiro, surge neste período de crescimento comercial e investimentos estrangeiros na capital cearense.  
O perfil comercial de Luiz Severiano Ribeiro não era o mesmo dos grandes comerciantes da cidade, pois seu campo de atuação era bem diferente. Suas atividades comerciais não eram ligadas às indústrias nem às firmas importadoras / exportadoras. No entanto, este crescimento urbano e a formação de camadas médias favoreciam a inserção de suas atividades comerciais.

Majestic Palace do livro "Royal Briar - A Fortaleza dos anos 40", de Marciano Lopes.

A primeira oportunidade comercial foi sua sociedade com Antônio da Justa Menescal, em 1912, proprietário da Livraria Menescal. Em 1915, com recursos próprios, instala a Livraria Ribeiro, localizada à rua Major Facundo, nº 92, chegando a criar uma subsidiária de sua firma em Recife. Por essa época, diversifica seus negócios com o arrendamento ou criação de estabelecimentos diversos, como hotéis, dentre os quais o Majestic Palace e o Hotel de França, sucessor do velho Hotel De France, criado no século passado pelo francês Louis Dragaud; uma fábrica de gelo – à rua santa Isabel, 220; o Café Riche e a barbearia Maison Riche, ambos na Praça do Ferreira; o salão de bilhar no Majestic Palace; e outras iniciativas comerciais. Nessa linha de expansão é que se volta para o cinema. 
Provavelmente as livrarias atenderiam a demanda de uma elite cultural com formação em academias de ensino superior do Brasil e do exterior. Eram profissionais liberais, médicos, jornalistas, bacharéis e literatos que compunham uma elite letrada na cidade.  

A efervescência cultural na cidade era algo surgido no final do século XIX e que persistia no início do século XX. Os espaços de sociabilidade eram pontos de encontro e troca de idéias desses intelectuais, não se limitando a meros locais de lazer: As praças, as livrarias, as confeitarias, as bodegas, os salões das barbearias, os cafés constituem-se em lugares sociais de troca de informações, experiências, atualização do léxico político e onde as camaradagens vão definindo formas de intervenção na paisagem social. Não se veja esses espaços apenas como pontos de encontro ou de convívio fugaz.

Os hotéis e as outras atividades comerciais de Severiano Ribeiro se relacionam ao crescimento comercial da cidade, à circulação de dinheiro e à presença de um público consumidor novo. Seus empreendimentos visavam atender a estes consumidores.  
Em termos de rendimento, tais atividades comerciais talvez não fossem tão lucrativas se comparadas com as firmas exportadoras e importadoras. Certo é  que, quando ele entra na atividade cinematográfica, concentra neste setor seus empreendimentos. Cabe ressaltar que a exploração comercial de salas de cinema era um tipo de capital novo que passava à circular na cidade. O que teria motivado Luiz Severiano Ribeiro a ter entrado na atividade cinematográfica e investido nesta área? Seria o fato do cinema ser um capital novo ou teria outro motivo a mais? Ao que parece, ele não somente apostava na “novidade” que o cinema significava no início do século XX, mas sobretudo nas mudanças que ocorriam nas práticas de exibição cinematográfica que visavam atender um novo público agora elitizado. A construção de salas luxuosas e a feitura fílmica pautada em novos parâmetros estéticos 
são exemplos de mudanças que estavam ocorrendo nas práticas de exibição cinematográfica.²

No segundo decênio do século XX, Severiano Ribeiro atuava no ramo de livraria e papelaria, além das salas de cinema que seriam seu grande empreendimento comercial. Encontramos informações referentes a atuação comercial de Luiz Severiano Ribeiro na capital cearense, mediante um mapeamento feito ao longo dos anos de 1920: 

"Luiz Severiano Ribeiro
Livraria, e Papelaria –  Empreza de cinemas
Praça do Ferreira, 196. A 200 – “Livraria Ribeiro
Endereço Telegráphico – RIBEIRO
Caixa Postal – 37
Capital – 150:000$000
Data 1º de Abril 1921

ATIVIDADE COMERCIAL: Livraria e Papelaria Ribeiro 
LOCALIZAÇÃO: Rua Major Facundo, n. 154"
Hotel Majestic Palace, de Ribeiro & Cia 
Majestic Palace – Theatro – cinema
Moderno – cinema 
Polytheama – cinema
Todos localizados na Praça do Ferreira
Fábrica de Gelo - Rua Santa Isabel, 220

A atividade comercial de Severiano Ribeiro ficava concentrada na Praça do Ferreira e ruas próximas. Além da papelaria e livraria Ribeiro, havia ainda o Hotel Majestic Palace em cujo prédio também estava instalado o Cine-Theatro Majestic Palace (a sala de exibição ficava no térreo, sendo os andares superiores do prédio destinados à moradia). Na Praça do Ferreira também estavam localizados o Cine Modernoinaugurado em 1921, e o Cine Polytheama, adquirido em 1922, por Severiano Ribeiro. Todos os cinemas situados nesta praça na década de 1920 eram de propriedade dele. Já a fábrica de gelo ficava localizada à 
rua Santa Isabel (atualmente rua Princesa Isabel) no centro de Fortaleza. Luiz Severiano Ribeiro expandia seu poderio econômico à partir da Praça do Ferreira, principal logradouro da cidade.

¹O Cine Moderno foi uma das salas de exibição cinematográfica mais importantes de Fortaleza  
permanecendo em funcionamento até o ano de 1968. 

²A primeira sala de cinema pertencente a Severiano  Ribeiro foi o Cine Riche, inaugurado em 1915, quando ele possuía trinta anos de idade. 


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Fonte: Nas telas da cidade: salas de cinema e vida urbana 
na Fortaleza dos anos de 1920 - Márcio Inácio da Silva  e Arquivo Nirez

Conversando com Orson Welles


Orson Welles era um gênio. O mundo inteiro sabia disso, e ele também. E este gênio tem uma significação especial para muitos no Brasil, sobretudo por sua passagem pelo país nos anos 40.



A palavra "Gênio" não é fácil de empregar. Ela é tantas vezes utilizada que acaba perdendo o significado cabal, profundo que deveria ter. Ou então se aplica o termo de modo previsível demais. Einstein era um gênio, Bethoven era um gênio, e acaba-se ficando no campo das constatações banais. No cinema, ao falar de Orson Welles, só resta cair na banalidade também. Orson Welles era um gênio. O mundo inteiro sabia disso, e ele também. E este gênio tem uma significação especial para muitos no Brasil, sobretudo por sua passagem pelo país nos anos 40. Sua chegada foi tratada com reverência por políticos, artistas e até mesmo pelas pessoas que nada entendiam de cinema; só sabiam que se tratava de um Sr. Welles que, diziam, era dos bons. O Jornal O Povo, evidentemente, cuidou de retratar essa admiração- o quanto pôde. em 1942, quando Welles chegou a Fortaleza para filmar uma história de quatro jangadeiros, o jornal perseguiu e relatou todos os seus atos. Ali, todos sabiam reconhecer a importância daquele jovem presunçoso e...genial. Infelizmente, não houve, naquele período, uma entrevista de fato com o diretor de Cidadão Kane. Isso só veio a acontecer em fevereiro de 1972. Na verdade, com a reprodução de uma entrevista publicada numa revista norte-americana. Vale dizer que esse tipo de reprodução marcou boa parte da história do jornalismo cearense até meados dos anos 70. Não foi propriamente uma entrevista do O POVO, mas ela é válida por conter algumas das frases que virariam epígrafes famosas, e por registrar, nas páginas do jornal, as idéias de um cineasta que, na época, já havia muito esquecido por Hollywood. Mas que continuava e continua sendo lembrado pela imprensa e pelo público.
Num recente inquérito realizado entre críticos internacionais de cinema Cidadão Kane foi eleito o melhor filme realizado até hoje. Aqui para nós deve ter havido um pouco de exagero. De qualquer maneira, foi escrito, dirigido e produzido por Orson Welles que, aos 25 anos de idade, desempenhou bem o papel-título de um idoso magnata da imprensa. A entrevista que se lerá a seguir foi realizada por Kenneth Tynan e publicada na revista americana Diálogo, que é impressa no Brasil pela embaixada americana. Reputado autor teatral e conselheiro literário do Teatro Nacional da Grã-Bretanha, ele é cronista de cinema do The Observer e diretor de roteiros de um grande estúdio. A conversa delineia os principais traços de um homem legendário.
As artes cênicas contam com os serviços profissionais de Orson Welles desde de 1931, ano em que ele se apresentou no Gate Theater, em Dublin, anunciou-se como um reconhecido ator do New York Theather Guild e começou a desempenhar papéis títulos à idade de 16 anos. A margem seu capítulo no teatro e em seguida no rádio com sua famosa versão irradiada de A Guerra dos Mundos, a indústria cinematográfica foi a terceira a capitular. Nos últimos anos, Welles tem sido um elefante traquinas solto na maioria dos meios de expressão artística. Aparece em boa parte. No Marrocos, em Londres, Paris, na Espanha, na Iugoslávia ou Itália. Ganha dinheiro demais em certas ocasiões e também perde muito em outras. Uma de suas mais apresentadas entrevistas se deu no saguão de um hotel de Londres, da qual aqui vão algumas respostas.

O senhor é uma celebridade há 30 anos. Em todo esse período, qual a descrição mais exata já feita a seu respeito?

- Eu não quero que qualquer descrição de mim seja exata. Não que seja lisonjeira. Não acredito que pessoas gostem de ser descritas finalmente pelo menos, não na imprensa. Precisamos vender ingressos e por isso mesmo precisamos de boas notícias.

Na conversação particular qual foi a coisa mais agradável que ouviu dizer a seu respeito?

- (Franklin) Roosevelt dizer que eu teria sido um grande político. (Thomas) Skidmore dizer que (Charles) Chaplin e eu éramos os dois melhores seres vivos. Não quero dizer que acredito nessas coisas, o senhor usou a palavra ''agradável". O que realmente me agrada é a lisonja na periferia do meu trabalho - sobre o que não estou principal nem profissionalmente interessado. Quando um velho toureiro me diz que sou uma das poucas pessoas que entende de touros, ou quando um mágico diz que sou um bom mágico, isso me massageia o ego sem nada ter a ver com a bilheteria.


Entre todos os comentários escritos e falados, feitos a seu respeito qual o que lhe desagradou mais?

- Não me interessa o falado. Importam-se apenas o escrito. Eu preciso fazer um grande esforço para convencer-me de que algo realmente mal que leio a meu respeito não é verdadeiro. tenho um respeito primitivo pela palavra impressa quando ela se aplica a mim, especialmente se é negativa.

Chamam-lhe de gênio há bastante tempo.

- A palavra gênio foi a primeira que ouvi, quando ainda estava no berço. Assim, até chegar à meia-idade, nunca pensei que não fosse um gênio.


Numa era de especialização crescente o senhor se expressou em praticamente todos os meios artísticos. Não quis especializar-se? 


- Eu não posso imaginar-me limitando-me. É uma grande façanha o fato de vivermos numa época de especialistas e que os olhamos com respeito excessivo...Eu conheci um grande cinegrafista-Greg Toland (na foto do alto, com Welles), que fotografou Cidadão Kane. Ele me disse que podia ensinar-me a respeito da câmara em quatro horas.. e o fez. Não acho que o escadaliza seja tudo aquilo que a nossa imprensa diz que é.

Será possível hoje a alguém ser um homem de renascença...alguém igualmente à vontade nas artes e nas ciências?

- É possível e também necessário porque o grande problema que nos confronta hoje é o da síntese. precisamos reunir essas coisas dispersas e dar-lhes sentido. O pior tipo de arte é o vaguear por uma única rua. É melhor não apenas para o indivíduo, mas também para a sociedade, que cria horizontes pessoais. É preciso então que sejam tão amplos quanto possível. O que uma pessoa normalmente inteligente não pode conhecer-se estiver realmente viva e for sinceramente curiosa não vale a pena aprender. Por exemplo, além de conhecer alguma coisa a respeito do teatro elizabetano, acho que poderia também fazer uma tentativa de explicação dos princípios básicos da fissão nuclear uma tentativa bastante razoável para viver no mundo de hoje. Eu não digo: "Isto é um mistério que deve ser deixado aos cientistas." Claro que com isto não quero dizer que estou pronto para aceitar um cargo decisivo na defesa nacional.

Desde a II Guerra Mundial o senhor tem vivido e trabalhado principalmente fora dos Estados Unidos, considera-se um expatriado?

- Eu não gosto dessa palavra. Desde a infância considerei-me sempre um norte-americano que, por acaso, vive em toda parte. "Expatriado" é uma palavra superada, relacionada com determinada geração da década de 1920 e com uma atitude romântica de viver no Exterior. Tenho preconceitos mais contra a palavra do que contra o fato...Eu não sou mais bastante jovem para pegar em armas pelo meu país e, neste caso, por que não morar aqui, onde consigo a maior parte do meu trabalho? Afinal de contas, Londres está cheia de húngaros, alemães e franceses, e os Estados Unidos cheios de todo mundo...e eles não são chamados de expatriados.

O senhor não é católico, mas ainda assim resolveu morar em dois países intensamente católicos, em primeiro lugar, a Itália, e agora, a Espanha. Por quê?

- Isto nada tem a ver com religião. A cultura mediterrânea é mais generosa, menos afligida pela sensação de culpa. Eu não me sinto imensamente confortável em sociedades que existem sem alegria natural, sem certo sentido de tranquilidade na presença da morte. Não condeno o mundo muito setentrional, muito protestante, de artistas como Igmar Bergman. Simplesmente esse mundo não é o lugar onde eu vivo. A Suécia que eu gosto de visitar é bastante divertida. A Suécia de Bergman, porém, lembra-me sempre de algo que Henry James disse sobre a Noruega e Ibsen - que "tresandava a odor de parafina espiritual." O senhor não pode imaginar como simpatizo com essas palavras.

Se podesse ter escolhido um país e período para nascer, teria escolhido os Estados Unidos de 1915?

- O período não teria sido absolutamente assim tão baixo na minha lista, mas qualquer pessoa sensata teria escolhido viver na idade de ouro da Grécia, na Itália do século XV ou na Inglaterra Elizabetana. E houve também outras idades de ouro. a Pérsia teve uma e a China quatro ou cinco...

Qual a sua opinião sobre os diretores franceses da Nowelle Vague, tão admirada por estas revistas?

- Tendo uma imensa vontade de conhecer-lhes os trabalhos. Perdi a maior parte deles porque tenho receio que inibam o meu próprio trabalho. Quando faço um filme, não gosto que me lembrem de outros filmes. Gosto de pensar que invento algo pela primeira vez. Falo ao cahiers do Cinema sobre cinema em geral porque me agrada que gostem dos meus filmes. Quando pedem entrevistas demoradas e intelectualizadas, não tenho coragem de recusar. Mas é um mero ato. Eu sou um embusteiro. Chego a falar da "arte do cinema". Eu sou um falsário. Cabe portanto a mim o direito de falar nisso. Em arte somos sempre os falsários de alguém. A única obra verdadeira é a catedral de Chartres, pois foi construída por operários anônimos.

O que pensa dos filmes de Antonioni?

- Segundo um jovem crítico norte-americano, uma das maiores descobertas de nossa época é o valor do tédio como tema artístico. Se assim for, Antonioni merece ser considerado um pioneiro e um patriarca. Os seus filmes constituem fundo perfeito para manequins. Talvez não fundos tão bons assim na Vogue, mas devia haver. A revista devia contratar Antonioni para desenhá-los.

O que diz de Fellini?

- Ele tem tanto talento como quem quer que hoje faça filmes. A sua limitação o que constitui também a origem de seu encanto é que ele é fundamentalmente provinciano. Seus filmes constituem o sonho de cidade grande do rapaz de cidade pequena. A sua sofisticação funciona porque é criação de alguém que não possui. Mas ele revela perigosos sinais de ser um artista superlativo com muito pouca coisa a dizer.

Ingmar Bergam?

- Conforme sugeri há pouco, não compartilho nem de seus interesses nem de suas obsessões. Ele me é muito mais estranho do que os japoneses.

O que diria dos diretores norte-americanos modernos?

- Stanley Kubrick e Richard Lester são os únicos que me tocam...excetuando os velhos mestres. Quando falo em velhos mestres tenho em mente John Ford, John Ford e John Ford... Não considero Alfred Hitchcock um diretor americano, embora ele tenha trabalhado em Hollywood todos estes anos. Ele me parece tremendamente inglês, na melhor tradição de Edgar Wallace, e nada mais. Há sempre algo de anedótico no seu trabalho. Os seus artifícios continuam a ser artifícios por mais maravilhosamente concebidos e executados que sejam...com Ford nos seus melhores trabalhos, sentes-se que o mundo vive e respira num mundo real.

É possível aprender a dirigir filmes?

- Oh, vários trabalhos técnicos podem ser ensinados, da mesma forma forma que se pode ensinar os rudimentos da gramática e da retórica. Mas não se pode ensinar a escrever, e dirigir um filme é muito parecido com escrever, exceto o ato de envolver 300 pessoas e muito mais ofícios. O diretor é obrigado a agir como um comandante no campo, no momento da batalha. Precisa-se da mesma capacidade de inspirar, apavorar, encorajar, reforçar e, de modo geral, dominar. Assim, trata-se parcialmente de uma questão de personalidade, que não se pode adquirir tão facilmente como quem aprende um ofício.

O senhor acha que a produção de filmes deve ser auxiliada pro verbas oficiais, como acontece em muitos países europeus?


- Se é verdade eu acredito que é que o teatro, a ópera e a música devem ser subvencionados pelo Estado, então é igualmente verdadeiro no caso do cinema, apenas mais verdadeiro. Socialmente, os filmes são mais poderosos e têm muito mais a ver com este momento especial da história mundial. As maiores verbas devem ser dadas ao cinema. O cinema precisa mais e tem mais a dizer.

Qual será o progresso seguinte no cinema?

- Espero que progrida, só isso. Não houve qualquer grande revolução no cinema em mais de vinte anos e, sem uma revolução, a estagnação se firma e a decadência aparece ali na esquina. Nutro a esperança de que surja um tipo inteiramente novo de realização cinematográfica. Mas antes que isso aconteça, terá de ser criada uma forma de baratear os filmes e exibi-los a preços mais baixos. De outro modo, a grande revolução não concorrerá e o artista do cinema jamais será livre...

Qual a sua política, e ela mudou nos últimos anos?


- A política de todo o mundo mudou nos últimos 25 anos. Ninguém pode ter uma opinião no vácuo. Ela tem de ser uma reação a uma situação. Eu sempre fui um radical independente, embora com fortes tonalidades de saudosismo educacional e cultural. Sinto um respeito enorme por numerosas instituições humanas que estão hoje em séria decadência e que provavelmente jamais ressuscitarão. Embora eu seja o que se denomina de progressista, não ocorre isto em virtude de antipatia para com o passado. Eu não rejeito os nossos ontens. Desejaria que partes de nosso passado estivessem mais vivas. Se eu sou capaz de originalidade, isto não ocorre porque eu queria derrubar ídolos ou pôr-me a frente dos tempos. Se há algo rígido em mim, é a antipatia por estar em voga. eu preferia ser considerado ultrapassado a "ter aquilo".

Qual seu maior vício?

- Accidia, a palavra latina medieval para melancolia, e indolência. Não me entrego a elas durante muito tempo, mas elas ainda me espreitam nas trevas. Sou culpado da maioria dos pecados comuns de inveja, talvez menos do que dos demais. E de orgulho. Não tenho certeza de que seja um pecado. Trata-se do único detalhe em que discordo da lista cristã. Se é uma virtude, não há reconheço muito em mim. O mesmo se for vício.

Se a decisão fosse sua, o senhor censuraria alguma coisa no cinema?

- Sou tão contrário à censura que tenho de responder não... Coisa alguma. mas se não houvesse censura, eu tenho uma pequena lista de coisas que preferiria que não fossem exibidas. pelo menos não com muita frequência. O tempero forte não é bom para o paladar.

O senhor acredita em Deus?

- Os meus sentimentos a esse respeito formam um diálogo íntimo constante que não esclareci o suficiente para ter a certeza de que tenho algo a comunicar as pessoas que não conheço. Não sou um crente, mas sou certamente religioso...O fato grande e irresistível a respeito da idéia cristã-judaica é que o homem - não importa a sua ancestralidade, não importa a proximidade em que esteja de qualquer símio assassino-é realmente ímpar. se somos capazes de amar uns aos outros altruisticamente. somos absolutamente excepcionais como espécie neste planeta. Não há outro animal que nem de longe nos lembre. A noção da divindade de Cristo é uma maneira de dizer isso. Esse é o motivo porque o muito é autêntico. No sentido trágico mais alto, dramatiza a idéia de que o homem é divino.




O POVO e a chegada do cineasta a Fortaleza

Orson Welles chegou ao Brasil em fevereiro de 1942. em breve viria a Fortaleza para realizar uma das partes de It's All True, dedicada à saga dos jangadeiros cearenses. Desde o dia 5 de março, O POVO anunciava a chegada para breve do diretor. Os epítetos então lançados à celebridade giravam em torno de "o boy genial da capital do cinema". quando chegou, enfim, Welles seria ao mesmo tempo, visto como o "Napoleão do cinema" e como "um rapaz modesto e simples", imagem bem condizente com sua oficiosa posição de embaixador da política da boa vizinhança entre Brasil e EUA. Welles foi recebido festivamente no Aeródromo do Alto da Balança. Havia, no local, mais de cem jangadeiros em trajes típicos. A reportagem do O POVO, na edição do dia seguinte, registrou detalhadamente as atividades de Welles naquele domingo. Do Alto da Balança, Welles foi levado em animado e "extenso cortejo de automóveis" ao tradicional Excelsior Hotel, no Centro. De lá partiria logo mais para o Jangada Clube, na Praia de Iracema. Estava tão disposto, que às 17 horas, topou manobrar o leme da "Urano", do mestre Jerônimo, numa corrida de jangadas. Na areia, uma multidão calculada em milhares de pessoas, principalmente elementos do "segundo sexo". Welles veio à terra firme "molhado como um pinto", segundo a descrição do empolgado e anônimo repórter. It's All True acabou perdido e só foi encontrado e recuperado em 1992. O filme acabou montado, mesmo sem as cenas finais.

Gênio precoce

Orson Welles nasceu em 1915, ganhou fama mundial no início dos anos 40 e faleceu em 1985, ainda sob a sina. Sobretudo nos EUA, de que era um artista fracassado. Isto porque nenhum de seus filmes pós-Cidadão Kane representou um sucesso comercial. sem falar na sua notória e complicada relação com os estúdios de  .

Trenzinho de brinquedo

Sua relação com a indústria cinematográfica nunca foi pacífica. Os antigos habitantes da "cidade das redes" nunca o engoliram como um igual. Viam-no como um menino mimado, egocêntrico e pretensioso que não deixava de ser verdade. Depois de seu primeiro passeio por um estúdio, o diretor declarou: "É o melhor trenzinho de brinquedo que uma criança poderia querer ganhar."

Nem tudo é verdade

Welles veio ao Brasil para realizar Quatro Homens e Uma Jangada e um documentário contando a história do samba. A idéia era mostrar a vida dos jangadeiros que viajaram de Fortaleza ao Rio de de Janeiro para pedir ao presidente Getúlio Vargas que os reconhecesse como trabalhadores. As intenções do governo americano eram as melhores possíveis, mas para a ditadura de Vargas isto significava sujar a imagem do País, traindo o espírito ufanista da época. a explicação oficial para o projeto degringolar, porém, foi que o diretor teria gasto todo o dinheiro em bebida e mulheres.

Embaixador da boa vizinhança

A passagem de Orson Welles pelo Brasil, no anos 40, foi marcante. Ele acabara de filmar Soberba, o esperado segundo filme após Cidadão Kane. A autonomia do cineasta não agradou à RKO Pictures e mandá-lo ao Brasil foi uma forma de afastá-lo da montagem de Soberba mas, supostamente, encher a bola do diretor. Afinal, ele vinha como embaixador informal da política da boa vizinhança entre EUA e Brasil, em plena guerra mundial.

Guaraná no café Globo


O poeta e jornalista Antônio Girão Barroso, em entrevista de 1988, ao O POVO, repassou impressões em torno da passagem de Orson Welles por Fortaleza. "Em 1942, no ao ano em que foi realizado aqui o 1º Congresso de Poesia de Ceará, a gente se reunia, eu e a turma do (Grupo) Clã, no Café Globo, à noite, para tornar um cafezinho e bater um papo. E, em mais de uma oportunidade, nós vimos por lá o Orson Welles. Enquanto a gente tomava café, ele ficou tomando guaraná sozinho. Como eu não sabia inglês, e ele, português, não poderia haver comunicação."

Cidadão Kane ainda hoje surge em primeiro lugar nas listas feitas sobre os melhores filmes de todos os tempos. E provavelmente continuará surgindo. O filme é inspirado na vida do empresário William Randolph Hearst, que chegou a processar Welles. Nele, dono de um império jornalístico murmura a palavra "rosebud" antes de morrer solitário em sua mansão. Repórter entrevista, então, seus amigos, para tentar descobrir o significado da palavra.
Antes de chegar ao cinema, Welles teve passagem pelo rádio, que revolucionou através do emprego de novas técnicas. A naturalidade e o realismo de sua atuação chegaram a causar pânico entre os norte-americanos, em 1938, ao encenar uma versão de A Guerra dos Mundos, de H.G. Welles, dando a impressão de que a Terra estava sendo invadida pro marcianos.
Perguntaram, uma vez, a Welles qual dos seus discípulos ele mais admirava, Stanley Kubrick foi sua resposta. "Sem Welles, não teria havido Kubrick", escreveu um crítico francês, ao saudar o primeiro longa-metragem do cineasta, diretor de Laranja Mecânica, 2001, Uma Odisséia no Espaço e o recente De Olhos Bem Fechados. Kubrick faleceu ano passado.


Crédito: Jornal O Povo

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